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Daniel Quoist, 55, é mestre em jornalismo e ativista dos direitos humanos

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Neto de Tancredo, filho de Lacerda

Tancredo Neves não merecia ser homenageado com tão deprimente escárnio para com sua luminosa memória partindo de ninguém menos de quem é seu descendente e se autointitula seu herdeiro político

Tancredo Neves não merecia ser homenageado com tão deprimente escárnio para com sua luminosa memória partindo de ninguém menos de quem é seu descendente e se autointitula seu herdeiro político (Foto: Daniel Quoist)
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Não tardará o dia em que historiadores vasculharão os primeiros 180 dias logo após as eleições presidenciais ocorridas em 26 de outubro de 2014, e que em eletrizante segundo turno o povo soberano do Brasil reelegeu com mais de 54 milhões de votos Dilma Vana Rousseff e, por consequência direta, derrotou pela quarta vez consecutiva a chapa oposicionista representada pelo pessedebista Aécio Neves.

Mas para dar relevo à tão valiosa empreitada historiadores, certamente apoiados por renomados cientistas políticos, hão de recordar o mais impressionante pronunciamento político jamais feito no Brasil após o suicídio do presidente Getúlio Vargas: o depoimento comedido, porém enérgico, pausado, porém inflamado daquele que foi seu ministro da Justiça e, mais que isso aquele a quem Vargas chamara de “o amigo certo das horas incertas” -  o mineiro Tancredo Neves.

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O discurso de Tancredo aconteceu na tarde dia 3 de outubro de 1954, exatamente 40 dias após Getúlio Vargas haver alvejado o próprio peito em 24 de agosto de 1954 e, em assim procedendo, ter “saído desta vida para entrar na História” como escrevera em sua famosa Carta-Testamento.

Este pronunciamento é sob todos os aspectos e sob quaisquer que sejam os ângulos de análise, realmente impressionante quando cotejamos a similaridade das circunstâncias e das motivações, o cenário político com aquele sufocante clima de aberta conspiração contra o estado de direito e seu fétido odor de atração das vivandeiras dos quartéis, sendo a população insuflada por uma imprensa useira e vezeira na arte de torcer desavergonhadamente para que recaiam sobre o país as mais tenebrosas, e dolorosas crises políticas, econômicas e sociais – crises que, a se dar crédito pelo que esta imprensa publica diariamente nos jornais, revistas, emissoras de tevê e de rádio, o Brasil encontra-se na iminência de uma guerra civil, sofre como uma economia quebrada e inteiramente dependente de capital especulativo externo e os contingentes de desempregados fariam inveja aquele cenário de triste memória que levou o mundo à Grande Depressão de 1929/1930.

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A História se vale de muitos recursos narrativos. Relata os dramas da Nação, abre espaço tanto para seus legítimos democratas quanto para seus sacripantas traidores, aqueles que cometem inúmeras e repetidas vezes o crime de lesa-pátria. Mas a História quando resolve lançar mão do recurso da ironia, torna-se então imbatível.

Convém primeiro contextualizar o ato político de Tancredo. O seu discurso foi feito na tribuna da Câmara dos Deputados logo após as eleições de 3 de outubro de 1954 – para o Legislativo e o governo de 11 Estados. O deputado Tancredo Neves, que tinha então 44 anos de idade, faria uso da palavra para homenagear o presidente Getúlio Vargas. Na noite que precedeu ao suicídio do presidente, durante a reunião ministerial, ele na condição de ministro da Justiça defendera a resistência ao golpe udeno-lacerdista. Uma testemunha relatou depois como, encerrada a reunião, Getúlio, já subindo as escadas do Palácio do Catete em direção ao quarto, voltou-se de repente e, entregando a Tancredo sua caneta Parker 21, disse: “para o amigo certo das horas incertas”. Era a sua derradeira despedida. Dali a algumas horas, os golpistas seriam marcados para toda a vida com a sua própria infâmia.

