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Josias Alves

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Machismo na polícia

As raras indicações de mulheres para altos cargos de chefia nas instituições policiais são exceções que só confirmam a regra

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Passados quase 60 anos em que as primeiras mulheres foram admitidas no Corpo Feminino da Guarda Civil do Estado de São Paulo, em 1955, as instituições brasileiras de segurança pública ainda estão muito distantes de oferecer igualdade de oportunidades para homens e mulheres. Na carreira, ainda marcadamente masculina, as mulheres policiais sofrem com a falta de reconhecimento profissional, além de discriminação e preconceito, mais acentuados que na maioria de outras carreiras do serviço público e também na iniciativa privada.

Na Polícia Militar, onde o ingresso de mulheres ocorreu a partir da década de 70, os obstáculos começam no acesso à carreira, com a limitação de percentual de vagas que podem ser preenchidas por mulheres a cada concurso público.

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A última edição da "Pesquisa Perfil das Instituições de Segurança Pública", realizada anualmente pela Secretaria Nacional de Segurança Pública (Senasp), do Ministério da Justiça, com dados de 2011, sobre a Polícia Militar, Polícia Civil e Corpo de Bombeiros de todo o País, mostrou que em 24 unidades da federação o percentual de mulheres no efetivo das policiais militares era inferior a 12%. Em alguns estados, como CE, MA, PR, RN e SC a participação feminina no efetivo da PM é inferior a 6%. Na maioria dos estados, a proporção dos efetivos dos Corpos de Bombeiros Militares, de acordo com o sexo, é similar ao das Polícias Militares.

É previsível que a proporção de mulheres que alcançam os postos mais graduados na carreira da PM também seja ínfima. Em poucos estados, o percentual de mulheres no quadro de oficiais foi superior à proporção de policiais militares do sexo feminino em relação ao efetivo total das corporações. Em MG, um dos maiores índices, a mulheres ocupam 21% do quadro de oficiais, enquanto a proporção de praças femininas é de 8%.

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No ano passado, a coronel Cláudia Romualdo foi a primeira mulher, nos 238 anos de história da PM de Minas, a assumir o comando de policiamento da capital, a quarta posição mais importante na hierarquia da corporação. O fato inédito tornou-se destaque na mídia. Já na PM do Ceará, o percentual de oficiais do sexo feminino era de apenas 3%, índice similar a outros estados do Nordeste. Faltam reportagens que mostrem a realidade de preconceito por gênero que persiste nos bastidores das instituições policiais.

A pesquisa da Senasp também mostrou que na Polícia Civil, onde não limitação de vagas para mulheres, a participação feminina é mais expressiva: em apenas sete estados, o percentual de mulheres policiais civis é inferior a 20% do efetivo total. No AM, GO, MT e SC, essa participação já ultrapassa os 30%.

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Outro estudo nacional inédito sobre o tema, denominado "Mulheres nas instituições de segurança pública", divulgado no ano passado, também elaborado pela Senasp, que incluiu pesquisas quantitativas com mais de 6 mil profissionais do sexo feminino de todo o País, além de entrevistas individuais, com policiais civis, militares e peritas criminais, detalhou os obstáculos enfrentados pelas mulheres policiais nas relações cotidianas.

A rejeição de mulheres para o desempenho de determinadas atividades, a recusa de alguns policiais a trabalhar com colegas do sexo feminino, as 'piadinhas' e 'gracejos', episódios de constrangimentos, humilhações, assédio moral e sexual, a falta de equipamentos de proteção individual, como coletes a prova de balas e de uniformes na modelagem feminina, a infraestrutura inadequada de instalações em delegacias e batalhões, como a inexistência de banheiros e vestiários exclusivos, entre outros problemas, foram relatados pela pesquisa.

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Se na PM a restrição para ingresso é explícita, em outras instituições, como Polícia Civil e Polícia Federal, os obstáculos decorrentes da discriminação com base em gênero (embora dissimulada) são informais, como o chamado "teto de vidro", a aparente igualdade de oportunidades de ascensão na carreira, que na prática impede o acesso das mulheres às funções mais elevadas da hierarquia policial.

A expressão foi citada na pesquisa acadêmica "As Delegadas de Polícia de São Paulo: profissão e gênero", dissertação de mestrado em sociologia, elaborada por Maria Natália Barboza da Silveira, em 2009, na Universidade Federal de São Carlos.

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As raras indicações de mulheres para altos cargos de chefia nas instituições policiais são exceções que só confirmam a regra. Os casos isolados sempre ganham destaque na mídia, como da delegada Marta Rocha, a primeira mulher a se tornar chefe da Polícia Civil do Rio de Janeiro, cargo que ocupou de 2011 até janeiro deste ano, quando anunciou sua saída, para disputar as próximas eleições.

