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Ronaldo Lima Lins

Escritor e professor emérito da Faculdade de Letras da UFRJ

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Novo golpe no Congresso: ganhar no grito, não!

Tentativas da extrema direita de impor sua vontade pelo caos expõem o perigo constante do fascismo no cenário político brasileiro

Deputados de oposição ocupam Mesa Diretora da Câmara dos Deputados. O grupo prometeu nesta semana permanecer no local até que a Casa dê uma “resposta” à prisão e às demais sanções impostas pelo ministro do STF Alexandre de Moraes a Jair Bolsonaro (Foto: Saulo Cruz/Agência Senado)

Nas idas e vindas da História, o dragão do fascismo tem garras afiadas, tentaculares. Esconde-se, às vezes, no cotidiano, parecendo inocente; emerge, em outras, disposto a tomar o poder e exercer seu domínio sem freios. Foi assim no final da II Grande Guerra, nos Estados Unidos, depois dos governos progressistas de Franklin Roosevelt, dando lugar a perseguições e restrições ideológicas com as quais o país sairia ferido e diferente. O macartismo pegou o ambiente de surpresa e produziu vítimas. Exilados alemães que lá se haviam refugiado, alguns adotando a cidadania norte-americana, viram-se compelidos a buscar abrigo em outra parte, como Thomas Mann, que terminou seus dias em Zurique, e Klaus Mann, que se suicidou em Cannes, em 1949.

No Brasil, contra eles, temos contado com uma defesa sólida por parte do Supremo Tribunal Federal e de Alexandre de Moraes, à frente das investigações em torno do 8 de janeiro. É desolador que o nosso líder da extrema direita, Jair Bolsonaro, possua uma personalidade ao mesmo tempo banal e grotesca. Ele nunca escondeu suas preferências pelos torturadores da ditadura militar. Na Covid-19, no Palácio, brincava com a morte dos seus semelhantes, atacando vacinas e pregando o uso de remédios rejeitados pela ciência. Encheu de gente fardada a administração do Estado e exorbitou nas despesas públicas para se reeleger, sem sucesso. Finalmente, conspirou, conspirou, conspirou — e fracassou. Grita agora, com seus seguidores, de desespero, procurando uma brecha para se instalar novamente no centro do poder. É a dedução que se pode recolher das manifestações comandadas pelo 01 no Congresso, apossando-se das mesas diretoras na Câmara e no Senado atrás de um fato consumado. Novamente, não deu certo.

O dragão, quando age às claras, ainda que protegido por máscaras de esparadrapo, desperta reações. A liderança do governo, apoiada pela posição contrária da opinião pública, se colocou em campo. Eles gritavam de lá e a esquerda de cá, como se, na disputa, também fosse admissível ganhar no grito. Quando Hugo Motta chegou e tomou conta da situação, abrindo espaço até a cadeira da presidência no plenário da Casa, verificou-se que o dragão cuspia fogo fátuo. Serenados os ânimos, restou a sensação de ressaca e a consciência de que, na Justiça, os processos prosseguem no seu curso natural, envolvendo Bolsonaro e seus asseclas à espera de penas, como deve ser. Este, em prisão domiciliar, aguarda as agruras do destino que, de fato, cavou para si mesmo.

A boataria que grassou no dia seguinte não foi suficiente para reavivar as intensidades da véspera. Um cansaço tomava conta das pessoas. O líder do PL, Sóstenes Cavalcante, acovardado e premido pela melancolia, desculpou-se junto ao presidente da Câmara pelos seus destemperos, estendendo as escusas a Lindbergh Farias. Desculpar soa bem, mas não apaga a extensão dos malfeitos. Punições têm de ocorrer... De outra forma, deveremos lidar, cada vez mais, com as patas do fascismo e seu bafo insuportável.

* Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.