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Oliveiros Marques

Sociólogo pela Universidade de Brasília, onde também cursou disciplinas do mestrado em Sociologia Política. Atuou por 18 anos como assessor junto ao Congresso Nacional. Publicitário e associado ao Clube Associativo dos Profissionais de Marketing Político (CAMP), realizou dezenas de campanhas no Brasil para prefeituras, governos estaduais, Senado e casas legislativas

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O bolsonarismo e o referencial teórico nazista

Bolsonarismo aposta no caos permanente para minar a democracia e manter sua influência autoritária a qualquer custo

Jair Bolsonaro - 06/03/2025 (Foto: REUTERS/Adriano Machado)

As campanhas de Jair Bolsonaro em 2018 e 2022, os quatro anos do seu (des)governo, o plano de golpe, os atos terroristas de dezembro de 2022 e de 8 de janeiro de 2023, a articulação de Eduardo Bolsonaro para sabotar a economia nacional - como no episódio do tarifaço de Donald Trump - e, mais recentemente, o sequestro do Plenário do Congresso Nacional pela bancada bolsonarista, oferecem elementos abundantes para identificarmos ao menos um dos referenciais teóricos que, consciente ou não, inspira esses atores políticos.

Carl Schmitt, jurista alemão do século XX, embora não tenha integrado o círculo íntimo de Hitler, foi um dos intelectuais que forneceram a base teórica e jurídica para o regime nazista. Seus pareceres e textos filosófico-jurídicos ofereceram uma moldura ideológica à suspensão da democracia liberal, legitimando o autoritarismo sob o manto da exceção.

Entre os diversos conceitos formulados por Schmitt, há um que ajuda a iluminar com especial clareza a estratégia bolsonarista: o da política baseada no conflito permanente, estruturada na dicotomia amigo x inimigo. Segundo Schmitt, o político se define justamente pela identificação e exclusão do inimigo. Não se trata de um oponente com quem se disputa dentro de regras - trata-se de alguém a ser neutralizado, eliminado como ameaça existencial.

Como afirma Almeida Filho em Fundamentos do Direito Constitucional, “a forma de pensar schmittiana pressupõe a ausência de qualquer critério capaz de condicionar o comportamento dos indivíduos para além da competição radical, cujo objetivo essencial é, em última medida, aniquilar por completo o inimigo político”. Ou seja, em tal lógica, não existem limites morais ou legais que regulem a convivência democrática - apenas a força como mediadora das relações sociais e políticas.

Na mesma linha, o autor reforça em 10 Lições sobre Carl Schmitt que essa concepção inevitavelmente conduz a uma dinâmica de conflito permanente, controlada apenas pela aplicação direta ou indireta da força. Trata-se de uma estrutura política que não busca o equilíbrio ou a construção de consensos, mas sim a manutenção constante do embate, de modo a impedir que o “inimigo” reúna as condições objetivas para se posicionar com força de antagonista político legítimo.

É essa lógica que parece mover o bolsonarismo: a criação deliberada de instabilidade, o bloqueio sistemático do funcionamento das instituições, a sabotagem econômica, o ataque ao sistema eleitoral, a cooptação de parcelas da população pelo medo e pelo ressentimento, e até mesmo alianças com governos estrangeiros para pressionar e chantagear o Estado brasileiro. Tudo isso com um único objetivo: manter vivo o conflito, desestabilizar a democracia e preservar o núcleo familiar e político do bolsonarismo como centro de poder e influência.

Pouco importa, para eles, se o Brasil perde, se empresas fecham, se empregos desaparecem, se a soberania é ferida. O que realmente conta é preservar a expectativa de retorno ao poder - ainda que às custas da destruição do próprio país. Para isso, utilizam a força, a ameaça, a chantagem, o caos.

Mas, como a história nos ensina - inclusive com os desfechos trágicos do regime nazista que Schmitt ajudou a justificar -, os que flertam com o autoritarismo acabam pagando um preço alto. O tempo da história pode ser lento, mas é implacável.

* Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.

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