Não inveje o homem violento, mas não seja subjugado por ele
“A reação de Renato Freitas na briga de rua só é controversa para os racistas e para quem prefere fugir sempre do agressor”, escreve Moisés Mendes
O deputado Renato Freitas será cercado de novo em algum lugar de Curitiba. É a mais previsível de todas as previsões em todo o Paraná. Tentarão puxar Freitas para mais uma briga de rua.
Se reagir e tentar devolver os socos, será denunciado mais uma vez como homem violento pela extrema direita, mas também por centristas, liberais, humanistas e até por gente que diz ser de esquerda.
Dirão que no próximo cerco Freitas deverá respirar fundo e repetir o provérbio bíblico citado por ele mesmo no vídeo que divulgou logo depois da briga do dia 19: não inveje o homem violento.
Freitas também disse, do seu jeito: não inveje esse homem, mas não se submeta a ele. Não se encolha, não recue demais e não dê a entender que está fugindo sempre. Brigue como um negro.
Citou Malcolm X, que alertou para as armadilhas da não violência como defesa contra as violências do fascismo e do racismo, e poderia ter citado Cristo, o dilema posto por Camus a Sartre (é ético ser violento?), Gandhi, Luther King, Arafat.
Poderia citar esses e todos os que se defrontaram com a encruzilhada do brigar ou não brigar, pegar em armas e erguer barricadas, atacando para se defender. Quais os limites da briga pessoal e da luta coletiva? O que é ataque e defesa?
Vale a pena responder a um soco com outro soco ou com uma gravata? Freitas deveria ter fugido do agressor, depois de levar um tapa na cara?
Deveria ter oferecido à extrema direita a outra face, pregando a não violência depois de sofrer agressão física? Depois daquele tapa na cara, deveria ter feito o que era imposto aos negros escravizados?
Resignação, submissão ao mando do outro e aceitação da condição de oprimido, como diziam e faziam contra seus ancestrais? Freitas levou um tapa na cara. Se o outro tivesse um chicote, ele teria sido chicoteado.
Operadores do Direito das hermenêuticas brancas dirão que ele deveria ter apenas se defendido. Que erguesse os braços em cruz e evitasse os socos. Mas que não tentasse revidar. Que levasse o tapa na cara e ficasse sempre na defensiva.
Freitas saiu atrás do agressor, bem mais forte do que ele e, sabe-se agora, um homem dedicado a brigas, com a certeza de que poderia vencê-lo. Ele precisava vencê-lo. E conseguiu imobilizar o sujeito.
A turma do deixa disso, só de homens brancos, não havia socorrido Freitas quando quase foi nocauteado. Mas interrompeu a briga quando o deputado estava com o controle da situação.
Depois de levar um tapa na cara. De saber que havia caído numa cilada. De antever que seria julgado e condenado sumariamente, inclusive por parte das esquerdas, mesmo que ele não inveje homens violentos.
É retocada na testa de Freitas a tatuagem de homem violento, difundida pela direita e acolhida por não direitistas sob o manto do pacifismo inflexível, inegociável e incondicional.
Para defensores da matança no Rio, do plano para assassinar Lula, Alckmin e Moraes, do uso da violência do Estado contra pobres e negros, Freitas é um homem violento. Porque ganhou a luta.
Se tivesse levado o tapa e tombado, não estaria hoje sob a ameaça de perder o mandato de deputado. Se tivesse sido subjugado fisicamente pelo agressor, seria apresentado como perdedor, fraco e covarde.
Na véspera da data da morte de Zumbi e do Dia da Consciência Negra, Freitas imobilizou um branco que tinha a missão de humilhá-lo, agredi-lo e vencê-lo num espaço público, com cenas gravadas.
O fascismo perdeu mais uma. Se o deputado negro tivesse sido nocauteado ao levar o primeiro soco, tudo estaria normal no mundo de racistas e covardes. O próximo cerco já está programado e acontecerá de novo na Assembleia Legislativa do Paraná.
Fica valendo, como síntese inspiradora das boas lutas, a frase dele no mesmo vídeo em que fala do episódio: “Eu não aprendi a baixar a cabeça”. É simples assim.
* Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.

