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Jairo Menegaz

Engenheiro agrônomo, servidor federal no IBAMA, militante fundador do PT e membro da coordenação da SMAD PT

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O caos da direita foi dominado. Falta controlar os ânimos da esquerda

A esquerda pode produzir a crise que a direita tentou e não conseguiu

O caos da direita foi dominado. Falta controlar os ânimos da esquerda (Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil)

 Buscamos neste artigo conclamar a uma reflexão mais profunda os setores

 das mídias progressistas, e membros ilustres do Partido dos Trabalhadores, que

 estão defendendo uma tese altamente discutível e perigosa de que devido a vitória

 eleitoral já temos força política suficientes para fazer um acerto de conta com alas

 golpistas do Exército. Nosso objetivo é chamar a atenção para os graves riscos que

 o nosso projeto de governo corre ao tentar dirigir os rumos do governo a partir de

 uma avaliação totalmente equivocada como mostraremos abaixo e cuja adoção se

 constituirá num grave risco a democracia do país.

 Alguns jornalistas progressistas, alguns políticos importantes, que pregam

 que o Lula tome medidas para enfrentar o militarismo e coloque a questão militar

 no centro de sua complexa agenda. Outros estão inclusive levantando uma

 hipótese incendiaria de instaurar uma CPI e outros querem a demissão do Ministro

 do Exército. Surgem mobilizações no seio da esquerda que estão assumindo uma

 grande importância política, fomentadas pelo prestígio político destes intelectuais.

 O crescimento deste movimento na sequência poderá atingir a executiva

 nacional do PT e contaminar as relações com os demais partidos, romper as frágeis

 alianças e a unidade duramente conquistadas e ameaçando nosso governo e,

 portanto, comprometendo nosso futuro.

 Este movimento em última análise se constituirá numa situação paradoxal,

 onde a esquerda produzirá a crise que a direita tentou e não conseguiu. Se seguir

 crescendo o punitivismo de esquerda trará a crise para o centro do governo, e

 ainda mais tirará o foco dos reais responsáveis. Os Bolsonaristas vão certamente

 defender os militares e procurar criar crises ao longo do governo.

 Vejamos em maiores detalhes estes pontos.

 Na conjuntura surgida depois de 8 de janeiro os jornalistas e a sociedade

 identificaram uma série de denúncias contra Militares Bolsonaristas que estariam

 sendo coniventes com o golpe e um forte movimento de setores da esquerda nas

 mídias alternativas pedindo a exoneração do Ministro da Defesa José Mucio, com

 alguns argumentos tipo “ele não fez os movimentos necessários para retira os

 golpistas da frete dos quarteis”, e “devemos aproveitar o prestigio político das

 eleições para desbolsonarizar as forças armadas” e isto se constitui em

 simplificações que devido a conjuntura explosiva se constituem em um grande

 problema, e que parte me uma lógica simplista, reducionista e desinformada de

 que algum problema iria se resolver, com a simples substituição de Ministro ou de

 alguns generais, atribuindo uma gravidade indevida ao que podemos considerar

 como uma estratégia política (equivocada talvez) para evitar um confronto com

 estas corporações, que perdurou por uma semana e foi aceita pelo nosso governo e

 pelo nosso presidente, e portanto não é de responsabilidade somente do ministro

 ou do comandante do exército.

 Fazer a demissão de José Mucio e colocar um quadro ‘linha dura’ no

 Ministério da Defesa seria um erro com proporções catastróficas pois certamente

 se produziria uma crise política, que assumiria grandes proporções na mídia e na

 sociedade que reforçará a unidade popular da direita e poderá afetar ainda mais a

 já frágil a unidade nacional, podendo se desdobrar em graves conflitos como

 provocar insubordinações e até uma insurreição militar que reergueria as ‘ordas’

 

 Bolsonaristas já conhecidas, sob um comando que poderia facilmente resultar em

 uma luta armada que logo se tornará uma guerra civil ou seja estaremos

 colaborando com a destruição da unidade nacional e cumprindo com os objetivos

 estratégicos das forças imperialistas, e por isto são extremamente perigosas.

