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Denise Assis

Jornalista e mestra em Comunicação pela UFJF. Trabalhou nos principais veículos, tais como: O Globo; Jornal do Brasil; Veja; Isto É e o Dia. Ex-assessora da presidência do BNDES, pesquisadora da Comissão Nacional da Verdade e CEV-Rio, autora de "Propaganda e cinema a serviço do golpe - 1962/1964" , "Imaculada" e "Claudio Guerra: Matar e Queimar".

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Foi golpe! (E militar)

O general revelou como se deu um dos momentos mais emblemáticos da intervenção militar na vida política recente

Exército avalia se STF pode libertar Lula (Foto: Tiago Correa/CMM.)
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Por Denise Assis, para o Jornalistas pela Democracia 

Matéria publicada pela “Redação DefesaTV”, que trata de assuntos afeitos à vida militar, nesta quarta-feira (10), e com crédito para o jornalista Leandro Melito, do Brasil de Fato, revela que o ex-comandante do Exército Brasileiro (EB) no período entre 2015 e 2019, o general Eduardo Dias da Costa Villas Bôas, prestou depoimento de 13 horas ao CPDOC, na Fundação Getúlio Vargas (FGV), rememorando episódios de sua passagem pelo cargo.

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Villas Bôas conta detalhes sobre o “nebuloso” e ameaçador Twitter, que acabou levando o processo político para a eleição de Jair Bolsonaro. Revela, por exemplo, que a iniciativa foi uma represália de um grupo de militares contra o governo de Dilma Rousseff, pela criação da Comissão Nacional da Verdade e em represália à demarcação das terras indígenas “Raposa do Sol”, influenciados pela reação do general Heleno, que esperneou muito contra a medida. Comentou também a massiva presença de oficiais no atual governo, em todos os escalões. Com duração de 13 horas, a entrevista foi concedida pelo general ao diretor do Centro de Pesquisa e Documentação de História Contemporânea do Brasil (CPDOC), Celso Castro, e virou livro: “General Villas Bôas: conversa com o comandante”.

O general revelou a Castro como se deu um dos momentos mais emblemáticos da intervenção militar na vida política recente. Segundo descreveu, foi a postagem que ele fez no Twitter, em 2018, ainda na condição de comandante do Exército brasileiro, em tom de ameaça ao Supremo Tribunal Federal (STF), na véspera do julgamento do habeas corpus apresentado pela defesa do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Era o seguinte, o texto da postagem: “o Exército “compartilha o anseio de todos os cidadãos de bem de repúdio à impunidade e de respeito à Constituição, à paz social e à Democracia, bem como se mantém atento às suas missões institucionais”. Ele revela que obteve o apoio do então candidato Jair Bolsonaro. (Talvez seja este o grande segredo que os dois combinaram jamais revelar).

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No livro – não há citação na matéria sobre data de lançamento -, Villas Boas conta um fato tão importante quanto preocupante. O post não foi apenas de sua autoria, mas escrito por sua equipe de oficiais. E, mais, que o texto obteve o aval de outros integrantes do Alto Comando do Exército residentes em Brasília antes de sua publicação. “Recebidas as sugestões, elaboramos o texto final, o que nos tomou todo o expediente, até por volta das 20 horas”, contou Villas Bôas na entrevista, de acordo com o autor da matéria do Brasil de Fato.

Ouvido por ele, o antropólogo Piero Leirner resume: “Significa que isso foi uma decisão do Exército, e não algo que partiu da cabeça do comandante”, aponta também o estudioso sobre os militares e autor do livro “O Brasil no espectro de uma guerra híbrida”. Para Leirner, a declaração de Villas Bôas “deixa claro um papel institucional de ingerência no Poder Judiciário”. Fato grave, sob qualquer aspecto. O antropólogo lembra um ponto importante: “Note que o general Ajax já estava lá no STF ‘assessorando’ a presidência [ministro Dias Toffoli], portanto o tuíte foi para deixar o STF de mãos atadas frente à opinião pública. Ou seja, fez-se política”.

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Leirner mostrou-se surpreso quanto a uma das narrativas do general Villas Bôas impressa no livro: “é o peso que a “questão indígena” teve na articulação entre os militares para sua atuação na vida política do país. Talvez o antropólogo não tenha se dado conta de que no bojo desta questão que o surpreendeu, está o fator “mineração”, pois esta, sabidamente, é uma reserva onde se alardeia, há uma jazida de diamantes. Daí o interesse na discussão, que já foi incluída na pauta desse governo.

“A questão da Raposa Serra do Sol e TI Yanomami teve no mínimo tanto impacto como a CNV [Comissão Nacional da Verdade]. Meu faro de que a coisa começou com a rebelião do Heleno em 2008 estava certo, acho. Foi a partir daí que eles elaboraram um plano de longo prazo”, afirmou Leirner em uma publicação em seu perfil no Facebook.

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O antropólogo ressalta que a “questão indígena” está no centro do ordenamento ideológico e doutrinário militar desde os anos 1990. “Eles transferiram muito do foco do ‘inimigo interno’ da ditadura para o problema da ‘cobiça internacional da Amazônia’, deslocando toda uma leitura da realidade e o consequente emprego das Forças Armadas para a Amazônia”, aponta, Leirner, na matéria de Melito. Ele destaca, ainda, que “a primeira liderança política a surgir entre os militares foi o general Augusto Heleno, após a demarcação da terra indígenas Raposa Serra do Sol em 2008, durante o segundo mandato do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva”.

O antropólogo recorda que “Heleno começou a fazer críticas públicas, no Clube Militar, de forma que isso vazou para a imprensa e lançou um princípio que, lá dentro, foi tomado como um ‘papel de liderança’ lançado por ele, que começou a vocalizar contra Lula, esquerdas, PT”, explicou.

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Nada, porém, alvoroçou tanto o meio militar para a ingerência na política, na opinião do antropólogo, quanto o a criação da Comissão Nacional da Verdade (CNV), quando Dilma Rousseff ocupava a Casa Civil e já havia lançado sua candidatura para as eleições presidenciais de 2010. “Houve um processo de ‘imitação’ por parte de outros militares. Um dos casos foi o do general Maynard Santa Rosa, e a eles se seguiram movimentos em série. Mourão foi isso”, aponta Leirner, como consta da matéria de Brasil de Fato.

A CNV foi instituída pelo governo para investigar as graves violações de direitos humanos cometidas pelo Estado brasileiro entre 18 de setembro de 1946 e 5 de outubro de 1988. O maior empenho nas questões relativas às violações ocorridas durante o período da ditadura instaurada pelo golpe de 1964, que durou 21 anos, deixou os militares indignados. Criada em novembro de 2011, no primeiro ano do governo da presidenta Dilma, os militares se uniram contra o que classificaram como “revanchismo” da esquerda brasileira.

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Os trabalhos da comissão foram encerrados em dezembro de 2014, com a publicação do Relatório Final, em que foram apontadas as responsabilidades de agentes do Estado, em especial das Forças Armadas brasileiras, em episódios de sequestros forçados, tortura e morte de opositores ao regime.

De acordo com descrição de Leirner, “o pessoal lá do topo sabia do potencial político disso e, ainda em 2014, logo depois da reeleição, franquearam a entrada de Bolsonaro para dentro de instalações militares para fazer campanha. Toda essa coisa foi trabalhada por Villas Bôas, que ‘para fora’ tinha um discurso legalista, mas ‘para dentro’ deixou a política tomar altas doses de vitamina, seguindo o exemplo e a liderança de um Heleno da vida”.

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