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Pedro Simonard

Antropólogo, documentarista, professor universitário e pesquisador

92 artigos

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Mais de 500 mil mortes e crise econômica esticam a corda

Os trabalhadores e trabalhadoras estão cada vez mais impacientes. A oposição ocupa as ruas. Em resposta, Bolsonaro e o partido militar aumentam o nível das ameaças à democracia e procuram mobilizar seus apoiadores

(Foto: Alexia Martins/Mídia NINJA)
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O fim de semana de 19 e 20 de junho foi movimentado tanto à direita quanto à esquerda. Cerca de 700 mil manifestantes ocuparam as ruas de mais de 400 cidades espalhadas pelo Brasil. Grandes manifestações contaram com manifestantes de esquerda e bolsonaristas arrependidos. Ausência sentida em boa parte dessas manifestações, o PDT sobre a batuta de Ciro Gomes se parece que, cada vez mais, com uma linha auxiliar do projeto neoliberal no Brasil.

Por outro lado, este fim de semana foi marcado pela marca de 500 mil mortos por covid. Este número se equivale à quantidade de mortos em países que se encontram em guerra há longos anos. No Brasil, bastaram um ano e quatro meses. Assustador! O presidente Jair Bolsonaro não deu uma declaração. Não foi capaz de emitir uma nota de pesar e conforto para as famílias enlutadas. Estes números são, para ele, a prova de que seu projeto de genocídio de idosos, pretos e pobres caminha de vento em popa.

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Além das passeatas nas ruas, a oposição se prepara para duas novas ações institucionais. A primeira será a apresentação de um super pedido de impeachment contendo mais de vinte crimes cometidos por Bolsonaro. A segunda ação foi iniciativa do deputado federal Henrique Fontana (PT-RS) que protocolou um projeto de lei que tira do presidente da Câmara dos Deputados e transfere para um terço dos deputados a deliberação sobre o recebimento de denúncias de impeachment contra o presidente da República. Ambas ações procuram pressionar o atual presidente da Câmara, deputado Arthur Lira (PP-AL), para que ponha em votação algum dos mais de 60 processos de impeachment que ele mantém engavetados. Some-se a estas duas ações o prosseguimento da CPI do Genocídio e as declarações do senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP) de que a opção pela cloroquina e a hidroxicloroquina envolve uma rede de corrupção.No dia 21 de junho, o corregedor do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), Luís Felipe Salomão, deu 15 dias para Bolsonaro e outras autoridades explicarem as recorrentes declarações de que houve fraude nas eleições de 2018. É preciso que eles se expliquem. Que houve fraude todos nós sabemos. A fraude das notícias falsas e do esquema da Cambridge Analytica e todo o plano fraudador montado sob os auspícios de Steve Bannon, mas sobre esta, Bolsonaro e seus asseclas não falarão nada. O que Bolsonaro está fazendo é utilizar a mesma estratégia que a extrema-direita vem utilizando desde a derrota de Donald Trump, buscando deslegitimar o revés eleitoral. Está sendo utilizada pela Keiko Fujimori no Peru. Diante da possível derrota, ele já está com o discurso pronto para não aceitar o resultado: “não houve voto impresso e por isso eu perdi porque a fraude não pode ser comprovada na urna eletrônica”, “o Lula só ganhou se a eleição graças à fraude” blá-blá-blá.

Se existiu fraude em 2018, Bolsonaro que mostre as provas que tem. Se não as tiver, que se cale.

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Além da pandemia e das pressões institucionais, a situação econômica do país pressiona o governo que, cada vez mais, busca apoio no partido militar.

Segundo dados publicados no Atlas da Juventudes publicado pela Fundação Getúlio Vargas (FGV), cerca de 50 milhões de jovens entre 15 e 29 anos estão desalentados e decepcionados e querem deixar o Brasil. Desemprego, dificuldade em encontrar emprego e violência são os responsáveis pelo desalento. Segundo o Atlas, 70% dos jovens têm dificuldade em encontrar trabalho. Outro dado extremamente grave é que 27,1% desses jovens não trabalham nem estudam porque percebem o estudo como uma formação que toma grande tempo e esforço e não assegura a empregabilidade. Isso tornará ainda mais difícil a possibilidade desses jovens encontrarem emprego de qualidade, sobretudo se emigrarem.

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O governo comemora um pífio crescimento econômico de 1,2% no primeiro trimestre. Na época do governo da presidenta Dilma Rousseff a imprensa criticava crescimento semelhante tratando-o por pibinho. Hoje, as críticas são bem mais amenas e há quem comemore.

Esse crescimento, contudo, não foi suficiente para reduzir o desemprego, que deverá fechar 2021 com a média anual por volta de 14%. Crescimento com desemprego significa aumento da concentração de renda com a riqueza sendo absorvida por poucos, aumento do número de pessoas ricas e aumento da quantidade de pobres. Se juntarmos a isso a alta da inflação teremos um cenário social e econômico tenebroso detectado por levantamento produzido pelo pesquisador Daniel Duque do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getúlio Vargas (Ibre/FGV), a partir da compilação de dados produzidos pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), bem como pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE). Segundo este levantamento, o Brasil tem a segunda maior taxa de desconforto socioeconômico entre os 38 países membros da OCDE e só ganha da Turquia, primeira colocada neste ranking. Entre outros fatores graves, esse desconforto ocasiona depressão, aumento das taxas de suicídio, baixa autoestima, desalento e aumento da violência.

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Se não bastasse esta sequência de más notícias, o Brasil terminou 2020 como o décimo primeiro país em atração de investimentos, perdendo a liderança na captação de investimentos mesmo na América Latina. Esses dados foram divulgados pela  Conferência da ONU para o Comércio e o Desenvolvimento (Unctad). Durante o governo do presidente Lula o Brasil chegou a ocupar a terceira colocação no ranking dos países que mais atraíam investimentos no mundo.

