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Daniele Barbosa Bezerra

Doutora em Educação (UFC), professora, pesquisadora de gêneros biográficos e memorialísticos, contista e cronista.

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Index Librorium Prohibitorium Identitatis

Meu caro amigo, me perdoe, por favor, foram tantas as vezes em que encarastes a censura e agora se autocensura? Faça não!

(Foto: Artista plástica Lana Benigno)
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Chico, com esse jeito manso que é só teu, ouça um bom conselho, que eu te dou de graça: Não abra mão de executar a tua obra, seja ela qual for, em obediência ao Index Librorium Prohibitorium Identitatis; à censura canhota que pretende excluir tudo da sociedade que não estiver sob suas lentes cor de rosa de mundo ideal, mesmo que para isso, se jogue no lixo, a cultura, a arte e a história de um país. 

Meu caro amigo, me perdoe, por favor, foram tantas as vezes em que encarastes a censura e agora se autocensura? Faça não! Pode ser a gota d’ água e o início do “cancelamento” de muita obra prima por aí. Sob a égide desse pensamento, descartaríamos um grande percentual da produção artística do país. A quem interessa o apagamento da história e da cultura de um povo? 

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Quem conhece a tua trajetória de homem e de artista coerente às lutas sociais, aos desvalidos, às minorias, não é capaz de acreditar, que mesmo que algumas das protagonistas em tuas obras, estejam aviltadas e humilhadas, que o Chico de carne e osso coadune com essas práticas de violência, sobretudo a de gênero. 

Na arte, muitas vezes, como tu sabes mais do que todos, evidenciar as mazelas e as injustiças, além de personagens massacradas, é o caminho para tirar o véu da harmonia social, desmascarar o que está camuflado nas entranhas da sociedade. Vai por mim! Palavra de Mulher! É que hoje Chico, se confunde eu lírico com o CPF, a estética com a ética, as lutas nas ruas e nas práticas cotidianas, com a lacração nas redes sociais. 

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Julinho da Adelaide, escuto e leio a tua obra desde criança, minha saudosa mãe, Socorro, era uma dentre as milhares de mulheres desse país apaixonada por ti, pela tua obra e, óbvio, pelos teus olhos cor de ardósia. Lembro-me de perguntar-lhe o que era ardósia, ela me explicou que era uma pedra meio azul, talvez cinza, quem sabe verde. Um mistério em nossas vidas. 

Meu Guri, com a tua obra aprendi que não queria ser igual às Mulheres de Atenas, que sofrem por seus maridos; muito menos alguém com dotes culinários e pitadas de afeto, no intuito desesperador de fazer o homem ficar em casa; para mim, quem quiser voar, que voe. 

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Na minha pouca idade, à época, e no meu desabrochar feminino, identificava-me com aquela mulher que remoçava, após o abandono afetivo e cantava sem mais, nem por quê; ou então com a sua menina que narrava, minuciosamente, o ato de amar, cujo umbigo, pernas, seios eram muito mais do que partes de um corpo. 

Geni e o Zepelim alcançou um grande sucesso. A meninada, como eu, cantava a música, sem nem entender do que ela tratava. Meus irmãos parodiando a música cantavam: “Joga pedra na Dani”! Minha mãe, mais uma vez, entrava em cena e nos explicava o que aquela narrativa musicada queria contar, a história de uma travesti que se prostituía, que era usada e desprezada pela cidade, mesmo quando ela a salvou das mãos do forasteiro. Na minha leitura de criança reconheci, apenas, o sentimento de ingratidão da cidade àquela mulher; com um pouco mais de idade, entendi que a transfobia era o mote da vez; o que ainda, infelizmente, é recorrente no país. 

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Aqui em Fortaleza, minha tia Ivone Cordeiro, resolveu montar a peça Os Saltimbancos, com os sobrinhos que estavam de férias na casa da Vovó Iracema, entretanto a confusão se deu no primeiro dia de ensaio, pois todas as meninas da família queriam ser a Gata da história. A pobre Galinha, relegada por todas nós, acabou sobrando para mim. Decorei as falas e a música da personagem, tão comovente; mas a peça não foi encenada. A confusão já estava instalada entre os atores amadores e a diretora da peça havia desistido após tanto estrelismo do elenco. 

Mais tarde, já na Faculdade de Letras, na disciplina optativa de Literatura Infantil, ministrada lindamente pela professora e musicista, Elvira Drummond, fui apresentada à Chapeuzinho Amarelo, a meninazinha que tinha medo de tudo, de trovão, de tomar banho, de lobo (...), mas que depois encarou seus medos e redescobriu o mundo. Sinto que até hoje sou essa menina, que faz de um lobo, um bolo, só que agora lowcarb.

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Poderia passar dias escrevendo sobre o impacto da tua obra, na minha vida e na vida de tantos, mas permito-me a parar por aqui e apenas te peço: Chico, afasta de ti esse cale-se! 

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