Em 2009, o jornal The Guardian publicou um longo texto, sob o título "Feminismo e M-16s: Como as mulheres estão transformando o machismo na polícia do Rio", destacando a atuação de policiais femininas e em operações de combate ao tráfico de drogas e de armas na cidade, bem como a nomeação de algumas mulheres para cargos de chefia na Polícia Civil daquele estado.

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"Em um país onde ser policial há muito tempo é considerado trabalho de homem, a linha de frente da guerra da droga do Rio - um mundo de sangue, suor e balas que deve estar entre os mais machistas do planeta - é um cenário improvável para uma revolução feminista", diz um trecho da matéria. "Mas as mulheres brasileiras estão abrindo caminho nesta profissão dominada por homens", exagerou Tom Phillips, correspondente do jornal britânico no Rio.

Na Polícia Federal, embora não existam pesquisas sobre o tema, os números indicam que o "teto de vidro", de fato, é uma barreira invisível que também existe no órgão e impede as mulheres de chegarem aos cargos mais elevados na hierarquia.

De acordo com o último boletim estatístico de pessoal, de novembro do ano passado, divulgado pelo Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão (MPOG), as servidoras que ocupam cargos da carreira policial na PF correspondem a 13,8% do efetivo total dos 11,3 mil policiais da ativa. Somado ao número das que ocupam cargos administrativos, na PF as mulheres perfazem o total de 2,3 mil.

No entanto, de acordo com dados disponíveis no site, no início de março, de 23 cargos de chefias nos órgãos centrais da PF, em Brasília, apenas quatro eram ocupados por mulheres. Dentre os 27 superintendentes regionais, cargos máximos da instituição nos estados e Distrito Federal, não há uma única mulher. Nas 97 unidades descentralizadas espalhadas por todo o País, apenas cinco mulheres ocupam as chefias. Por esta amostragem, que reflete a realidade atual no órgão, as mulheres ocupam apenas 6% das funções de chefia na PF.

O "teto de vidro" – que reflete o domínio masculino na PF - parece ainda mais blindado se considerado apenas o número de delegados, categoria que se autodenomina "classe dirigente", embora a Constituição não estabeleça exclusividade do cargo para ocupação de funções de direção, de livre nomeação. As delegadas correspondem a 15,7% do número total de atuais 1,7 mil servidores, de ambos os sexos, no cargo de delegado da PF. Ou seja, o percentual de mulheres é mais que o dobro daquelas que ocupam cargos de chefia.

Na PF, o domínio masculino tem raízes históricas. Prestes a completar 70 anos, o órgão foi dirigido por coronéis e generais, por quatro décadas, até 1986, quando assumiu o delegado de Polícia Civil de São Paulo e depois senador Romeu Tuma, falecido em 2010. Um coronel foi o último militar que ocupou a direção geral da instituição, até 1995. Desde então, a PF passou a ser dirigida apenas por delegados, todos do sexo masculino, inclusive o atual diretor geral.

A discriminação começa a partir da seleção das futuras policiais. No último concurso, realizado no ano passado, a intervenção do Ministério Público Federal impediu que candidatas fossem eliminadas no teste em barra fixa, na modalidade dinâmica, cujas exigências são as mesmas para homens e mulheres. A direção da PF se viu forçada a fazer alterações de última hora no edital, embora desde 2006 os exames de aptidão física dos concursos da PF vêm sendo questionados pelo Ministério Público Federal.

Para o MPF/DF, os requisitos são discriminatórios e inconstitucionais porque a PF tem desconsiderado a "notável disparidade de potência muscular entre homens e mulheres". Na percepção machista dos gestores da PF, predominante nas Forças Armadas, o requisito da força física ainda parece ser tão importante quanto capacidades e habilidades intelectuais, nas quais as mulheres concorrem em condições de igualdade com os homens.

Na Polícia Rodoviária Federal (PRF), onde as mulheres representam 9,5% do total do efetivo de policiais da ativa, a situação não é muito diferente.

Já no Ministério da Justiça, duas mulheres ocupam cargos importantes na estrutura hierárquica da pasta, à qual estão subordinadas a PF e a PRF: Márcia Pelegrini, secretária executiva e Regina Miki, secretária nacional de Segurança Pública.

Os números revelam que as instituições policiais brasileiras não incorporaram, de fato, mudanças em suas políticas e estruturas para o aproveitamento pleno do potencial de trabalho, da facilidade de planejamento e organização, da capacidade intelectual e crítica das mulheres.

Assim como em outras carreiras profissionais, em que as mulheres também são vítimas de preconceito e sofrem as conseqüências da discriminação por gênero, as policiais brasileiras têm pouco a comemorar e muito a reivindicar. Para que a igualdade entre homens e mulheres, no acesso e desenvolvimento das carreiras profissionais, ultrapasse o discurso acadêmico e a retórica política, é fundamental que não sejam lembradas apenas no "Dia Internacional da Mulher".

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