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Nos meses seguintes à morte de Vargas, Tancredo manteve-se em silêncio enquanto Carlos Lacerda continuava levando a ferro e fogo sua insana campanha para que o Brasil vivesse em um “regime de exceção” e, quanto mais se aproximava a data das eleições mais se desdobrava em defender soluções golpistas, o vice-presidente que assumira o governo, Café Filho, nomeava um ministério de golpistas - com uma notável exceção, que seria decisiva: o ministro da Guerra, general Henrique Lott.

Os golpistas sabiam ser minoria entre a oficialidade, apesar do espalhafato, paralisante para a maioria, que promoveram nos meses anteriores. Por isso, depois da morte de Getúlio, quando tudo ficou mais claro, nem mesmo se atreveram a colocar um dos seus à frente do Exército – e saíram derrotados das eleições de 1954, o que fez Lacerda berrar outra vez pelo golpe antes das eleições presidenciais, marcadas para 3 de outubro do ano seguinte. E foi exatamente nesse contexto que Tancredo decidiu falar sobre Getúlio Vargas.

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Convido minha meia dúzia de leitores a ler com atenção ao paralelismo existente entre o discurso do presidente Tancredo Neves naqueles idos de outubro de 1954 e a realidade política brasileira nesses idos de abril de 2015.

A ironia da História é que a verve corvista de Carlos Lacerda tem se personificado nas falas e gestos do neto de Tancredo, o jovem senador mineiro Aécio Neves.

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Primeiro Trecho do Discurso de Tancredo em 1954

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“Senhores:

Hoje, passado o tumulto das paixões e superada a luta pré-eleitoral dos interesses políticos, venho falar-vos de Getúlio Vargas e dos acontecimentos que mancharam os idos de agosto de traição, de sangue e de tragédia. Não quero acrescentar mais um “depoimento pessoal” a tantos que já foram divulgados. Pretendo analisar as trágicas ocorrências que culminaram no sacrifício do glorioso Presidente, de maneira a ressaltar a verdade, escoimada do entulho de mentiras e de infâmias, com que foi propositadamente oculta pela imprensa facciosa e inimiga jurada de Getúlio Vargas e de seu programa de governo.”

 

Ecos do Discurso em abril de 2015

 

Passaram-se já 180 dias desde que foram divulgados os resultados das urnas em 26/10/2014 e, ainda não passaram o “tumulto das paixões” e nem foi superada a “luta pré-eleitoral dos interesses políticos”.

Bem ao contrário, a cada dia a oposição derrotada no último pleito presidencial continua com sua banda nas ruas insuflando a população a não reconhecer o resultado eleitoral e a apear do poder a recém-eleita presidente da República Dilma Rousseff.

Nesse período a verdade permanece sob pesado bombardeio do “entulho de mentiras e de infâmias”.

E o diagnóstico de Tancredo valeu tanto para 1954 e continua valendo para 2015: a verdade foi “propositadamente oculta pela imprensa facciosa e inimiga jurada”, agora não mais de “Getúlio Vargas e de seu programa de governo”, mas sim de “Dilma Rousseff e de seu programa de governo”.

 

Segundo Trecho do Discurso de Tancredo em 1954

 

“É preciso antes de mais nada procurar identificar as origens do sentimento anti-Vargas, para poder entender os objetivos da sanha implacável dos seus inimigos. Não se explica a desapiedada campanha movida contra o grande Estadista por motivações de simples ódio pessoal. Existe algo de mais concreto, de mais substancial. A mobilização da imprensa e particularmente de certa imprensa do Rio de Janeiro contra Getúlio Vargas teve início antes mesmo do seu empossamento no governo.”

 

Ecos do Discurso em abril de 2015

 

Fosse vivo muito provavelmente Tancredo lançaria semelhante diagnóstico para os dias que atravessamos: “precisamos antes de mais nada procurar identificar as origens do sentimento anti-PT, anti-Dilma, anti-Lula, “para poder entender os objetivos da sanha implacável dos seus inimigos”.

