IA, entre Cila e Caríbdis!
"A humanidade deve se rebelar contra máquinas controladas por plutocratas, uma fusão de trilionários e o governo dos EUA, que domina o mundo", sugere Rocha
“Quantos, na nau Sensualidade, que sempre navegam com cerração, sem sol de dia, nem estrelas de noite, enganados do canto das sereias e deixando-se levar a corrente, se iriam perder cegamente, ou em Cila, ou em Caríbdis.” (Sermão de Santo António aos Peixes, Padre Antônio Vieira)
É manhã, numa segunda-feira de fevereiro. Andando a pé por Brasília rumo ao trabalho, você ouve a música doce e sedutora do gênio mexicano Carlos Santana ( Samba pa ti ). Os acordes, a vibração, o swing , tudo tão perfeito e intenso. A mente viaja para lugares inimagináveis, impossível, não obstante, desligar-se das nuvens significativas no horizonte — não apenas aqui, mês de tantas chuvas e trovoadas, mas no mundo incerto e explosivo.
Em tantas épocas, a humanidade esteve perto do seu fim apocalíptico, especialmente com o domínio da tecnologia das bombas nucleares. As mais de 10 mil ogivas que possuem os EUA e a Rússia podem, em pouco tempo, destruir o planeta. Esse risco essas crises atravessaram décadas na chamada Guerra Fria, naquele mundo bipolar, na disputa entre as potências nucleares, que fomentou o extremo desenvolvimento bélico e destrutivo, bruto e fatal.
Ninguém nunca abriu o botão do F…-se , ainda.
Por outra mão, não importa, subvertendo a ficção científica, em que as máquinas sempre se rebelam contra a humanidade, parece que o oposto é que se faz necessário e urgente.
A humanidade tem que se rebelar frente às máquinas — ou à apropriação dos valores por máquinas — controlada por um buraco de plutocratas, uma fusão funesta entre um pequeno grupo de trilionários ( Big Techs e superbanqueiros) e o governo dos EUA, uma maior potência (militar) , nuclear, econômico e tecnológico) do planeta. Aliás, esse pequeno grupo domina a cozinha da Casa Branca, a governança e inovações, além do Fed e do Tesouro. Como esses controlam o mundo de forma aparentemente sutil?
Para além do poder da força bruta, das armas e do capital, o avanço da tecnologia nos últimos 50 anos teve seu ponto de qualidade superior nos últimos 20 anos, com a internet de caráter massivo, conectando cérebros dos confins do mundo às megalópoles cosmopolitas , unindo as mentes do sertão seco do Nordeste brasileiro, do Saara, dos Bálcãs, do Paquistão, ao hype de Nova York, de Xangai, da Faria Lima, da City londrina. Toda essa inteligência do presente e do passado é sugada pela alta tecnologia das GPUs da Nvidia, dos chipsets da Qualcomm e da Intel, ou holisticamente conectada pelo open source da Deepkeek chinesa.
A assim chamada Inteligência Artificial — uma superconcentração de poderosos computadores conectados e preparados para processamento integrado como poucas vezes vista, rodando numa camada de dados altamente veloz, em limites inacreditáveis — pode não ser “inteligência”, mas dá respostas e consegue absorver o conhecimento e como expressões de toda a humanidade, nos mais remotos lugares em que se vive, em suas mais variadas condições de vida e modos de viver, pensar, imaginar, elaborar, sentir e narrar sua trajetória única neste planeta. Em oposição ao extremo poder do conhecimento, contudo, vende-se o obscurantismo mais cruel, o negacionismo, por exemplo, da vacina, ou mesmo da história e da filosofia.
Esse é o barco de Odisseu que ruma para navegar entre Cila e Caríbdis, enquanto o canto das sereias é entoado em alto, bom e refinado som pelo coro formado por Musk, Zuckerberg, Bezos, Huang. Como resistir se estamos dia a dia mais amofinados em suas redes sociais, desesperados para encontrar Penélope, Ariadne, Helena, Jasão, Aquiles? Pode ser Jolie ou Brad Pitt, mas a vida diz que, no máximo, seremos empresários de nós mesmos, no iFood ou no Uber. Mas somos LIVRES, eles repetem, e acreditamos.
Temos a “liberdade” de sonhar o sonho deles, alimentar seu über poder, acordar miseravelmente e continuar a produzir para os mesmos de sempre.
Ora, texto saído do diálogo com Carlos Santana.
* Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.

