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Maria Luiza Franco Busse

Jornalista há 47 anos e Semiologa. Professora Universitária aposentada. Graduada em História, Mestre e Doutora em Semiologia pela Universidade Federal do Rio de Janeiro, com dissertação sobre texto jornalístico e tese sobre a China. Pós-doutora em Comunicação e Cultura, também pela UFRJ,com trabalho sobre comunicação e política na China

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Melhor que isso, só outros tantos disso

Mas, afinal, quem é o agente secreto? A interpretação é livre, e o artigo tem a sua

Wagner Moura em 'O Agente Secreto' (Foto: Divulgação)

Bastou elenco, roteiro, direção, montagem e câmera à mão. Toda e qualquer dúvida sobre a necessidade de eleger Lula e fazer maioria no Congresso em 2026 está dirimida com o filme ‘O agente secreto’, já em cartaz. A obra é mais uma com assinatura de Kleber Mendonça Filho, o pernambucano que a partir da sua aldeia enxerga “o quanto da terra se pode ver do Universo”, fazendo coro com a prosa de Fernando Pessoa, e se junta ao sambista-poeta-compositor Arlindo Cruz que descreve a sua suburbana Madureira carioca como “o meu lugar, é cercado de luta e suor, esperança num mundo melhor, e cerveja pra comemorar”.

‘O agente secreto’ acrescenta um conto na história da ditadura no Brasil com recorte no ano de 1977. O protagonista é Armando, jovem professor universitário de instituição pública, acadêmico com formação pós-graduada no exterior e especialista em tecnologia. Na chefia de grupo de pesquisadores, descobre e patenteia um novo processo de produção energética. A patente que permite ao setor público garantir a utilização do serviço para a causa comum do desenvolvimento nacional, quer ser apropriada por empresário relacionado com os poderes da ditadura. A determinação de Armando em barrar a investida, assina sua sentença de ‘cabra marcado para morrer’.

Achado e resistência são chaves para expor a violência do Estado dominado há 525 anos pelas elites conservadoras e reacionárias que no tempo de agora aceleram a luta pela apropriação da coisa pública pelo interesse privado. Assim como ontem, o extermínio do contrário, ou sua perspectiva, segue sendo método tal qual como naqueles anos de ditadura oficializada.

O filme é um longa-metragem como dos velhos tempos. São 2h38min de um tudo ao mesmo tempo do que acontecia no país. Uma titânica intertextualidade que costura os correres do cotidiano, do prosaico ao profundo, sempre perpassados pela violência sem perder o fio da meada. A circularidade do roteiro sustenta o clima de barra pesada sem jogar o filme no lugar comum de um thriller de ação. Para isso conta com a cumplicidade orgânica da câmera e da montagem. A tomada do movimento dançante das costas de Armando atravessando com entrega um bloco de carnaval depois de saber que estava sendo caçado por matador de aluguel, é só mais um dos tantos outros muitos momentos capazes de realizar o inaceitável da brutalidade contra o sabor das pequenas alegrias da vida.

Em ‘O agente secreto’ está tudo às claras. Figurino, cenografia e reconstituição de época funcionam como mais um gerador de mergulho no tempo e no espaço. No salto para o presente, os acontecimentos são preservados por uma jovem pesquisadora que grava a memória num pendrive e entrega ao filho de Armando. Agora, a história está no bolso do jaleco do médico Fernando de quem depende decidir o que fazer com isso.

Wagner Moura vive Armando/Marcelo/Fernando. Marcelo é o codinome adotado por Armando para tentar driblar a repressão. Pelas atuações, recebeu o prêmio de Melhor Ator no Festival de Cinema de Cannes deste ano de 2025. No mesmo evento, o diretor Kleber Mendonça Filho foi premiado por Melhor direção. No Oscar de 2026, ‘O agente secreto’ vai representar o Brasil na categoria Melhor filme internacional. Que venha. 

Mas, afinal, quem é o agente secreto? A interpretação é livre, e o artigo tem a sua.  O agente secreto é o Estado que executa os mandos e desmandos das elites conservadoras e reacionárias que se apropriam do aparelho estatal. Recente, Wagner Moura traçou um perfil papo reto sobre o que é essa ideologia dominante: "Eu não posso explicar a Lei Rouanet para quem ainda não assimilou a Lei Áurea". Como se dizia na época, “é isso aí, bicho”.  

 

* Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.