Ocorre a mesma mobilização da imprensa denunciada por Tancredo e, também é a mesma de “certa imprensa do Rio de Janeiro” que se em 1954 era contra Vargas, agora é descaradamente contra o PT, Lula, Dilma.

E essa mobilização da imprensa “teve início antes mesmo do seu empossamento no governo”.

Suficientes os discursos de Aécio Neves e de lideranças do PSDB, DEM, PPS e outros partidos nanicos a ingressar com diversas ações no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) requerendo recontagem de votos, denunciando crimes eleitorais que teriam sido cometidos por partidos que apoiaram a chapa vencedora da petista Dilma Rousseff e fazendo outras risíveis denúncias sem qualquer fundamento jurídico, mas apenas no intuito de empanar o brilho da acachapante vitória de sua rival.

 

Terceiro Trecho do Discurso de Tancredo em 1954

 

“Inelegibilidade e maioria absoluta foram as duas primeiras batalhas que travou contra aqueles que se recusavam a aceitar o categórico pronunciamento das urnas em 1950, que o foi buscar na solidão dos pagos longínquos de São Borja, para trazê-lo nos seus braços até o Palácio do Catete. Inelegibilidade e maioria absoluta, duas teses absurdas, anticonstitucionais, espúrias, que não resistiram à sua própria fraqueza, ruindo em meio ao desaponto dos que se opunham desesperadamente ao cumprimento da vontade sacrossanta do povo, consubstanciada na sentença das urnas.”

 

Ecos do Discurso em abril de 2015

 

Nestes seis meses pós outubro de 2014 a oposição mau perdedora além de ter perdido as eleições perdeu também seus pruridos democráticos, sua até então inquestionável adesão à defesa da Carta Constitucional e ao estado de direito.

Se em 1954 “inelegibilidade e maioria absoluta foram as duas primeiras batalhas que travou contra aqueles que se recusavam a aceitar o categórico pronunciamento das urnas”, em 2015 as duas primeiras batalhas tiveram início alguns anos antes de 2014 – o julgamento midiático do chamado “Mensalão” com suas heterodoxas teorias do domínio de fato, a supressão de provas que atestassem a inocência dos acusados, o circo midiático que se montou para primeiro estabelecer a culpabilidade dos réus e só em seguida construir a argumentação jurídica condizente com o veredicto culposo.

O avanço da operação Lava Jato, promovida pela Polícia Federal e tendo inédito protagonismo do juiz paranaense Sérgio Moro com suas exóticas interpretações para temas como delação premiada, vazamentos seletivos de delações que tão-somente incriminavam políticos ligados aos partidos que apoiaram a chapa encabeçada por Dilma Rousseff.

Cereja do bolo da desfaçatez e do dirigismo processual-midiático foi a capa da revista Veja (Editora Abril) no próprio dia das eleições estampando os semblantes forçosamente sombrios dos líderes petistas Lula e Dilma e aquela injuriosa chamada “Eles sabiam de tudo”. Resultado: capa, chamada e reportagem logo foram desmascarados pela justiça eleitoral e que, fato raro em períodos eleitorais, concedeu direito de resposta ao Partidos Trabalhadores no próprio dias das eleições.

 

*Quarto Trecho do Discurso de Tancredo em 1954


            “Mas não descansaram os seus adversários. Não se limitaram à ação legítima da oposição democrática. Enveredaram, desde o primeiro dia de sua investidura, pelo caminho da injúria e do insulto, detratando cada um de seus atos, condenando a priori todos os seus esforços para resolver os nossos graves problemas econômicos, financeiros e administrativos. Nessa campanha insidiosa e constante procuravam minar a autoridade do seu governo, enquanto aguardavam um pretexto suficiente para deflagrar um movimento de maiores proporções, suscetível de provocar o seu afastamento do governo.”

