Fatos e números: Bolsonaro não cai

"Presidente está mais fraco, mas finca o pé entre os mais pobres, estreitando terreno do lulismo", avalia o jornalista Rodrigo Vianna

Bolsonaro discursa em velório de soldado
Bolsonaro discursa em velório de soldado (Foto: Marcello Casal/Ag.Brasil)


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Todo jornalista tem direito a ter opinião e a explicitar suas posições políticas. Mais que direito, tem até a obrigação. Mas não pode brigar com os fatos, nem confundir realidade com desejo.

O mês de junho termina com números e fatos com os quais não é recomendável brigar.

Fato 1: Bolsonaro está mais fraco.

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O bolsonarismo, que ameaçava golpes e dizia que a ruptura era questão de tempo, mostrou-se um blefe. Queiroz foi preso, Wassef exposto, o acampamento dos 300  desmontado, o gabinete do ódio desossado, Weintraub colocou-se em fuga, e o capitão nomeou um novo ministro da Educação mais próximo dos militares do que do olavismo... Esse quadro mostra que a possibilidade de uma ruptura institucional não encontra aderência na realidade.

Sim, já temos autoritarismo que autoriza barbárie policial, já temos 3 mil militares no governo, já temos o Golpe de 2016 e a cassação fraudulenta de Lula. Mas Bolsonaro não tem força para avançar mais no projeto fascista. Ele foi contido. Isso é um fato.

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Fato 2: Bolsonaro mantem um terço de aprovação, o que impede qualquer tentativa de removê-lo do poder agora.

Se a tragédia da pandemia com mais de 50 mil mortos, somada à exposição de Queiroz/Wassef e à economia em frangalhos, não foi suficiente para destruir Bolsonaro, parece difícil que ele encolha de forma significativa até o fim de 2020 (ainda mais com o auxílio emergencial sendo prolongado até setembro/outubro).

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Não podemos brigar com os fatos.

A pesquisa DataFolha, publicada nesta sexta-feira, mostra que a rejeição ao governo (ruim/péssimo) bate em 44% (era 43% há um mês). A avaliação ótimo/bom está em 32% (era de 33% em maio). Tendência semelhante foi indicada por outras pesquisas ao longo desta semana.

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Todas elas indicam que Bolsonaro despenca entre os brasileiros com mais escolaridade, mas avança no eleitorado abaixo de dois salários mínimos e que possui apenas o ensino fundamental.

Na pesquisa Poder360, 63% dos que possuem nível superior avaliam Bolsonaro como ruim/péssimo; entre os que têm apenas o fundamental, 38% dizem que o presidente é ruim/péssimo, e 35% julgam que ele é ótimo/bom.

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A razão para isso seria o auxílio emergencial de 600 reais, dizem vários especialistas.

Parece-me que não é só isso. Parte da população é sensível ao discurso da ordem e acredita na fala de que o “sistema” tem impedido Bolsonaro de trazer melhores resultados.

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É o que mostra a pesquisa feita pela Revista Fórum: quase metade dos brasileiros se declaram de direita ou centro-direita. Ou seja, há uma hegemonia conservadora na sociedade brasileira.

A situação, no entanto, é extremamente frágil para Bolsonaro, porque esse discurso antissistema tende a se dissolver com a entrada do Centrão no governo. Apesar dessa contradição, o apoio das legendas conservadoras e dos militares parece suficiente para impedir qualquer avanço do processo de impeachment ou de cassação da chapa no TSE. Bolsonaro tem fôlego pra chegar até 2021.

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Então, temos dois quadros descartados: nem golpe/fechamento do regime, nem impeachment/derrota absoluta.

Sobraria aquilo que o deputado Orlando Silva (PCdoB-SP), numa bela entrevista ao Boa Noite 247, chamou de “sarneyzação” do governo. Essa parece a tendência mais provável hoje.

Bolsonaro seguiria aos trancos e barrancos, enfraquecido, sem gabinete do ódio, sem olavismo no centro do discurso: uma espécie de bolsonarismo desossado. Mas com a agenda liberal firme, passando a boiada. 

Importante, também, é não brigar com mais um dado da realidade.

Fato 3: Bolsonaro mantem os 30%, mudando de público e contando agora com os mais pobres, e ao fazer isso avança sobre um eleitorado que desde 2006 votava no PT.

Quando se avaliam as opções eleitorais, o terreno hoje parece se estreitar  para a esquerda:

- da classe média para cima, há forte adesão à antipolitica/antiEstado; esse eleitorado abandona Bolsonaro, mas não vai necessariamente embarcar num projeto de centro-esquerda; o mais provável é que migre para Moro ou algo parecido;

- na faixa abaixo de dois salários mínimos, Bolsonaro finca os pés falando em ordem, porrada e "ajuda" aos que não tem carteira assinada.

O país está hoje dominado pelo discurso da antipolítica + porrada e bomba. Esses sim são quase 70%! Não é à toa que a pesquisa Quaest mostrou que hoje Bolsonaro e Moro disputariam a ponta numa eleição presidencial (com Haddad e Ciro um pouco abaixo nas intenções de voto).

Claro que Lula e a esquerda são ignorados na mídia, que incensa Moro e tenta construí-lo como alternativa pela direita. Mas o fato é que a situação é difícil para a esquerda.

O que segura ainda o lulismo é a solidez do apoio no Nordeste – região que mais rejeita Bolsonaro.

Parece-me que esse quadro indica um caminho claro: a esquerda precisa disputar de maneira vigorosa as periferias do Sudeste. Isso deveria ser prioridade absoluta na disputa municipal de 2020.

Do contrário, o projeto de centro-esquerda ficará restrito a um núcleo limitado - ainda que sólido e respeitável.

É o que mostram os números e os fatos. Melhor não brigar com eles.

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