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José Guimarães

Advogado, deputado federal e Líder do Governo na Câmara dos Deputados

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O Brasil é um sobrevivente das desigualdades

"É hora de o Brasil olhar-se no espelho da sua história e decidir se quer continuar servindo aos mesmos interesses dos poderosos de sempre", diz José Guimarães

Lula e Plenário da Câmara dos Deputados (Foto: Agência Câmara | ABr)

As injustiças sociais, arraigadas profundamente na nossa história, se reciclam, transformam privilégios em regras e desigualdades em estruturas de poder. A mentalidade aristocrática continua viva, autoritária e conservadora.

O retrato dessa desigualdade está exposto nos números escandalosos ostentados pelo País. A começar pela insuficiência dos recursos do orçamento para ampliação de investimentos no desenvolvimento e na melhoria das condições de vida da população.

Um dos aberrantes privilégios de classe, que aparecem naturalizados como política pública estão, por exemplo, nas isenções fiscais concedidas a grandes empresas e pessoas de alta renda. Os subsídios tributários federais chegaram a R$ 564 bilhões em 2024. Essa renúncia fiscal equivale a 4,8% do PIB, bem acima do teto de 2% do PIB fixado como meta até 2029 pela emenda constitucional EC-109.

Soma-se a isso a sonegação fiscal que supera R$ 500 bilhões por ano, segundo dados da Receita Federal. Esse é o retrato fiel da inversão moral: o pobre paga religiosamente os impostos, quando compra, e o rico tem defensores de seus interesses no Congresso e batalhões de advogados contatados para manobras jurídicas, a fim de não pagar impostos.

O contencioso tributário, verdadeiro labirinto de recursos e brechas legais, é outra grande frente que já acumula R$ 5,5 trilhões, dos quais mais de R$ 1 trilhão está paralisado em disputas judiciais e administrativas.

Esse imenso volume de dinheiro público está preso no liame de recursos jurídicos, enquanto o Estado é obrigado a cortar investimentos, atrasar obras ou justificar a falta de mais recursos para saúde, educação e para a rede de proteção social aos mais vulneráveis.

Quando o governo tenta corrigir essas distorções, como na recente Medida Provisória 1303, que elevava a alíquota do IOF, para fazer justiça fiscal, os defensores do regime de privilégios se insurgem. No Congresso, os representantes dos mais ricos, defensores do “liberalismo econômico” levantam-se contra qualquer tentativa de fazer justiça tributária. O resultado foi o arquivamento da Medida Provisória, uma derrota não apenas para o governo, mas para o Brasil.

Nessa toada, a desigualdade se renova a cada geração, sustentada por um sistema tributário regressivo e por uma elite política que legisla para si mesma. A justiça fiscal é o primeiro passo para a justiça social. Mas, para isso, é preciso romper o pacto silencioso que mantém o País aprisionado entre o rentismo e a servidão. Nenhum país do mundo se tornou justo e desenvolvido sem enfrentar privilégios.

Outro dreno de recursos públicos que alimenta a elite financeira e a desigualdade do País é a taxa de juros, uma das mais elevadas do mundo, estipulada pelo Banco Central, que remunera os títulos públicos. No primeiro semestre de 2025, o pagamento de juros e amortização da dívida pública alcançou R$ 1,313 trilhão, representando 53,4% do total do orçamento. Dados do Banco Central estimam que a cada ponto percentual de aumento da taxa de juros se adicionam mais R$ 50 bilhões à dívida pública.

Com tamanha desigualdade e com tantos privilégios, é hora de o Brasil olhar-se no espelho da sua história e decidir se quer continuar servindo aos mesmos interesses dos poderosos de sempre ou se, enfim, construirá uma República de cidadãos iguais perante a lei e o fisco.

* Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.

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