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Denise Assis

Jornalista e mestra em Comunicação pela UFJF. Trabalhou nos principais veículos, tais como: O Globo; Jornal do Brasil; Veja; Isto É e o Dia. Ex-assessora da presidência do BNDES, pesquisadora da Comissão Nacional da Verdade e CEV-Rio, autora de "Propaganda e cinema a serviço do golpe - 1962/1964" , "Imaculada" e "Claudio Guerra: Matar e Queimar".

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Infância roubada

"Levantamento do UNICEF aponta que conflitos, violência e outras crises deixaram 36,5 milhões de crianças deslocadas no final de 2022", aponta Denise Assis

Unicef condena violência israelense contra crianças palestinas

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A data, (apesar da origem comercial, instituída em 1957), nos leva - sob as bênçãos de Nossa Senhora Aparecida, a padroeira –, a refletir sobre a situação das crianças no mundo. O apelo emocionado do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, aos secretário-geral da ONU, Antonio Guterres, para que olhe por elas com urgência e não poupe recursos para atendê-las, protegê-las e resgatá-las à luz dos Direitos Humanos, no Oriente Médio, diz o que todos nós estamos sentindo: “crianças jamais poderiam ser feitas de reféns, não importa em que lugar do mundo”.

No entanto, no dia em que as lembramos e festejamos, o apelo soa absurdo, real, urgente: “É preciso que o Hamas liberte as crianças israelenses que foram sequestradas de suas famílias. É preciso que Israel cesse o bombardeio para que as crianças palestinas e suas mães deixem a Faixa de Gaza através da fronteira com o Egito. É preciso que haja um mínimo de humanidade na insanidade da guerra. É urgente uma intervenção humanitária internacional. É urgente um cessar fogo em defesa das crianças israelenses e palestinas”, apela o presidente.

Na distante Faixa de Gaza, cenário de destruição e cinzas, desde a investida de Israel, em resposta ao ataque do Hamas, grupo militante islâmico, que desde 2007 tem o controle dessa região da Palestina, o menino Bader Monir Bader, de 11 anos, gravou um vídeo pedindo mais auxílio, inclusive gasolina para o gerador da escola onde se encontra. Israel cortou a energia local durante os preparativos para uma possível invasão que pretende destruir o grupo palestino que atacou cidades israelenses no sábado (07/10), contrariando a convenção de Genebra, que aponta a submissão à humilhação e ao sofrimento coletivo, como crimes de genocídio. Crimes de guerra.

"Não sabemos por quanto tempo vamos ficar aqui", disse firme, descrevendo não ter mais casa. E ainda advertiu a ONU para que apele a Israel para não bombardear a escola. Nessa idade, Bader deveria estar às voltas com livros, cadernos e brincadeiras com os amigos da sua idade. Queimou etapas. Pulou várias fases da infância e da adolescência para olhar em volta, entender as questões políticas do seu povo, o sofrimento da vizinhança, o perigo que ronda a sua família – agora sem rumo -, e a ameaça concreta com a sua própria sobrevivência e a dos seus pais.

Bader amadureceu a muque, à solapa, a seco. Sem água para umedecer os seus olhos, sem comida para manter o corpo frágil com disposição para a fuga, sem luz para pisar com segurança na trilha dos caminhos que o levem dali.

O menino que fala a nossa língua com sotaque, mas olha para a câmera com determinação – quer viver – é um dos milhões expostos ao drama do deslocamento forçado.

Levantamento do Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF) aponta que conflitos, violência e outras crises deixaram um recorde de 36,5 milhões de crianças deslocadas no final do ano passado, número mais alto registrado desde a Segunda Guerra Mundial.

O dado inclui 13,7 milhões de crianças refugiadas e requerentes de asilo, e 22,8 milhões que estão deslocadas internamente devido a conflitos e violência. Não estão incluídas as crianças deslocadas por desastres naturais ou mudança climática, nem as recém-deslocadas em 2022, inclusive pela invasão russa na Ucrânia. E, destaque-se, não computou Bader e os seus amigos, pois ainda não houve tempo para que virassem estatísticas.

O UNICEF conclui que o número recorde de crianças deslocadas é resultado direto de crises contínuas, incluindo conflitos agudos e prolongados, como no Afeganistão, e fragilidade em países como a República Democrática do Congo ou o Iêmen, aos quais agora vai se juntar o confronto Israel/Hamas.

O Itamaraty tenta retirar 28 brasileiros que se inscreveram para deixar região por meio da fronteira com o Egito. E para aliviar de pronto as necessidades do menino e seus familiares, o Escritório de Representação do Brasil em Ramallah, capital da Cisjordânia, organizou a primeira entrega de ajuda aos 13 refugiados brasileiros que estão na escola católica em Gaza. Isso, no entanto, depende de tratativas com o governo do Egito, e que Israel concorde em estabelecer um corredor seguro para refugiados.

Enquanto isso não acontece, chegaram alimentos, roupas, cobertores e colchões, e foi contratada uma psicóloga palestina para assistir o grupo. Essa é a parte ainda mais dolorida. As feridas abertas na pequena alma de Bader, que vão reverberar vida a fora. Daqui, do nosso aconchego, voltamos a nossa fé e esperança para que, sim, Bader seja libertado desse sofrimento que lhe roubou a infância. E que possa, ele mesmo, ajudar a construir um mundo menos violento.

* Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.

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