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Denise Assis

Jornalista e mestra em Comunicação pela UFJF. Trabalhou nos principais veículos, tais como: O Globo; Jornal do Brasil; Veja; Isto É e o Dia. Ex-assessora da presidência do BNDES, pesquisadora da Comissão Nacional da Verdade e CEV-Rio, autora de "Propaganda e cinema a serviço do golpe - 1962/1964" , "Imaculada" e "Claudio Guerra: Matar e Queimar".

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Morreu o escritor José Rubem Fonseca. Junto vai o ativista político

"Seus livros, inegáveis obras primas, o fizeram consagrado, e talvez ele não quisesse misturar os circuitos entre o militante de direita que foi, e o escritor com aura progressista que se tornou", escreve a jornalista Denise Assis, sobre a morte do escritor Rubem Fonseca

(Foto: Divulgação)
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Por Denise Assis, para o Jornalistas pela Democracia 

A morte do escritor José Rubem Fonseca enterra também, para sempre, a figura do “ativista” que ele jamais assumiu publicamente. Pelo contrário, nos anos pós 1970, tornou-se o cara recluso, fugidio e avesso às interpelações da mídia. Seus livros, inegáveis obras primas, o fizeram consagrado, e talvez ele não quisesse misturar os circuitos entre o militante de direita que foi, e o escritor com aura progressista que se tornou. Ironia: chegou a ter o livro “Feliz Ano Novo”, lançado em 1975, censurado e recolhido das livrarias pelo governo dos militares, que ajudou a colocar no poder. Fonseca foi um dos coordenadores do Ipês, (Instituto de Pesquisa e Estudos Sociais), instituição de fachada para a conspiração do golpe de 1964.

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Foi delegado de Polícia e usou a experiência em seu livro “Agosto”, para montar a ambientação e o comissário Mattos, o personagem central, que muitos apontam como o seu “alter ego”. Depois trabalhou como assessor de Antônio Galotti, ex-presidente da Light de 1956 até o final dos anos de 1970, sempre muito próximo ao comando da ditadura. Foi ele quem apresentou o talentoso redator ao general Golbery, quando este, tendo como braço direito o engenheiro Glycon de Paiva, (um dos fundadores da Benfam), fundou o Ipês. 

Ali, José Rubem Fonseca exerceu todo o seu talento com a escrita e a sua objetividade para coordenar o Grupo de Opinião Pública. Cabia a ele não só redigir textos de propaganda a serviço do golpe, como também manter contato através de cartas com as empresas e instituições que pudessem colaborar financeiramente com o núcleo de conspiração. Escrevia a sindicatos - que quisessem contratar cursos para a formação de quadros com viés de direita - e artigos para serem distribuídos na imprensa, assinados por figuras de proa do empresariado. Sim, eles estavam par e passo com os militares na preparação da derrubada do presidente eleito, João Goulart.

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Ao pesquisar a documentação do general Golbery, para uma reportagem para o Jornal do Brasil, descobri que o Ipês também produziu um conjunto de 14 filmes de curta-metragem e, para a surpresa geral, que eram de José Rubem Fonseca os roteiros concisos, ágeis e bem elaborados. Terminada a reportagem dediquei-me a escrever o livro: “Propaganda e Cinema a Serviço do Golpe – 1962/1964”, a fim de contextualizar toda esta engrenagem montada pelo Ipês de propaganda e mídia. Ali o foco era convencer a opinião pública a, não só a aceitar o golpe, como a torcer por ele. (Faz lembrar algo?). 

Entre a documentação um dos papéis comprovava - a partir de um bilhete de Carlinhos Niemeyer (produtor do famoso Canal 100), dando instruções e sugerindo mudanças -, que eram de Fonseca os roteiros pró-golpe, que faziam a cabeça de multidões país a fora.

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Perto do lançamento, do livro, em 13 de março de 2001, entrei em contato com a assessora do escritor, para que ele se pronunciasse a respeito. Negou-se. Mandou dizer que ninguém tomaria conhecimento do meu livro. Ao ver, porém, no ar, no domingo anterior à data de lançamento, uma extensa matéria feita para o Fantástico, da TV Globo, com entrevista comigo e exibição de trechos dos curtas, entrou em contato com a emissora para encaminhar uma nota a ser lida em seguida da matéria. Nela dizia não se lembrar de ter redigido os roteiros, mas admitia ter participado do Instituto, até o dia do golpe quando, por discordância, havia deixado o cargo. 

Porém, no dia do lançamento do livro, nos jardins do Palácio da República, um senhor de terno azul marinho, que aguardava na fila de autógrafos, me entregou uma pasta. “Vim aqui só para dar isto a você”. Dentro havia a ata de dissolução do Ipês, em agosto de 1972 (quando a esquerda estava sendo dizimada nas ruas e torturada nos porões), com a sua assinatura. “Ele ficou lá o tempo todo”, me disse a pessoa, que misteriosamente se foi, se misturando aos convidados. 

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José Rubem Fonseca, o escritor, foi bem maior que isto. Bastava vir a público dizer, com tranquilidade, que participou, mas no final mudou de posicionamento político. Preferiu, porém, carregar pela vida toda esta aura de mistério e fuga, quem sabe, fazendo ele um personagem de si mesmo.

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