O caos da direita foi dominado. Falta controlar os ânimos da esquerda
A esquerda pode produzir a crise que a direita tentou e não conseguiu
Buscamos neste artigo conclamar a uma reflexão mais profunda os setores
das mídias progressistas, e membros ilustres do Partido dos Trabalhadores, que
estão defendendo uma tese altamente discutível e perigosa de que devido a vitória
eleitoral já temos força política suficientes para fazer um acerto de conta com alas
golpistas do Exército. Nosso objetivo é chamar a atenção para os graves riscos que
o nosso projeto de governo corre ao tentar dirigir os rumos do governo a partir de
uma avaliação totalmente equivocada como mostraremos abaixo e cuja adoção se
constituirá num grave risco a democracia do país.
Alguns jornalistas progressistas, alguns políticos importantes, que pregam
que o Lula tome medidas para enfrentar o militarismo e coloque a questão militar
no centro de sua complexa agenda. Outros estão inclusive levantando uma
hipótese incendiaria de instaurar uma CPI e outros querem a demissão do Ministro
do Exército. Surgem mobilizações no seio da esquerda que estão assumindo uma
grande importância política, fomentadas pelo prestígio político destes intelectuais.
O crescimento deste movimento na sequência poderá atingir a executiva
nacional do PT e contaminar as relações com os demais partidos, romper as frágeis
alianças e a unidade duramente conquistadas e ameaçando nosso governo e,
portanto, comprometendo nosso futuro.
Este movimento em última análise se constituirá numa situação paradoxal,
onde a esquerda produzirá a crise que a direita tentou e não conseguiu. Se seguir
crescendo o punitivismo de esquerda trará a crise para o centro do governo, e
ainda mais tirará o foco dos reais responsáveis. Os Bolsonaristas vão certamente
defender os militares e procurar criar crises ao longo do governo.
Vejamos em maiores detalhes estes pontos.
Na conjuntura surgida depois de 8 de janeiro os jornalistas e a sociedade
identificaram uma série de denúncias contra Militares Bolsonaristas que estariam
sendo coniventes com o golpe e um forte movimento de setores da esquerda nas
mídias alternativas pedindo a exoneração do Ministro da Defesa José Mucio, com
alguns argumentos tipo “ele não fez os movimentos necessários para retira os
golpistas da frete dos quarteis”, e “devemos aproveitar o prestigio político das
eleições para desbolsonarizar as forças armadas” e isto se constitui em
simplificações que devido a conjuntura explosiva se constituem em um grande
problema, e que parte me uma lógica simplista, reducionista e desinformada de
que algum problema iria se resolver, com a simples substituição de Ministro ou de
alguns generais, atribuindo uma gravidade indevida ao que podemos considerar
como uma estratégia política (equivocada talvez) para evitar um confronto com
estas corporações, que perdurou por uma semana e foi aceita pelo nosso governo e
pelo nosso presidente, e portanto não é de responsabilidade somente do ministro
ou do comandante do exército.
Fazer a demissão de José Mucio e colocar um quadro ‘linha dura’ no
Ministério da Defesa seria um erro com proporções catastróficas pois certamente
se produziria uma crise política, que assumiria grandes proporções na mídia e na
sociedade que reforçará a unidade popular da direita e poderá afetar ainda mais a
já frágil a unidade nacional, podendo se desdobrar em graves conflitos como
provocar insubordinações e até uma insurreição militar que reergueria as ‘ordas’
Bolsonaristas já conhecidas, sob um comando que poderia facilmente resultar em
uma luta armada que logo se tornará uma guerra civil ou seja estaremos
colaborando com a destruição da unidade nacional e cumprindo com os objetivos
estratégicos das forças imperialistas, e por isto são extremamente perigosas.
Trazer a pauta militar agora para o centro do governo significaria um
congelamento das pautas de interesse público. Este movimento unificaria a direita
em torno dos militares e nos levaria a derrota política fatalmente, pois é um tema
candente e que assumiria certamente o centro da agenda política e destruiria a
nossa frágil aliança de governo. Este movimento, portanto, pode ser caracterizado
como uma traição ao nosso programa (este tema não foi sequer citado) e ao
interesse público.
Afrontar os militares neste momento portanto caracterizaria é um ato
irresponsável e seria um foco de tensões permanentes. A doutrina militar cria uma
disciplina automática onde os indivíduos atuam dentro de uma cadeia de comando,
e segue o que for ordenado, e, portanto, existem concretas possibilidades de temos
uma “crise de comando’ uma insubordinação que significaria que estariam
prontamente respondendo a um comando Bolsonaristas, que reunificaria a direita
e seria o início de uma crise de resultados imprevisíveis;
Estamos vivendo uma conjuntura nacional e internacional extremamente
frágil e desfavorável e enfrentar o militarismo produzirá certamente uma crise,
que aglutinaria de novo a direita sem uma avaliação do terreno e sem considerar a
correlação de forças.