 

Ecos do Discurso em abril de 2015

 

Chega a ser desconcertante a forma como esse parágrafo da lavra de Tancredo encontra expressão neste abril de 2015.

Os adversários batidos nas urnas por Dilma Rousseff e, por conseguinte, batidos nas urnas pelo PT, por Lula e por ampla maioria do PMDB, além de outros partidos menores, até o momento não conheceram um dia descanso.

Acusaram Dilma de “estelionato eleitoral” tão logo ela tomou as corretas decisões de promover o ajuste fiscal para manter a inflação sob controle, assegurar a continuidade de suas bem sucedidas políticas de distribuição de renda e de diminuição das desigualdades sociais, medidas necessárias para reativar os motores da economia com manutenção dos menores índices de desemprego já registrados na história do país.

Aécio Neves, o neto de Tancredo Neves derrotado amargamente nas urnas por Dilma Rousseff. não passou semana sem destilar ódio, rancor e maus presságios para o governo da petista:

“Dilma mentiu! Dilma precisa pedir desculpas à Nação! O PT praticou o maior estelionato de nossa história! Dilma não tem condições de sair às ruas e olhar nos olhos do povo!”.

O vice da chapa derrotada, o vetusto senador paulista Aloysio Nunes foi mais direto e incisivo em suas injúrias:

“Nós queremos ver Dilma sangrar!”

Ao mesmo tempo o PSDB - e seus satélites de direita - protocolava novas CPIs para investigar a Petrobras, mas que no fundo o desejo de investigar não passava de chuva de verão – o intuito sempre foi o de criar palco midiático para agredir o governo Dilma, convocar seus ministros diante dos holofotes das emissoras de televisão para que a população os visse constrangidos em horário nobre a ouvir as mais pesadas, grosseiras e infundadas acusações.


Quinto Trecho do Discurso de Tancredo em 1954


            “Como último e desesperado recurso, promoveram os seus inimigos o processo constitucional do impeachment. Aí, no terreno seguro dos meios democráticos, Getúlio Vargas infligiu aos seus adversários calamitosa e desalentadora derrota, com os próprios deputados do partido oposicionista votando contra o descabelado processo de impeachment.

Justamente quando as forças oposicionistas amargavam essa derrota definitiva, quando lavrava nos seus arraiais a desunião, e quando os seus líderes se recriminavam mutuamente pelo revés sofrido, quando a figura do Presidente da República mais se agigantava no meio da sanha odienta de seus inimigos, eis que a fatalidade lhes oferece o esperado butim, consubstanciado no lamentável atentado em que pereceu um oficial das nossas Forças Armadas.”

 

Ecos do Discurso em abril de 2015

 

A marcha batida da Oposição demotucana rumo ao impeachment da presidente Dilma não chega em 2015 nem mesmo a ser “como último e desesperado recurso”, antes, é o primeiríssimo recurso: a Oposição busca instrumentalizar mais e mais protestos populares nas principais cidades do país que têm como principal mote o pedido de “Impeachment!” e “Fora, Dilma!”.

São também nesses protestos que antidemocratas de carteirinha suplicam pela volta dos militares ao Poder e propõem o fuzilamento tanto de Dilma quanto de Lula da Silva.

Ao mesmo tempo a escalada de ações da chamada República do Guantánamo do Paraná, capitaneada por um juiz que flerta com rara assiduidade com atos de exceção. O juiz Moro busca criminalizar o PT ao vazar delações de que a própria contabilidade regular do PT está eivado com “dinheiro da corrupção”.

De caso pensado, Oposição e seu portentoso braço midiático fazem vista grossa e negligenciam a simples constatação que os recursos financeiros recebidos pelo PT vieram das mesmíssimas fontes que abasteceram os demais partidos brasileiros, em particular o PSDB, o PMDB e o PSB.