 Trazer a pauta militar agora para o centro do governo significaria um

 congelamento das pautas de interesse público. Este movimento unificaria a direita

 em torno dos militares e nos levaria a derrota política fatalmente, pois é um tema

 candente e que assumiria certamente o centro da agenda política e destruiria a

 nossa frágil aliança de governo. Este movimento, portanto, pode ser caracterizado

 como uma traição ao nosso programa (este tema não foi sequer citado) e ao

 interesse público.

 Afrontar os militares neste momento portanto caracterizaria é um ato

 irresponsável e seria um foco de tensões permanentes. A doutrina militar cria uma

 disciplina automática onde os indivíduos atuam dentro de uma cadeia de comando,

 e segue o que for ordenado, e, portanto, existem concretas possibilidades de temos

 uma “crise de comando’ uma insubordinação que significaria que estariam

 prontamente respondendo a um comando Bolsonaristas, que reunificaria a direita

 e seria o início de uma crise de resultados imprevisíveis;

 Estamos vivendo uma conjuntura nacional e internacional extremamente

 frágil e desfavorável e enfrentar o militarismo produzirá certamente uma crise,

 que aglutinaria de novo a direita sem uma avaliação do terreno e sem considerar a

 correlação de forças.

 Ao impor esta agenda o Presidente LULA estaremos impondo um grande

 ônus de assumir uma complicada agenda de interesse internacional para a qual

 nem ele nem nós nem ninguém está preparado. Todos desejamos justiça e

 lutaremos para punir os generais que participaram dos movimentos golpistas.

 Porem isto deve ser feito dentro do devido processo legal. Só teremos condições de

 fazer isto se consolidarmos nosso governo. E a sequência dos fatos nos mostra que

 temos boas condições para isto.

 Devemos evita o fogo amigo. A conjuntura já é um barril de pólvora. Temos

 que tirar pressão deste cenário.

 As manifestações golpistas foram enfrentadas com grande sucesso.

 A violência do golpe e a rápida resposta de nosso governo, graças a

 capacidade política de Lula Dino e do Ministro Presidente do STE e do conjunto do

 governo recém instalado, conseguiu uma eficiente reação, com a intervenção no

 governo do Distrito Federal e a rápida desocupação dos prédios públicos seguidos

 do pedido de afastamento do governador do Distrito Federal Ibanes Rocha por 90

 dias, prisões do Secretário de Segurança do DF e ex ministro de Bolsonaro

 Anderson Torres, e pela prisão do Coronel comandante da PM do DF, e de mais de

 1200 golpistas presos na Papuda e em centenas de processo que estão em

 andamento.

 Estas ações tiveram repercussão favorável e com uma grande demonstração

 de unidade política na luta pela democracia e pela soberania nacional, expressa na

 reunião histórica com os governadores, e também nas grandes mobilizações da

 esquerda em onze de janeiro em todo o pais.

 Um dos principais objetivos do vandalismo praticado em 8 de janeiro era

 criar o caos e criar uma crise no governo que se inicia contando com uma GLO. A

 

 intervenção civil rompeu com a esta tradição e as medidas andam no sentido de

 retirar os militares como responsáveis para sanear problemas de segurança

 publica.

 A ampla maioria da sociedade brasileira repudiou o golpe. Estes eventos

 mostrou um caráter violento e antidemocrático da mobilização e acabou isolando o

 Bolsonarismo, e até mesmo estão ocorrendo divisões em suas bases. A grandes

 mídias capitaneadas pela Rede GLOBO, fez uma ampla cobertura que fortaleceu o

 sentimento democrático anti golpista. A FIESP a CNA, e outras representações do

 mercado manifestaram publicamente seu repudio ao golpe e a queda do dólar é um

 forte indicador disto.