Ao impor esta agenda o Presidente LULA estaremos impondo um grande
ônus de assumir uma complicada agenda de interesse internacional para a qual
nem ele nem nós nem ninguém está preparado. Todos desejamos justiça e
lutaremos para punir os generais que participaram dos movimentos golpistas.
Porem isto deve ser feito dentro do devido processo legal. Só teremos condições de
fazer isto se consolidarmos nosso governo. E a sequência dos fatos nos mostra que
temos boas condições para isto.
Devemos evita o fogo amigo. A conjuntura já é um barril de pólvora. Temos
que tirar pressão deste cenário.
As manifestações golpistas foram enfrentadas com grande sucesso.
A violência do golpe e a rápida resposta de nosso governo, graças a
capacidade política de Lula Dino e do Ministro Presidente do STE e do conjunto do
governo recém instalado, conseguiu uma eficiente reação, com a intervenção no
governo do Distrito Federal e a rápida desocupação dos prédios públicos seguidos
do pedido de afastamento do governador do Distrito Federal Ibanes Rocha por 90
dias, prisões do Secretário de Segurança do DF e ex ministro de Bolsonaro
Anderson Torres, e pela prisão do Coronel comandante da PM do DF, e de mais de
1200 golpistas presos na Papuda e em centenas de processo que estão em
andamento.
Estas ações tiveram repercussão favorável e com uma grande demonstração
de unidade política na luta pela democracia e pela soberania nacional, expressa na
reunião histórica com os governadores, e também nas grandes mobilizações da
esquerda em onze de janeiro em todo o pais.
Um dos principais objetivos do vandalismo praticado em 8 de janeiro era
criar o caos e criar uma crise no governo que se inicia contando com uma GLO. A
intervenção civil rompeu com a esta tradição e as medidas andam no sentido de
retirar os militares como responsáveis para sanear problemas de segurança
publica.
A ampla maioria da sociedade brasileira repudiou o golpe. Estes eventos
mostrou um caráter violento e antidemocrático da mobilização e acabou isolando o
Bolsonarismo, e até mesmo estão ocorrendo divisões em suas bases. A grandes
mídias capitaneadas pela Rede GLOBO, fez uma ampla cobertura que fortaleceu o
sentimento democrático anti golpista. A FIESP a CNA, e outras representações do
mercado manifestaram publicamente seu repudio ao golpe e a queda do dólar é um
forte indicador disto.
Pela primeira vez em muitos anos a esquerda estará na ofensiva e a direita
em defensiva. A sequência das investigações que ocorrerão gradativamente trarão
com o tempo as informações com maior clareza e estes processos certamente
serão acompanhados pela sociedade brasileira e assim manterão a opinião pública
a nosso favor, e a favor da atuação do STE em sua clara disposição de aplicar os
artigos 359 do código penal, diminui e as mobilizações golpistas da direita nas
redes sociais.
Muitas pessoas com importantes participação no golpe, como formadores
de opinião e empresários que forneceram recursos já estão na cadeia e/ou estão
indiciadas em processos cujas punições precisam acontecer dentro do devido
processo legal, em um movimento que recoloca o poder das instituições.
Inegavelmente estes fatos caracterizam uma conjuntura amplamente favorável e a
prioridade agora é a implantação do nosso governo significará o reestabelecimento
da ordem democrática e a implantação de nosso programa onde se localiza o
interesse publico real, e ao mesmo tempo permitirá o fortalecimento das
instituições (PGR, Policia Federal, ABIN, GSI) e a continuidade dos processos legais,
que com o tempo chegará aos militares golpistas começando pelo General Heleno,
Braga Neto, Leônidas Pires e se estendendo a todos os demais pelos crimes
cometidos ou seja por ”tentar depor, por meio violento ou grave ameaça governo
legitimamente constituído, e “Tentar por meio de violência ou grave ameaça abolir
o Estado Democrático e de Direitos (art 359 e o artigo 359 L do Código Penal, e
estas ações já foram iniciadas por Alexander de Moraes.
A prioridade do governo agora não é fazer um enfrentamento com os
militares. Este enfrentamento deverá ser discutido com a sociedade e deverá
responder aos grandes temas das relações políticas de militares e setores
econômicos com a segurança nacional e com a segurança pública e em última
análise com a democracia e com a soberania nacional.
Devemos entender que a prioridade é iniciar o governo e que para tanto devemos
neste momento ter o mínimo de conflitos. Agora não é um bom momento para
promover este acerto de contas com a história. Os militares estão na defensiva
neste momento, e se soubermos conduzir o processo político eles poderão ser
controlados de maneira inteligente e eficaz não se constituirão em ameaças para o
governo
LULA agora estará cercado pelo staff do governo, e nos próximos momentos
estará com controle institucional do GSI e do SNI e com apoio de todos nós, ficará
fácil monitorar os militares deixando claro politicamente que a presença de
militares na política é ilegal e será punida. Devemos debate uma agenda nacional
positiva para as forças armadas e uma política de Segurança Nacional.
