O Congresso Nacional está refém da oposição golpista
As forças políticas que têm compromisso com a democracia precisam se unir nesse momento
Nos últimos dias, os olhos do Brasil se voltaram para o Congresso Nacional e um sentimento de revolta tomou conta de corações e mentes, tendo em vista posturas indignas de parlamentares em cenas que desonram a representação e abalam a confiança de cidadãs e cidadãos que os elegeram. Mas, a revolta tem cara do Brasil se vendo no espelho. A representação parlamentar é um retrato 3 x 4 do Brasil.
O que deveria ser o mais importante palco de debate democrático dos projetos de interesse público, de expressão da pluralidade de ideias, se tornou a casa da balbúrdia, de defesa de interesses pessoais. O Congresso Nacional passa por uma das mais graves crises de representatividade de sua história. Para mudar a representação do parlamento é preciso despertar o espírito crítico da sociedade e isso se faz com amplo debate. Para isso, é necessário se libertar do cabresto digital, da bolha de manipulação, para enxergar a realidade e não sua versão dada por influenciadores.
O vão que se abriu entre representantes e representados tem crescido a cada legislatura. Cada vez menos, o povo deixa de se reconhecer naqueles que foram eleitos para os representar. Tomados por interesses que não dialogam com os desafios do país, buscam privilégios pessoais, se vinculam a setores antidemocráticos da sociedade e abandonam compromissos com a construção do futuro do País.
Esse crescente distanciamento se agrava diante de iniciativas que buscam institucionalizar privilégios de classe, como ficou evidente na proposta de emenda constitucional popularmente apelidada de "PEC da Blindagem". Ao tentar blindar políticos, presidentes de partidos e autoridades contra investigações e punições, o Congresso rompe com o princípio basilar da Constituição, de que todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza. Sob pretexto de garantir a imunidade parlamentar, essa Emenda Constitucional cria uma casta acima da cidadania, uma ilha de privilégio no meio da República.
A história parlamentar brasileira conheceu pessoas honradas que souberam fazer da tribuna um espaço de grandeza. Ulysses Guimarães conduziu a Constituinte e deu voz à esperança democrática. Florestan Fernandes, com sua densidade intelectual, transformou o Parlamento em espaço de reflexão crítica. Darcy Ribeiro levou à arena legislativa a paixão pelo Brasil mestiço e o sonho de uma pátria justa. Valdir Pires simbolizou a integridade ética. Maria da Conceição Tavares elevou o debate sobre o projeto de desenvolvimento econômico com toda sua paixão pelo Brasil. Mesmo figuras que se posicionavam ideologicamente no campo da direita como, por exemplo, Delfim Neto, Roberto Campos e Jarbas Passarinho, honraram seus mandatos com densidade de suas ideias no debate nacional como grandes tribunos. Hoje, raros são os que se aproximam dessa estatura.
Em vez de debates sobre o projeto de desenvolvimento sustentável, que reduz a desigualdade com investimentos na infraestrutura e em políticas públicas inclusivas; sobre como enfrentar as mudanças climáticas; a regulamentação da reforma tributária, para redistribuir renda e fortalecer a justiça social; isenção de Imposto de Renda para quem ganha até R$ 5 mil; o projeto Gás do Povo; fim da jornada 6 x 1; regulação do trabalho por aplicativo; enfim, o Congresso Nacional se apequena, se enreda em questões menores, onde a lógica do espetáculo, da lacração, para as mídias digitais, e da conveniência, se sobrepõe ao interesse público. Para esses parlamentares, a Câmara e o Senado são um cenário para as redes sociais.
O orçamento precisa voltar a ser uma peça legislativa aperfeiçoada pelo Congresso para o projeto de desenvolvimento do país. Não pode continuar a ser subordinado apenas a interesses pessoais e paroquiais. Precisa garantir os princípios determinados pela Constituição, de transparência, rastreabilidade e publicidade na gestão de recursos públicos. O ministro do Supremo Tribunal Federal, Flávio Dino está corretíssimo ao implodir o chamado “Orçamento Secreto” com a exigência do autor da emenda parlamentar e o destino. A manipulação clandestina de recursos públicos é um acinte à sociedade.
A revolta da população manifestada nas ruas, nas grandes manifestações do dia 21 de setembro, estampada em toda imprensa, nas redes sociais, e o isolamento do Congresso Nacional no cenário político, precisa ser observada com muita atenção pelas mesas da Câmara e do Senado. Essa revolta irá desaguar nas urnas, numa ampla renovação política. Não se trata apenas de alternância de nomes, mas de uma escolha consciente por representantes mais comprometidos com a democracia, com a justiça social, com a sustentabilidade ambiental e a soberania nacional. Gente disposta a pensar o país para as próximas gerações, e não apenas para a próxima eleição.
O Brasil merece um Parlamento à altura do desejo dos nossos desafios, capaz de recuperar a confiança popular e resgatar a dignidade no exercício da política. No período que antecede as eleições, o debate sobre a representação parlamentar deve despertar mais interesse na população e se intensificar, em razão da crise de confiança que se estabeleceu. A escolha dos representantes tende a ser mais apurada. Lembrando que os poderes da República são independentes e harmônicos entre si e que não admitem castas privilegiadas.
O Brasil demonstra ao mundo que suas instituições republicanas são sólidas o suficiente para defender o Estado Democrático de Direito, nossa soberania, e que não vai permitir que extremistas de direita sequestre o Congresso Nacional para subordiná-lo aos seus desígnios e a interesses internacionais.
As forças políticas que têm compromisso com a democracia precisam se unir nesse momento para trazer o Congresso de volta ao seu lugar na construção da nação brasileira. Às cidadãs e aos cidadãos que se indignaram e participaram das manifestações do dia 21 de setembro, fica a lição: redobre a atenção sobre as votações dos seus representantes no parlamento e participe, para que possamos garantir as mudanças que estão acontecendo no País, desde a derrota da tentativa de golpe de Estado, à reafirmação da democracia, a defesa do projeto de desenvolvimento sustentável com justiça social e ambiental, a erradicação da fome, da pobreza extrema, e a redução da desigualdade.
* Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.