 Pela primeira vez em muitos anos a esquerda estará na ofensiva e a direita

 em defensiva. A sequência das investigações que ocorrerão gradativamente trarão

 com o tempo as informações com maior clareza e estes processos certamente

 serão acompanhados pela sociedade brasileira e assim manterão a opinião pública

 a nosso favor, e a favor da atuação do STE em sua clara disposição de aplicar os

 artigos 359 do código penal, diminui e as mobilizações golpistas da direita nas

 redes sociais.

 Muitas pessoas com importantes participação no golpe, como formadores

 de opinião e empresários que forneceram recursos já estão na cadeia e/ou estão

 indiciadas em processos cujas punições precisam acontecer dentro do devido

 processo legal, em um movimento que recoloca o poder das instituições.

 Inegavelmente estes fatos caracterizam uma conjuntura amplamente favorável e a

 prioridade agora é a implantação do nosso governo significará o reestabelecimento

 da ordem democrática e a implantação de nosso programa onde se localiza o

 interesse publico real, e ao mesmo tempo permitirá o fortalecimento das

 instituições (PGR, Policia Federal, ABIN, GSI) e a continuidade dos processos legais,

 que com o tempo chegará aos militares golpistas começando pelo General Heleno,

 Braga Neto, Leônidas Pires e se estendendo a todos os demais pelos crimes

 cometidos ou seja por ”tentar depor, por meio violento ou grave ameaça governo

 legitimamente constituído, e “Tentar por meio de violência ou grave ameaça abolir

 o Estado Democrático e de Direitos (art 359 e o artigo 359 L do Código Penal, e

 estas ações já foram iniciadas por Alexander de Moraes.

 A prioridade do governo agora não é fazer um enfrentamento com os

 militares. Este enfrentamento deverá ser discutido com a sociedade e deverá

 responder aos grandes temas das relações políticas de militares e setores

 econômicos com a segurança nacional e com a segurança pública e em última

 análise com a democracia e com a soberania nacional.

 Devemos entender que a prioridade é iniciar o governo e que para tanto devemos

 neste momento ter o mínimo de conflitos. Agora não é um bom momento para

 promover este acerto de contas com a história. Os militares estão na defensiva

 neste momento, e se soubermos conduzir o processo político eles poderão ser

 controlados de maneira inteligente e eficaz não se constituirão em ameaças para o

 governo

 LULA agora estará cercado pelo staff do governo, e nos próximos momentos

 estará com controle institucional do GSI e do SNI e com apoio de todos nós, ficará

 fácil monitorar os militares deixando claro politicamente que a presença de

 militares na política é ilegal e será punida. Devemos debate uma agenda nacional

 positiva para as forças armadas e uma política de Segurança Nacional.

 

 Em conclusão: não existem objetivos políticos concretos para LULA demitir

 o Ministro da Defesa José Múcio, pois esta demissão traria um tema para o qual não

 estamos preparados e que não é uma prioridade nacional como querem afirmar os

 defensores desta proposta. Isto significaria uma aventura, posto que não temos

 nenhum consenso sobre o que fazer com um tema desta envergadura que nem

 sequer foi debatido em nosso programa. Não foi devidamente avaliado o preço

 político de um enfrentamento do tema militar neste momento onde nem sequer

 assumimos o governo onde não temos sequer o controle do GSI (Gabinete de

 Segurança Institucional da Presidência da Republica) e nem da ABIN (Agencia

 Brasileira de inteligência) pois isto não se faz de uma hora para outra e que não

 temos dados para avaliar a correlação de forças e os riscos destes movimentos e

 pauta-los sem saber o que queremos ou onde vamos chegar é uma temeridade e

 uma irresponsabilidade.

 A questão militar é extremamente complexa e o enfrentamento desta

 agenda é de grande responsabilidade e é necessário uma ampla participação ampla

 da sociedade e um tratamento técnico politico a altura destes desafios. Neste

 sentido trago alguns pontos devem ser levados em conta neste debate:

 1. A questão militar é importante e complexa e não se resolverá com mediadas

 pontuais de exoneração de ministro ou punição de um ou outro general

 2. A questão militar se refere dois temas centrais da vida nacional: a democracia e

 a soberania nacional.

