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Celso Pansera

Foi ministro da Ciência e Tecnologia, deputado federal e presidente da Finep (Financiadora de Estudos e Projetos), empresa pública vinculada ao governo federal. Atualmente, preside a Codemar, empresa de desenvolvimento da prefeitura de Maricá (RJ).

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Governo acerta na estratégia de enfrentamento do tarifaço

Além de o governo brasileiro estar disposto a ir às últimas consequências em defesa da nossa soberania, já há um plano de contingência preparado pela Fazenda

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva discursa em defesa da soberania nacional - 17/7/2025 (Foto: Ricardo Stuckert/PR)

Desde as primeiras ameaças do presidente norte-americano Donald Trump de impor tarifas absurdas aos produtos brasileiros, o governo Lula vem se conduzindo de forma correta. Em paralelo à pronta reação do presidente Lula e do Itamaraty aos ataques à soberania e independência das instituições brasileiras, que foi acompanhada por representantes de outros poderes da República, o Brasil não abriu mão, em nenhum momento, de sua estratégia de esgotar todas as possiblidades de negociação, mesmo agora, depois que o tarifaço entrou em vigor, no último dia 6 de agosto.

A mobilização do setor produtivo contra o tarifaço por parte do governo , bem como as reiteradas declarações de Lula e diversos ministros rechaçando a tentativa de chantagem de Trump, somadas à ação lesa-pátria de Eduardo Bolsonaro no exterior, criaram um bem-vindo sentimento nacionalista em torno da liderança do presidente da República.

O Brasil ainda insiste em destravar os canais de negociação atuando em várias frentes. O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, tem inclusive um encontro marcado com o secretário do Tesouro dos Estados Unidos. Enquanto isso, a nossa diplomacia já recorreu formalmente à Organização Mundial do Comércio (OMC). Embora descartada no momento, a aplicação da reciprocidade segue como uma carta na manga, para ser usada assim que o governo julgar conveniente.

Vale lembrar que o governo Trump vem adotando um comportamento pendular e errático na implementação de sua política tarifária predadora, recuando com frequência diante de pressões, como nos casos da China, México e Canadá, em relação aos quais o presidente americano ameaçou e chegou a anunciar tarifas altas sobre as exportações desses países, para em seguida recuar e retomar as ameaças mais uma vez.

No segmento brasileiro de Ciência e Tecnologia, foi visto com grande alívio a Embraer ser incluída entre as 700 exceções às tarifas de 50%, pois a companhia é responsável por uma produção de alta tecnologia, exportando para os EUA equipamentos de tecnologia muita avançada. A Embraer vende para  os americanos 30% de sua produção de aviões, além de peças e componentes. 

Embora a laranja também figure na lista de produtos nacionais que não serão sobretaxados, garantindo o fluxo de comércio significativo do Brasil para os EUA, o agronegócio acabou seriamente atingido. Muito sofisticado do ponto de vista da utilização de novas tecnologias, melhorando de forma crescente a qualidade das sementes e produtividade do solo, nossos produtos desfrutam de altos níveis de competitividade não só no mercado americano, mas no de países de vários continentes. 

Isso é resultado direto dos estudos da Embrapa e de universidades, como a Rural de Pernambuco e a Rural do Rio. Como as carnes, o café e as frutas, exceto a laranja, serão taxados em 50%, o investimento no agronegócio será prejudicado. Também sofrerão impacto expressivo, atingindo a pesquisa científica e o desenvolvimento, os segmentos de biologia, saúde e tecnologia da informação, nos quais o Brasil ainda mantém uma dependência considerável dos EUA.

Estima-se que dezenas de milhares de empregos podem ser perdidos no Brasil com o tarifaço, especialmente nas áreas de carnes, café, frutas, máquinas e equipamentos, calçados, têxteis e pescados. Só na indústria podem desaparecer em torno de 110 mil postos de trabalho. 

Mas ainda estão rolando os dados. Além de o governo brasileiro estar disposto a ir às últimas consequências em defesa da nossa soberania, das empresas nacionais e do emprego dos trabalhadores, já há um plano de contingência preparado pelo Ministério da Fazenda e prestes a ser anunciado pelo presidente da República, para amparar os setores mais afetados.

Por outro lado, a própria ciência americana sofre com os ataques e o negacionismo do governo Trump, o que tem potencial para criar uma onda de solidariedade dos cientistas dos EUA em relação aos seus pares no Brasil. 

O fato é que temos a sorte de contar, no Brasil, com um governo que combina defesa da soberania e diplomacia, marcando sua atuação na cena internacional pelo princípio da não ingerência nos assuntos de outros países.

* Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.

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