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Pedro Maciel

Advogado, sócio da Maciel Neto Advocacia, autor de “Reflexões sobre o estudo do Direito”, Ed. Komedi, 2007

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Meu bisavô Antonio Menon

Escrevo esse artigo em homenagem às pessoas como Antonio Menon

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 “Pois todo aquele que a si mesmo exaltar será humilhado, e todo aquele que a si mesmo humilhar será exaltado” (Mateus, 23:12)

 Num desses domingos preguiçosos, minha mãe e eu assistíamos na GLOBONEWS uma matéria sobre imigrantes; milhões de pessoas deixam seus países em razão da fome, de revoluções intermináveis, de guerras e de incivilidades de todo gênero; dramas pessoais e familiares que não interessam a ninguém; externalidades, dirão os mais frios analistas.

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 Chegamos à conclusão de que estudamos História a partir da vida e dos feitos de reis, rainhas, nobres, barões, generais, das celebridades e dos vencedores; aprendemos a valorizar a coragem de Colombo e Pedro Alvares Cabral, navegadores e descobridores, mas esquecemos das pessoas como nós, de seus sonhos e desejos.  

 E, como partirmos da perspectiva dos “reis e generais”, ignoramos o genocídio, o sofrimento e a dor que suas decisões causam. Será que aprendemos a normalizar atrocidades e vê-las como preço a ser pago, como preço para o progresso? Não sei, mas Henry Kissinger escreveu que “A História é a memória dos Estados”, ou seja, a história oficial ignora as pessoas.  

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 A crueldade humana, a partir do século XVI, sequestrou e escravizou nossos irmãos da África e impôs que europeus, desde meados do século XIX, deixassem seu país e suas famílias na busca de sobrevivência; essa tragédia segue acontecendo até hoje.  

 Nesse contexto lembramos do meu bisavô Antonio Menon, cujos pais fugiram da miséria imposta ao povo italiano pelos seus líderes.

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 Tentamos mudar de assunto e falar sobre coisas alegres, como a chegada da minha primeira neta, a Isabela, ou apenas a Bela, mas minha mãe, acabou retomando o assunto ao lembrar da expectativa e alegria do meu bisavô, em razão do meu nascimento, eu seria o seu primeiro bisneto.

 Então voltamos a Antônio Menon, que nasceu em Campinas em 1896, filho de italianos colonos da fazenda Santa Elisa; pontepretano apaixonado (foi voluntário nos mutirões que construiu o majestoso; um homem simples, anônimo, cuja vida não consta nos livros de história).

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 A Fazenda Santa Elisa, ligada ao IAC, é muito especial, pois, além dos experimentos do Instituto Agronômico de Campinas que salvaram a economia brasileira, ela guarda a história de gente simples e trabalhadora como a do meu bisavô Antonio Menon, casado com a italiana Domenica Catarina Cesarina Pesin Menon, pai de Maria, minha avó e da tia Natalina.

 Meu bisavô era funcionário do IAC, morava na colônia, e era charreteiro e responsável por comprar os mantimentos para as famílias e para a área administrativa e técnica do IAC. Minha mãe disse que “ele era muito gentil com todos, discreto, mas que chamava atenção pelos lindos olhos azuis e seu sorriso cativante”; ele orgulhava muito por ser o responsável pelo transporte das professoras ao “grupo escolar” da Santa Elisa; diariamente de charrete ele ia buscá-las e, ao final do dia, as levava de volta em segurança, oferecendo respeito e a reverência que os professores e professoras merecem (uma das professoras era avó do advogado Luiz Eugênio do Amaral Medeiros, meu colega de turma, eu a conheci já bem idosa).

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 Antonio Menon tinha a consciência do valor da educação formal para aquelas crianças e adolescentes e da importância dos professores e professoras a para transformação da vida de cada um.

 Uma curiosidade: os “grupos escolares” foram criados no Estado de São Paulo em 1893, para ser uma escola para a seleção e a formação das elites, foi apenas a partir de 1920 que teve início a inclusão das massas populares na educação formal.  

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 No século XVI os europeus “civilizados” deram início ao sequestro de mais de 4 milhões de pessoas na África, enviando-os ao Brasil como escravos (sei que esse não é o meu lugar de fala, mas é lugar de indignação e solidariedade definitiva), foi no final do século XIX que italianos, como minha bisavó Domenica, deixaram seu país basicamente por motivos econômicos, mas também por guerras que não interessam ao povo, mas às ambições.  

 No caso específico da Itália, depois de um longo período de mais de 20 anos de lutas para a unificação do país, sua população, particularmente a rural e mais pobre, tinha dificuldade de sobreviver tanto nas pequenas propriedades que possuía ou onde simplesmente trabalhava, quanto nas cidades, para onde se deslocava em busca de trabalho. Nessas condições, portanto, a emigração era não só estimulada pelo governo, mas era também uma solução de sobrevivência para as famílias. Assim, é possível entender a saída de cerca de 7 milhões de italianos no período compreendido entre 1860 e 1920.

 Reis, rainhas, nobres, barões, generais, presidentes, ditadores, celebridades e  vencedores sempre causaram dor e sofrimento, pessoas como Antonio Menon nunca.

 Não sei quando os pais de meus bisavôs chegaram ao Brasil, mas presumo que fugiram da miséria imposta à população italiana por mais de 20 anos de lutas para a unificação da Itália; sei também que meu bisavô é filho do amor de imigrantes que fugiram da fome; sei que ele acompanhou duas grandes guerras; que jovem ainda, testemunhou a revolução de 1930 e o golpe de 1937; depois a deposição de Getúlio Vargas em 1945, seu retorno pelos braços do povo em 1950 e seu suicídio em 1954. Mas ele nunca falava sobre isso, falava da sua Domenica, do amor por suas filhas, netos e netas e da alegria de ter sido responsável por levar mantimentos para a colônia e pelo transporte seguro das professoras até o grupo escolar da Fazenda Santa Elisa.

 Escrevo esse artigo em homenagem às pessoas como Antonio Menon.

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