Ainda assim, o impeachment da presidente parece estar muito longe de ser suficiente para aplacar “a sanha odienta de seus inimigos”.

A oposição tucana exige bem mais que isso: deseja a todo custo promover o próprio estrangulamento financeiro do PT, dando robustez a aplicação de multa ao PT na casa dos R$ 200 milhões por malfeitos relacionados com a operação Lava Jato e, também, a sua proscrição enquanto agremiação partidária.

Insatisfeitos com todo o arsenal de odiosa truculência e espírito antirepublicano e gravemente vingativo, a Oposição requer nada menos que o impeachment de seu maior líder - Luiz Inácio Lula da Silva - antes mesmo de este vir a ser lançado candidato à presidência da República em 2018.

 

Sexto Trecho do Discurso de Tancredo em 1954

 

            “Agarraram-se os mentores da campanha contra Getúlio Vargas ao cadáver do major Vaz com a fúria desesperada do náufrago que depara com a derradeira tábua de salvação. Figuras corvinas de grandes líderes não deixaram um só minuto a alça do esquife mortuário do infortunado oficial, na sofreguidão mal contida do assalto ao poder.  

Não é preciso lembrar aqui o que foram os vinte dias subsequentes ao atentado. Está na mente de todos nós a orgia histérica de certa imprensa, que mal escondia o seu júbilo, a sua alegria neurótica nas dobras do crepe funerário das lamentações. “Afinal o grande pretexto”, era o que se lia nas entrelinhas das manchetes sensacionalistas. De nada valeu a serenidade do grande Presidente, que na segurança da mais completa inocência, concedeu todas as facilidades para a apuração do crime, entregou as investigações àqueles que mais se encarniçavam em inculpá-lo e abriu as próprias portas de sua residência oficial ao torvo Santo Ofício da conspiração.”

 

Ecos do Discurso em abril de 2015

 

A Oposição encontra crescente dificuldade de assimilar o resultado das urnas de outubro de 2014 e ainda busca o seu “cadáver do major Vaz”, aquele do atentado da rua Tonelero no Rio de Janeiro.

Nos últimos 180 dias o “major Vaz de Getúlio” na visão da Oposição passou a se chamar “Petrobras”: todos os malfeitos denunciados na empresa só recebiam luz se os acusados fossem ligados direta ou indiretamente ao PT enquanto as denúncias do doleiro Alberto Yousseff envolvendo a mesada de Furnas pagas ao senador Aécio Neves passava em brancas nuvens e o delegado (“Careca”) que tinha provas contra o senador Anastasia simplesmente sumia do circuito chegando até a não ser localizado para depor pela Polícia Federal.

Enquanto isso novos vazamentos, novas prisões, novas facetas que podiam causar prejuízo à imagem do partido que elegeu a presidente da República continuaram sendo explorados à exaustão pelo presidente do PSDB e seus correligionários.

Na busca desenfreada por esse fato político que conseguisse desestabilizar um governo democraticamente reeleito eis que a cada dia surge um novo estopim de escândalo artificial: em um momento é o que chamam de “pedalada fiscal”, nada mais que empréstimo momentâneo de bancos públicos oficiais para arcar com despesas de programas de tal magnitude e escopo social como o programa Bolsa Família e o Minha Casa, Minha Vida; já em outro momento aquece a tese golpista maior ao insuflar o Tribunal de Contas da União a rejeitar/reprovar as contas da campanha presidencial de Dilma Rousseff.

Como pode rapidamente atestar qualquer observador atento e imparcial da cena política brasileira a Oposição parece se guiar por um medíocre e claudicante senso de oportunismo político - capitalizar na grande mídia a efêmera fama de poder tripudiar sobre o Partido que lhe derrotou nas urnas em quatro quadras consecutivas.

O Governo, por sua vez, manteve sempre seu discurso inicial: não se escondem os malfeitos, as investigações devem prosseguir e os corruptos devem responder por seus crimes; porque nos governos do PT as denúncias são investigadas e não engavetadas como era praxe nos governos tucanos.