A economia vai mal, as crises social e política aumentam e o governo e o partido militar, base de sustentação de Bolsonaro, reagem. Não aumentando investimentos em infraestrutura e em políticas de distribuição de renda, não tomando medidas eficazes para combater a pandemia, não combatendo o desemprego, mas propondo o aumento da censura, intensificando a difusão de informações negacionistas e não-científicas sobre a covid e a vacinação. 

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Segundo reportagem publicada no Brasil 247, em resposta a uma ação protocolada pela Associação Brasileira de Imprensa (ABI) “que denuncia o silenciamento de jornalistas por meio de ameaças, hostilização instauração de procedimentos de responsabilização criminal, censura via decisões judiciais, indenizações desproporcionais determinadas pela Justiça e ajuizamento de múltiplas ações de reparação de danos contra um mesmo jornalista ou um mesmo veículo de imprensa”, a Advocacia-Geral da União (AGU) emitiu parecer defendendo que civis que “ofendam” as instituições militares e as forças armadas sejam julgados pela justiça militar. Segundo este parecer, os militares podem trair o povo, trair os poderes legitimamente constituídos, mas não podem ser criticados. E aí chegamos à “pérola” do fim de semana, a “joia da coroa” do bestiário reacionário.Em entrevista à Veja, espécie de catálogo de produtos da extrema direita golpista, o presidente do Supremo Tribunal Militar (STM), general Luis Carlos Gomes Mattos, afirmou que Bolsonaro defende a democracia e que Eduardo Pazuello não mentiu em seu depoimento à CPI do Genocídio. Pelo conteúdo da entrevista, ela deve ter sido dada ao Coelho Branco em conversa na mesa de chá do Chapeleiro Louco.

Como se não bastasse, o general Gomes Mattos ameaçou, mais uma vez, mais um militar, ao afirmar que a oposição está esticando a corda e que ela poderá arrebentar. Esta declaração foi estratégica. Feita a um veículo de imprensa controlado por um grande grupo financeiro com histórico de apoio a medidas autoritárias, procurou mostrar que Bolsonaro tem forte apoio entre os militares e o mercado financeiro.

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Se o general vivesse no mundo real já teria percebido que o que estica a corda são 500 mil vidas perdidas para uma doença que, como bem lembrou o ex-presidente Lula, possui vacinas eficazes contra ela. O que estica a corda são mais de 14 milhões de desempregados, um crescimento econômico pífio, o desprezo que a burguesia neocolonial traidora tem pelos trabalhadores e trabalhadoras do Brasil, uma atitude covarde das forças armadas brasileiras submissas aos interesses do capital imperialista e contrária aos interesse dos trabalhadores e trabalhadoras brasileiros.

Os trabalhadores e trabalhadoras estão cada vez mais impacientes. A oposição ocupa as ruas. Em resposta, Bolsonaro e o partido militar aumentam o nível das ameaças à democracia e procuram mobilizar seus apoiadores. Entretanto, as últimas manifestações pró-Bolsonaro mostraram que o governo perdeu apoiadores e capacidade de mobilização. 

A oposição se reorganiza e sai da inércia. Contribuíram para isso o avanço da vacinação, o retorno de Lula às articulações políticas, o aprofundamento das diversas crises que assolam o país e o avanço da CPI do Genocídio.

As mudanças de quadros importantes entre os partidos de esquerda obedecem a rearranjos com vistas às eleições de 2022. Contudo, as eleições ainda estão muito longe e Bolsonaro ainda possui muito apoio.

As manifestações contra o governo tendem a crescer em tamanho e em frequência. A capacidade da oposição em manter as ruas ocupadas será fundamental em todo este processo.

As mídias de esquerda continuam desempenhando seu papel. As mídias de direita começam a se movimentar de maneira mais articulada contra Bolsonaro, mas ainda chafurdam em suas próprias contradições, querendo tirar Bolsonaro, porém sem fazer Lula crescer. Um exemplo são as linhas editoriais dos veículos controlados pelas Organizações Globo. Enquanto colunistas do jornal O Globo já falam abertamente na “solução Lula”, o Jornal Nacional fez longo editorial criticando as 500 mil mortes sem, em nenhum momento, citar o nome de Jair Bolsonaro ou de Paulo Guedes como culpados por essas mortes.

O tabuleiro está armado e as peças se movem. 

Quanto mais cedo a oposição tirar Bolsonaro, melhor. Esperar 2022 é pouco inteligente porque tudo o que ele quer e mais precisa é de tempo. Bolsonaro tem apoios importantes e, com o tempo, pode conseguir mobilizá-los a favor de um golpe de Estado e a implantação de uma ditadura. Além do mais, em 2022 todos estarão vacinados e ele, certamente, fará uso eleitoral deste fato e tomará outras medidas populistas para ganhar apoio popular.

Quanto aos militares, eles estão no poder e podem sacrificar Bolsonaro para continuarem no controle do país. 

A pressão tem que aumentar contra Bolsonaro, Paulo Guedes e pelos militares fora do poder, seja nas ruas, seja nas ruas, seja nas CPIs, seja no Congresso. Acuado, ele fala um monte de bobagens que afugentam os que nele votaram, mas não são de extrema-direita. 

P.S.: Precisamos defender uma reforma constitucional que substitua o impeachment, instrumento utilizado pela burguesia neocolonial para retomar o controle do poder, pelo recall, instrumento que coloca nas mãos do povo a destituição daqueles que ele mesmo elegeu.

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