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Emir Sader

Colunista do 247, Emir Sader é um dos principais sociólogos e cientistas políticos brasileiros

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Mudou a forma da crise

"A crise apenas mudou de forma, não terminou. Teria terminado e tivéssemos um governo eleito democraticamente pelo povo, que buscasse a superação da fonte ultima da crise: o modelo neoliberal", avalia o sociólogo e colunista Emir Sader; para ele, a permanência e até a radicalização do modelo neoliberal "reproduzem as raízes da crise"; "Cabe à esquerda, mantendo sua unidade, encontrar as novas formas de luta, que articulem a resistência democrática com a defesa dos interesses da população, para recuperar iniciativa e voltar a construir uma alternativa de governo na sociedade"

Mudou a forma da crise
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As eleições deste ano deram um desfecho para a mais longa e profunda crise politica da historia brasileira. O que ela de fato mudou na situação do pais e nessa crise?

As mudanças no Brasil se deram mediante três circunstancias, que configuraram o golpe, que representou a colocação em pratica da guerra hibrida, a nova estratégia da direita em escala internacional. A derrubada da Dilma sem nenhum fundamento jurídico, como uma operação politica de tirar o PT do governo, da forma que fosse, velho sonho da direita, desde sua primeira derrota, em 2002. Não fosse isso, o PT estaria governando até agora.

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Em segundo lugar, o processo, a condenação, a prisão do Lula e sua arbitraria exclusão da disputa presidencial, sem nenhum fundamento jurídico. Sem o que o Lula teria sido eleito presidente do Brasil no primeiro turno e estaria formando o novo governo.

Em terceiro, as tramoias também absolutamente ilegais, na campanha eleitoral, com as "fake News e os robôs, que viraram a campanha e levaram à vitória do candidato da extrema direita. Sem o que, o Haddad teria ganho as eleições.

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São um conjunto de medidas que caracterizam uma operação golpista, típica da guerra hibrida, um exemplo que, da mesma forma que o golpe de 1964, anuncia as novas formas de ação da direita no Brasil e, também, na América Latina.

O juiz é ladrão, roubou os três gols que deram a vitória ao adversário, mas o jogo acabou, com resultado desfavorável, embora o campeonato não tenha terminado.

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Mas o que mudou com essas transformações negativas para o campo da esquerda?

Em primeiro lugar, que a direita, bem ou mal, elegeu um presidente. Que tem a legitimidade legal que o Temer não tinha.

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Em segundo, que é um presidente de extrema direita, que já organizou seu governo - pelo menos sua primeira versão -, que tem três eixos: os militares, a equipe econômica com Paulo Guedes e a equipe da Lava Jato, com Sergio Moro. E' um governo que tem um eixo de manutenção e aprofundamento do modelo neoliberal, com mais privatização do patrimônio público, menos direitos ainda para os trabalhadores e menos recursos ainda para as politicas sociais. Uma politica de terra arrasada sobre o Estado e os direitos da população.

Em terceiro, isso coloca a esquerda e o conjunto do movimento popular na defensiva. A iniciativa está nas mãos do governo e da direita, que deve começar o ano com ofensiva ideológica e de medidas econômicas e repressivas. Obrigatoriamente temos que nos defender, unir nossas forcas, mobilizar nossa forca acumulada e, ao mesmo tempo, valendo-nos dos problemas que vão se escancarando do novo governo, começar a recuperar setores que perdemos, especialmente no serviço publico, na educação, nos estudantes, nas mulheres, nos negros, nos jovens, nos trabalhadores.

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Vamos ter um ano muito turbulento, de ofensiva do governo, de reação popular, de cujo enfrentamento resultarão os avanços que o governo consiga e as forcas que consigamos acumular. O jogo é feito a dois, se joga de um lado e de outro, mesmo se as forças hoje são muito desiguais, pela vitória eleitoral deles e pela nossa derrota.

O cenário politico mudou, os prazos também. Ha um governo muito mais assumido, com suas teses neoliberais radicais (que continuam a ser o eixo fundamental do governo) e sua ideologia conservadora e repressiva. Um governo que tem uma liderança com carisma, com apoio popular, pelo menos inicial.

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Uma vitória eleitoral que impôs sua agenda como prioritária: luta contra a corrupção do PT, problema de segurança publica, questões morais com viés conservador. Os temas sociais ficaram marginalizados. Não quer dizer que não tenham apelo forte na população. Tanto assim que o Lula, que representa fortemente a prioridade das politicas sociais, teria triunfado no primeiro turno. E o próprio Haddad, até ser vitima daquelas monstruosas operações de internet, tendo numa mão um livro e na outra uma carteira de trabalho, estava liderando as pesquisas.

Mas a direita conseguiu reconfigurar a agenda na cabeça das pessoas, os temas sociais ou estão escondidos – emprego, salario, educação, saúde -, só aparecem sob forma descaracterizada ou estão neutralizados. Como se não fossem temas que tivessem que ser abordados diretamente, mas com a propagação da ilusão de que a economia vai voltar a crescer com menos gastos do governo, com privatização de empresas, com supostamente menos corrupção, com participação maior da empresa privada, etc., etc. e, com isso, os outros problemas seriam resolvidos, como é característico dos governos neoliberais.

O ponto mais frágil do governo é sua política econômica, que necessariamente vai enfraquecer seu apoio popular, como ocorreu com o Temer e com o Macri. A luta contra a corrupção já foi fortemente abalada pela composição com políticos notoriamente corruptos e com o Bolsogate. A luta contra a insegurança das pessoas rapidamente também perderá força, conforme a ação mais violenta ainda da policia provoque os efeitos contrários na população.

Do lado da oposição, o primeiro ponto frágil é sua derrota, o não ter sido capaz de evitar tanto a derrubada da Dilma, quanto a prisão do Lula e a virada eleitoral fajuta por parte da direita. Unir esses três golpes significa, inegavelmente, uma grande derrota, mesmo se, ao contrario daquelas sofridas nos anos 1990, não necessariamente nós tenhamos tornado minoria e isolados politicamente.

Mas a ação da direita desarticulou nossa capacidade de ação e nossa perspectiva de dar volta à situação. A derrota afeta a confiança da militância e do eleitorado de esquerda. Nos deixa na defensiva, dependentes das ações do governo, sem perspectiva de revirar a situação, num horizonte visível.

Além de tudo, está claro que a direita busca liquidar as esperanças dos militantes do movimento popular. Trata de desmoralizar a esquerda e fechar os espaços pelos quais a esquerda poderia voltar a se tornar alternativa de governo, seja pelo massacre discursivo, seja pela repressão concreta.

Porém a crise apenas mudou de forma, não terminou. Teria terminado e tivéssemos um governo eleito democraticamente pelo povo, que buscasse a superação da fonte ultima da crise: o modelo neoliberal. Sua permanência e inclusive sua radicalização, reproduzem as raízes da crise. Governos que mantem essa poética econômica, rapidamente perdem apoio popular e tem que apelar para a repressão.

Cabe à esquerda, mantendo sua unidade, encontrar as novas formas de luta, que articulem a resistência democrática com a defesa dos interesses da população, para recuperar iniciativa e voltar a construir uma alternativa de governo na sociedade.

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