Sétimo Trecho do Discurso de Tancredo em 1954


            “Antes de entrar na análise desses inglórios acontecimentos é justo indagar: onde está a origem desse estranho rancor, desse ódio invencível, dessa incansável atividade contra o governo de Vargas, legitimamente constituído?

Dois objetivos supremos guiaram toda a vida pública de Getúlio Vargas: redenção das massas trabalhadoras e nacionalismo econômico. Esses dois termos não constituem postulados demagógicos e enganosos. A sinceridade do grande Presidente é atestada pelo acervo gigantesco de realizações empreendidas no sentido do cumprimento de seus dois propósitos supremos: toda a legislação trabalhista que emancipou o nosso operariado e todo o monumental edifício da previdência social estão aí para comprovar a constância dos esforços de Vargas em promover o bem-estar das classes menos favorecidas pela fortuna. São fatos concretos de que decorrem para os trabalhadores benefícios auferidos dia a dia, não são teses desenvolvidas teoricamente em conferências eruditas, com a assistência florida da nossa melhor elite dirigente. Volta Redonda, a espantosa industrialização de São Paulo, a Petrobrás, as colossais obras das usinas elétricas também testemunham a sua convicção nacionalista com argumentos mais concretos do que os meros enunciados de convicção pessoal.

Nacionalismo econômico e redenção das massas trabalhadoras, inspiração da vida de um grande estadista, constituíram também o motivo e a causa da sua morte. Interesses tentaculares viam contrariados os seus planos e em perigo as suas possibilidades de lucro. O Brasil autossuficiente significava a perda de um importante mercado, nesta hora em que os mercados escasseiam e os estoques se acumulam em proporções assustadoras.”

 

Ecos do Discurso em abril de 2015

 

Este parágrafo pode ser mantido em sua inteireza alterando apenas a expressão usada por Tancredo “governo Vargas” para “governos do PT”.

Ficaria assim se transposta a análise de 1954 para 2015: “Antes de entrar na análise desses inglórios acontecimentos é justo indagar: onde está a origem desse estranho rancor, desse ódio invencível, dessa incansável atividade contra o governo de Dilma, legitimamente constituído?”

É fato que o PT é combatido mais por suas virtudes que por seus defeitos.

Foi o PT que erradicou do Brasil a pobreza extrema, como é atestado até mesmo pelas Nações Unidas.

Foi o PT que transformou o Bolsa Família no maior programa de distribuição de renda de todo o planeta.

Foi o PT que tornou a universidade acessível a milhões de brasileiros pobres, negros, desempregados ou subempregados.

Foi o PT que promoveu a mais impressionante valorização do salário mínimo das últimas quatro décadas.

A Oposição que luta diuturnamente para inviabilizar o governo do PT é a mesma Oposição que chama os nordestinos de analfabetos, de gente sem formação política, de massa imatura constituída por miseráveis de várias gerações.

Foi o PT que pagou a sua até então “impagável” dívida com o Fundo Monetário Nacional (FMI).

Foi o PT que ousou ter uma política externa soberana e independente sem ser atrelada aos humores e aos interesses, quase sempre inconfessáveis da potência do Norte, os Estados Unidos da América.

Foi o PT que tornou realidade o sistema de cotas e de ações afirmativas para minorar o sofrimento da população afrodescendente, esse imenso contingente de brasileiros que só adentrava na história do Brasil pela porta dos fundos.

Foi o PT que tomou a si a tarefa de liquidar aquela nefasta indústria da Seca que tanto infernizou gerações de brasileiros residente na região Nordeste – e fez isso ao priorizar a construção do gigantesco projeto que é o da Transposição das Águas do Rio São Francisco.

Foi o PT que promoveu a oferta do maior volume de empregos para seus nacionais.