 3. A importância e a complexidade destas relações inscreve o tema dentro dos

 grandes debates e das grandes reformas, que em síntese se resume a regulamentar

 as relações dos poderes econômico midiático e militar com o processo democrático

 do pais e se referem às reformas politicas, reformas econômicas, reformas das

 comunicações de massa, e por último na questão da defesa nacional e segurança

 publica que tem em seu bojo a reforma militar.

 4. As Forças Armadas são a instituição na qual o brasileiro mais confia, de acordo

 uma pesquisa de opinião feita em 2014 pela Fundação Getulio Vargas[9] e pelo

 Datafolha.

 5. O tema da reforma militar extremamente polemico e divide a sociedade nacional

 e é de tal forma apaixonante que substituirá as agendas prioritárias do interesse

 publico.

 6. Esta agenda destruirá a frente ampla construída por Lula e pelo governo. Não é

 possível uma unificação do governo em torno desta agenda, ou seja ela provocará

 uma ruptura no árduo processo de negociações que Lula buscou para obter a

 governabilidade.

 7. O problema da participação indevida das forças armadas na vida nacional,

 necessita ser regulamentado, ou seja, deverá ser pautado em futuras conferências

 nacionais que levarão propostas para o congresso nacional. As participações

 individuais devem ser enquadradas nos artigos 359 M e L devem ser apurados

 dentro do devido processo legal: ”tentar depor, por meio violento ou grave ameaça

 governo legitimamente constituído, e “Tentar por meio de violência ou grave

 ameaça abolir o Estado Democrático e de Direitos”.

 8. A questão nacional tem relações claras com os interesses internacionais e isto

 configura dois modelos de desenvolvimento, sendo um hiperliberal do estado

 mínimo e outro um desenvolvimentismo com algumas variantes sendo uma dela a

 

 variante de esquerda que propugna um desenvolvimento com base em um

 processo de democracia participativa.

 9. A sociedade brasileira sempre lutou por reformas do estado, e este são os

 motivos dos golpes de 54, 64, e 2016, ou seja quando a sociedade estava em

 condições de implementar mudanças estruturais no estado houve intervenção

 militar.

 10. No episódio do golpe de 64 João Goulart evitou um confronto entre as forças

 aliadas e os setores militares golpistas, em nome da unidade nacional.

 11. Pelos dados empíricos que possuímos, as forças armadas com o Bolsonarismo

 recrudesceu o sentimento anti comunista, e a excitação golpista está em um grau

 muito alto entre os militares, e iniciativas expontaneistas de pequenos grupos de

 militares se insubordinando e se aventurando numa luta armada não podem ser

 descartadas.

 12. Este momento é inadequado para assumirmos uma pauta desta magnitude pois

 o debate não está maduro, as correlações de forças são extremamente

 desfavoráveis e existem riscos gravíssimos a governabilidade e ao futuro politico

 da esquerda do PT com serias repercussões sociais e politicas na vida nacional e

 internacional. Precisamos de maioria para desfazer muitas PECs (Projetos de

 emenda Constitucional) e recuperar muita base legal importantes para o estado

 nacional e esta é a tarefa prioritária para o interesse público.

 Este é um desafio árduo e complexo, que exigirá de nós uma atuação unitária

 fundamental para dar a linha e disputar a hegemonia nestas frentes de lutas.

 13. Não existem condições de se assumir esta pauta e mais uma vez Lula tem razão

 e devemos tratar de ajuda-lo na gestão da crise e não sermos nos os provocadores

 de uma crise desta magnitude, ou seja despressurizar o ambiente aerar tira a

 energia explosiva que está no ar e renovar as esperanças no sucesso do nosso

 governo.

* Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.