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Luciana Sérvulo da Cunha

Luciana Sérvulo da Cunha é documentarista, produtora e ativista com atuação internacional nas áreas de cultura, impacto social e direitos humanos. Foi diretora de patrocínios da Presidência da República e trabalhou na EBC/TV Brasil. É fundadora da ONG Revivarte e lidera o coletivo latino-americano #RespeitoEmCena

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Maternidades: por uma terra sem amos

Pelas mães que hoje choram por seus filhos arrancados e exterminados por um Estado e Governo assassinos, continuaremos unidas

Sim, somos detentoras do poder do corpo da mãe. Alimentamos, protegemos, criamos e damos início à vida! Nascemos com esse poder que nenhum Homem, nenhuma Instituição, nenhum Rei, nenhum Soldado, nenhum Juiz, General e nem Capitão pode destruir. Ninamos meninos e meninas balançando berços segurando a lâmpada que lança luz sobre o mundo, provocando transformações, realizações e revoluções.

Entretanto, a tríade patriarcado, racismo e capitalismo, responsável pelas barbáries do mundo, insiste em nos tornar invisíveis e em reduzir o nosso poder e a nossa função política.

Associado dessa tríade, em mais um dia de luta, anunciamos que toda e qualquer limitação que você possa pensar que tenhamos pelo fato de sermos mulheres e mães, não é real. Ela é imaginada. Você só é possuidor de uma podre, perversa e cruel dominância conquistada pela força bruta ao longo dos séculos na tentativa de usurpação e apropriação dos nossos poderes inatos. Isso que você insiste cegamente em agredir a cada 2 minutos e a tentar matar a cada 2 horas não morre e nunca morrerá.

A vida foi, é e sempre será advinda de nós. Nós somos o início da vida e sempre seremos.

E caso você homem ainda não tenham compreendido o verdadeiro significado da palavra “maternidades” e obstinadamente tenta reduzi-la e deturpá-la a romantizando e a enclausurando em uma maternidade obrigatória para todas as mulheres e apenas em corpos específicos, te revelamos: “maternidades” é um estado. Um estado capaz de produzir amor, liberdade, solidariedade e compaixão. Um estado que pode ser sentido não apenas para os nossos próprios filhos e filhas, ou nossos filhos e filhas adotados e adotadas, mas para todas as pessoas, animais e plantas— e a todos os seres sem exceção.

Um estado que, de tão potente, transcende o próprio corpo de mulher, se espelhando e habitando em tudo e toda a humanidade.

Já vivemos um tempo onde as mulheres eram as líderes das famílias e transmitiam o poder tribal para todo o grupo. Esse poder era traduzido por potência. O matriarcado se revelava como o significado da palavra grega “arché” sendo “a origem, o início” da vida e era pleno em sua manifestação.

Até o momento que o homem chegou desafinado invadindo e inventando uma mudança nesse significado, interligando os conceitos de pai e patriarcado com os conceitos de hierarquia, mando e dominação, provocando o nascimento artificial do mito de que homens tem “poder de mando” e seriam os supostos sujeitos criadores da vida.

A obsessão dos homens tragada por inveja desde lá era e continua sendo “a transformação do corpo feminino gerador da vida em uma “coisa produtora e reprodutora”, tentando substituir o corpo gerador de vida por um “não-corpo, maquinário não-fêmea” e reivindicando esse maquinário como a meta e o fim da história humana. A mesma coisa é verdade para a Mãe natureza e para a própria terra” (Mmies)

Mas o tempo dessa confusão entre poder e dominação está se esvaindo e um outro já começou. Então abaixem os queixos, dobrem ligeiramente os joelhos e abram bem os olhos: vejam como ele desponta real e bonito se sabendo que quem desvaloriza, ridiculariza, ofende, maltrata, ataca, fere e mata uma mulher, desvaloriza, ofende, maltrata, ataca, fere e mata toda a humanidade!

Eu pergunto para vocês, mortais homens, qual dos seus olhos é mais importante, o esquerdo ou o direito? 

Mais uma vez, em mais um dia de luta, vocês tem a chance de aprender que maternidade tem que rimar com liberdade ( A.Thurler), que o poder de um verdadeiro líder não é dominar ou controlar, que a verdadeira humanidade só virá à tona quando as qualidades femininas e masculinas em vocês forem equilibradas. E que “toda mãe “guerreira” é uma mulher sobrecarregada, abandonada pelo Estado, pela família e que foi ensinada a acreditar que exploração e o trabalho não pago é amor” ( A.Sharp).

Que todas as mulheres, que todos os tipos de mães e maternidades, que todos os corpos sejam reconhecidos em suas potências, necessidades, diversidades e liberdades.

Pelas mães que hoje choram por seus filhos arrancados e exterminados por um Estado e Governo assassinos, continuaremos unidas, unidos e unides, fazendo dessa “luta final uma terra sem amos”.

* Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.