Foi o PT que transformou a Petrobras na gigante que ela é, sem nunca abrir mão da soberania nacional e mesmo com a gigantesco desafio de explorar o petróleo em nossa camada do pré-sal, ainda assim, manteve na Petrobras toda a cadeia de processo de sua exploração, destinando os resultados financeiros daí advindos para a melhoria da saúde e da educação do povo brasileiro.

E a lista seria imensa das conquistas sociais, econômicas e políticas que o Brasil alcançou nos últimos 12 anos.

E são essas conquistas que mais incomodam seus opositores – sejam os partidos da Oposição, seja o capital oligárquico e altamente concentrado em um pequeníssimo naco da população do centro-sul do país, sejam os interesses contrariados de meia dúzia de famílias que nos estados de São Paulo e do Rio de Janeiro comandam a imprensa nacional, ditam a agenda publica, influenciam comportamentos e desejam ardorosamente continuar a manipular a agendas de governos democráticos e legitimamente constituídos.

É isso o que incomoda e o que fere de morte a Oposição e não o que esta deseja aparentar: preocupação com a corrupção, a segurança pública, e com o acesso a saúde e a educação de qualidade.

 

Oitavo Trecho do Discurso de Tancredo em 1954

 

“Um partido oposicionista conservador e antitrabalhista, por duas vezes derrotado em eleições democráticas, em cujas fileiras – é preciso reconhecer – existem também verdadeiros patriotas iludidos na certeza de que servem aos seus ideais e não a interesses antinacionais – eis o elemento de fachada, a brigada de choque da grande conjura.

Uma imprensa conservadora também, ligada aos interesses dos grandes capitalistas nacionais e, por conseguinte, amalgamada no ódio a Getúlio Vargas e ao seu programa de governo, eis a máquina de agitação da opinião pública e de infiltração no seio das Forças Armadas, através do ludíbrio das boas intenções de oficiais dignos e bem-intencionados, mas, ao mesmo tempo, suscetíveis a uma determinada espécie de propaganda, por isso mesmo que saídos das classes mais abastadas.

Por detrás de tudo isso e acima de tudo isso, agia um grupo de notórios representantes do capital estrangeiro, de ricaços interessados em salvaguardar as suas gordas fontes de lucros em divisas. Por serem sabidamente ligados aos dinheiros estrangeiros, souberam manter-se no mais completo anonimato, arquitetando o plano cientificamente traçado de destruição do governo Vargas e velando pela sua execução, nos seus mínimos detalhes.”

 

Ecos do Discurso em abril de 2015

 

Nesta parte do discurso o velho político mineiro fez uma avaliação cirúrgica da crise política brasileira nos anos 1950 e que agora vista em perspectiva encontra não apenas ecos profundos na política brasileira dos anos 2003/2015, como também a totalidade pontos de semelhança e convergência.

O PSDB bem pode ser corretamente descrito como “um partido oposicionista conservador e antitrabalhista” com a diferença que este não foi derrotado por duas vezes em eleições democráticas, como à epoca de Getulio, mas sim, quatro vezes seguidas.

É conservador por várias razões: está incrustado majoritariamente nos estados de São Paulo e de Minas Gerais, tradicionais redutos do conservadorismo brasileiro e que remonta mesmo à política do café-com-leiote da Velha República; em anos recentes defendeu vigoroso processo de privatização, o que incluiu até a Petrobras no elenco de bens do país que poderiam ser abocanhados pelo capital estrangeiro; tem se posicionado de forma dúbia quanto ao programa Bolsa Família, em certos momentos clama por sua paternidade, em outros momentos o denomina de forma pejorativa como “bolsa esmola”, “bolsa vagabundagem”; invariavelmente é contrário à adoção do sistema de cotas raciais para acesso a universidades brasileiras; no tocante à exploração da maior riqueza de nosso subsolo, os mananciais de petróleo na camada do pré-sal, os partidos da oposição, com o PSDB na vanguarda, tem se mostrado muito à vontade para inferir que tal incumbência seja compartilhada com gigantes petrolíferas europeias, norteamericanas e asiáticas.

