Faltou a voz de emocionar até as pedras do Largo de São Francisco
"Um texto importante como esse, assinado por quase 1 milhão de pessoas, tinha que ser transmitido ao país por uma voz potente, tonitruante", diz Alex Solnik
Por Alex Solnik
A carta de 1977 foi lida pelo próprio autor, o imponente Goffredo da Silva Telles Jr.. Poucos dominavam a arte da escrita e da oratória como ele. Texto inspirado, lapidado por várias semanas, irrepreensível; gestos, entonação e ritmo de um grande ator de tragédias gregas, como Paulo Autran. O texto, a voz e as expressões do rosto estão na memória dos brasileiros, quarenta e cinco anos depois.
Os organizadores do evento de hoje optaram por dividir a leitura entre quatro pessoas, uma leitura coletiva, seguindo a tendência da nossa época. Três professoras e um veterano da carta de 77.
Não sei se foi a melhor escolha. Acho que não. Nada contra algum deles, tudo a favor, cumpriram a sua tarefa.O problema é que não têm talento de orador. Foram mal escolhidos.
Da turma de 77, o mais indicado seria José Carlos Dias, que ficou encarregado de ler a carta da Fiesp, no Salão Nobre da faculdade, em vez da carta-mãe. A pegada dele lembra muito a de Goffredo.
Uma boa solução caseira teria sido o pai da ideia, o diretor da Faculdade de Direito do Largo de São Francisco, que antes da leitura empolgou a plateia com um discurso de improviso, curto e grosso.
Um texto importante como esse, assinado por quase 1 milhão de pessoas até aqui, tinha que ser transmitido ao país por uma voz potente, tonitruante, capaz de calar o Maracanã em dia de Fla-Flu e emocionar até as pedras do Largo de São Francisco.
E por um rosto muito popular, reconhecido até por aqueles que não veem telejornais, só novelas. Para ficar na memória dos brasileiros por todo o sempre. Um grande ator, uma grande atriz, cantor, cantora.
Há uma lista enorme, encabeçada por Fernanda Montenegro, Juca de Oliveira, Wagner Moura, Seu Jorge, Maria Bethânia, com sua voz grave e aveludada. Tantos mais.
Os artistas, que levaram multidões às ruas nas Diretas Já, gravaram um belo clipe, é verdade, mas fizeram falta, ao menos para mim, no ato principal, a leitura da carta no pátio histórico da São Francisco.
* Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.