Em conclusão: não existem objetivos políticos concretos para LULA demitir
o Ministro da Defesa José Múcio, pois esta demissão traria um tema para o qual não
estamos preparados e que não é uma prioridade nacional como querem afirmar os
defensores desta proposta. Isto significaria uma aventura, posto que não temos
nenhum consenso sobre o que fazer com um tema desta envergadura que nem
sequer foi debatido em nosso programa. Não foi devidamente avaliado o preço
político de um enfrentamento do tema militar neste momento onde nem sequer
assumimos o governo onde não temos sequer o controle do GSI (Gabinete de
Segurança Institucional da Presidência da Republica) e nem da ABIN (Agencia
Brasileira de inteligência) pois isto não se faz de uma hora para outra e que não
temos dados para avaliar a correlação de forças e os riscos destes movimentos e
pauta-los sem saber o que queremos ou onde vamos chegar é uma temeridade e
uma irresponsabilidade.
A questão militar é extremamente complexa e o enfrentamento desta
agenda é de grande responsabilidade e é necessário uma ampla participação ampla
da sociedade e um tratamento técnico politico a altura destes desafios. Neste
sentido trago alguns pontos devem ser levados em conta neste debate:
1. A questão militar é importante e complexa e não se resolverá com mediadas
pontuais de exoneração de ministro ou punição de um ou outro general
2. A questão militar se refere dois temas centrais da vida nacional: a democracia e
a soberania nacional.
3. A importância e a complexidade destas relações inscreve o tema dentro dos
grandes debates e das grandes reformas, que em síntese se resume a regulamentar
as relações dos poderes econômico midiático e militar com o processo democrático
do pais e se referem às reformas politicas, reformas econômicas, reformas das
comunicações de massa, e por último na questão da defesa nacional e segurança
publica que tem em seu bojo a reforma militar.
4. As Forças Armadas são a instituição na qual o brasileiro mais confia, de acordo
uma pesquisa de opinião feita em 2014 pela Fundação Getulio Vargas[9] e pelo
Datafolha.
5. O tema da reforma militar extremamente polemico e divide a sociedade nacional
e é de tal forma apaixonante que substituirá as agendas prioritárias do interesse
publico.
6. Esta agenda destruirá a frente ampla construída por Lula e pelo governo. Não é
possível uma unificação do governo em torno desta agenda, ou seja ela provocará
uma ruptura no árduo processo de negociações que Lula buscou para obter a
governabilidade.
7. O problema da participação indevida das forças armadas na vida nacional,
necessita ser regulamentado, ou seja, deverá ser pautado em futuras conferências
nacionais que levarão propostas para o congresso nacional. As participações
individuais devem ser enquadradas nos artigos 359 M e L devem ser apurados
dentro do devido processo legal: ”tentar depor, por meio violento ou grave ameaça
governo legitimamente constituído, e “Tentar por meio de violência ou grave
ameaça abolir o Estado Democrático e de Direitos”.
8. A questão nacional tem relações claras com os interesses internacionais e isto
configura dois modelos de desenvolvimento, sendo um hiperliberal do estado
mínimo e outro um desenvolvimentismo com algumas variantes sendo uma dela a
variante de esquerda que propugna um desenvolvimento com base em um
processo de democracia participativa.
9. A sociedade brasileira sempre lutou por reformas do estado, e este são os
motivos dos golpes de 54, 64, e 2016, ou seja quando a sociedade estava em
condições de implementar mudanças estruturais no estado houve intervenção
militar.
10. No episódio do golpe de 64 João Goulart evitou um confronto entre as forças
aliadas e os setores militares golpistas, em nome da unidade nacional.
11. Pelos dados empíricos que possuímos, as forças armadas com o Bolsonarismo
recrudesceu o sentimento anti comunista, e a excitação golpista está em um grau
muito alto entre os militares, e iniciativas expontaneistas de pequenos grupos de
militares se insubordinando e se aventurando numa luta armada não podem ser
descartadas.
12. Este momento é inadequado para assumirmos uma pauta desta magnitude pois
o debate não está maduro, as correlações de forças são extremamente
desfavoráveis e existem riscos gravíssimos a governabilidade e ao futuro politico
da esquerda do PT com serias repercussões sociais e politicas na vida nacional e
internacional. Precisamos de maioria para desfazer muitas PECs (Projetos de
emenda Constitucional) e recuperar muita base legal importantes para o estado
nacional e esta é a tarefa prioritária para o interesse público.
Este é um desafio árduo e complexo, que exigirá de nós uma atuação unitária
fundamental para dar a linha e disputar a hegemonia nestas frentes de lutas.
13. Não existem condições de se assumir esta pauta e mais uma vez Lula tem razão
e devemos tratar de ajuda-lo na gestão da crise e não sermos nos os provocadores
de uma crise desta magnitude, ou seja despressurizar o ambiente aerar tira a
energia explosiva que está no ar e renovar as esperanças no sucesso do nosso
governo.
* Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.