É conservador também por aglutinar em seu seio líderes conservadores - e quase sempre reacionários – sejam egressos do antigo regime ditatorial que enfermou o Brasil de 1964 a 1985, ou egressos das denominações religiosas mais obscurantistas nas questões de comportamento humano ou, simplesmente conservador por ter à sua volta quais satélites a serem guiados, as principais e mais tradicionais empresas de comunicação e os grupos empresariais e financeiros mais avessos ao desenvolvimento social e humano do país.

Da mesma forma, a imprensa que era conservadora em 1954 continua a mesma imprensa conservadora em 2015 – arrogam-se ao direito de eleger e derrubar governos, aprovar e desaprovar políticas de Estado e de Governo, manipulam a opinião pública de forma a eleger os seus favoritos em pleitos federal, estaduais e municipais.

Esta imprensa conservadora busca ser o único repositório da comunicação apta a receber a quase totalidade dos recursos dos governos a título de propaganda e publicidade institucional, trabalhando diuturnamente para descreditar - e até mesmo inviabilizar - os seus novos concorrentes que ganham credibilidade e escopo nos modernos meios virtuais, com sua interatividade e conectividade alcançando as próprias raízes da sociedade brasileira.

 

Nono Trecho do Discurso de Tancredo em 1954

 

“As eleições demonstraram que o povo repudiou o partido a serviço do reacionarismo que deseja nos conservar na dependência dos mercados estrangeiros. Ficou patente, hoje mais do que nunca, que as forças populistas, inspiradas pelos ideais de Vargas, reconquistarão o poder federal, esse poder que o povo, com os seus milhões de votos, colocou nas mãos de Getúlio Vargas e que os seus inimigos arrebataram pela força das armas.”

 

Ecos do Discurso em abril de 2015

 

Este é um dos últimos parágrafos do discurso de Tancredo Neves, e certamente uma das mais memoráveis e lúcidas peças da oratória política do Brasil.

E como é instigante ver o grau de similaridade dos estertores da crise que levou o grande presidente Getulio Vargas a cometer suicídio em 24 de outubro de 1954 e a crise atual, francamente artificial, que com rebuscados ardis, maliciosas intenções e evidentes tentações golpistas busca roubar do povo brasileiro o exercício de seu direito soberano: eleger seu supremo mandatário. E, uma vez consumada sua decisão, a Oposição deseja substrair do Palácio do Planalto o nome que foi ungido e festejado nas urnas, com nada menos de 54 milhões de votos – o nome da petista Dilma Vana Rousseff.

 

                                               *    *    *

 

Nos últimos dias o próprio PSDB colocou o presidente do partido em uma espécie de isolamento. Fernando Henrique Cardoso, presidente de honra do PSDB, os senadores Aloysio Nunes e José Serra emitiram declarações de “desembarque do PSDB” de qualquer aventura ou iniciativa golspita. Para esses cardeais de vistosas plumagens não há evidências nem fatos que impliquem a presidente da República em crime de responsabilidade de tal monta que enseje um pedido de impeachment.

Enquanto isso Aécio Neves continua a encampar o discurso golpista do impeachment com crescente naturalidade, esgrime ideias bem pouco convincentes de que o impeachment é instrumento constitucional, informa que jurista foi solicitado a preparar “peça jurídica” para embasar um provável pedido de impeachment de Dilma Rousseff a ser protocolado pelo PSDB nos idos de maio próximo junto à Câmara dos Deputados.

Tancredo Neves, por tudo o que representa na história do Brasil, no ano que assinala o 30º aniversário de sua morte, não merecia ser homenageado com tão deprimente escárnio para com sua luminosa memória partindo de ninguém menos de quem é seu descendente e se autointitula seu herdeiro político.

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