CONTINUA APÓS O ANÚNCIO
Cesar Locatelli avatar

Cesar Locatelli

Economista e mestre em economia.

52 artigos

blog

"O desafio do Brasil não é fácil, mas temos por onde começar"

O olhar de Tânia Bacelar (UFPE) sobre saídas para o atoleiro em que nos encontramos

Tânia Bacelar (Foto: Marcos Oliveira/Agência Senado)
CONTINUA APÓS O ANÚNCIO

✅ Receba as notícias do Brasil 247 e da TV 247 no canal do Brasil 247 e na comunidade 247 no WhatsApp.

Sim, o Brasil tem jeito! Revela, logo no início do seminário, a professora Tânia Bacelar. A herança que recebemos do século XX foi “uma potência com pés de barro”. Já fomos a oitava economia industrial do mundo. Saímos da condição de país rural primário exportador para um país urbano industrial. “No século XXI, nós tentamos consertar aquilo que não fizemos no século XX: mudamos a forma de dinamizar a economia, mas continuamos a ser um país muito desigual.” Nossa capacidade de também realizar mudanças no campo social foi evidenciada nesse século, mas é preciso muito mais, completa ela.

Não se pode, no entanto, menosprezar os obstáculos. Ela destaca “a dificuldade do Brasil de distribuir ativos estratégicos como terra e como conhecimento”. Essas travas têm sido fortalecidas, mais recentemente, pela hegemonia da mentalidade rentista que nos “garroteia” desde os anos 1990: engatamos numa dinâmica especulativa e não produtiva. Ela confessa esperança, por ter visto, recentemente, “uma luzinha no fim do túnel, quando o novo presidente da Fiesp, filho de José de Alencar, propôs uma nova política de industrialização para o Brasil”.

CONTINUA APÓS O ANÚNCIO

Um curto prazo “impregnado de emergências”

Quatro propostas para o curto prazo “impregnado de emergências” foram apresentadas por ela no seminário “Um projeto de desenvolvimento para o Brasil”.

CONTINUA APÓS O ANÚNCIO

A primeira relaciona-se ao “inaceitável” retorno do país ao mapa da fome da ONU: “Como é que um país que é uma potência exportadora de alimentos convive com a fome de milhões de brasileiros? Para mim esse é o primeiro problema emergencial que já fomos capazes de atenuar. Não eliminamos, mas tiramos o Brasil do mapa da fome.” Pelo lado da oferta, ela aponta incentivos e tecnologia para a agricultura familiar “produzir alimentos para acabar com a fome” e cita as cooperativas do MST na produção de arroz orgânico como exemplo. 

Há, entretanto, a necessidade de também se equacionar o lado da demanda. A população carece de renda para consumir. O país já conta com uma estrutura que facilita atingir esse objetivo. “Eu sou de uma geração em que a assistência social era coisa de primeira dama. A constituição de 1988 criou a LOAS, à imagem do SUS, e o sistema de assistência social brasileiro é muito bem estruturado. Ele está sendo desmontado, mas tem um germe muito positivo”. Temos de onde partir.

CONTINUA APÓS O ANÚNCIO

“A segunda intervenção que eu faria é na área de saúde… Nós temos estruturas consolidadas muito boas. O SUS provou isso na pandemia.” Nesse âmbito, conjugam-se uma ação social emergencial e uma proposta econômica de maior prazo. O complexo industrial da saúde pode se tornar “o coração da retomada da economia brasileira”. Ela cita o diretor da Fiocruz, Carlos Gadelha, que tem chamado a atenção do país para a necessidade de se encarar a saúde como um complexo industrial (e terciário, ela complementa) com enorme potencial para romper a dependência que temos de importados, por exemplo fármacos, ao mesmo tempo em que damos um enorme impulso que a economia carece já há tempos.

Antes de entrar na terceira proposta, Tânia Bacelar ressalta que tanto a agricultura familiar quando a saúde são áreas que demandam investimento em ciência e tecnologia, além de empregarem muitas pessoas. “Além da fome, o nível de desemprego e subemprego também é inaceitável, Já tivemos padrões muito melhores, há muito pouco tempo”.

CONTINUA APÓS O ANÚNCIO

Para evitar uma nova exclusão social, sua terceira proposta refere-se a digitalização da sociedade: “Não podemos permitir que a exclusão digital avance. Sentimos na pandemia, quem não pôde ter aula porque não tinha um computador, porque não tinha internet… O Brasil tem sim capacidade de investir nessa área e combinar o investimento em infraestrutura econômica, em atividades ligadas à nova era digital com o acesso da grande maioria da população brasileira ao mundo digital.”

A quarta proposta está ligada à questão ambiental. Já contamos com uma matriz energética com grande participação de energia limpa. Aqui também, lembra a professora, há a necessidade de, via investimentos em ciência e inovação, atrelar as estratégias de curto prazo com aquelas de longo prazo.

CONTINUA APÓS O ANÚNCIO

Ela imagina que durante a execução dessas propostas será necessário repensar o Brasil, numa ampla gama de discussões semelhante a um processo constituinte. “Depois das eleições vamos ter a oportunidade de construir um debate sobre o futuro do Brasil. E um grande desafio aí é quebrar a mesmice da mídia corporativa… porque um grande desafio é a comunicação para fazer esse debate. Como é que discutimos com o povão quando temos uma mídia que só conta uma história, não permite a divergência, não promove o debate? Na área de economia, que é onde eu labuto, só se escuta os mesmos. Não tem discussão. A gente precisa quebrar isso.”

A herança de submissão dos tempos coloniais

CONTINUA APÓS O ANÚNCIO

“Como um país deixa de refinar petróleo para importar dos outros?” A indignação vivida pela professora Tânia Bacelar por descasos como este aos nossos interesses, levaram-na a concluir que há brasileiros que desistiram do Brasil. Como os que vivem dos rendimentos sobre o capital financeiro acumulado, os rentistas, que não dependem do país ir bem ou mal. Complementa ela: 

“Paulo Guedes tem compromisso com o Brasil? Ele tem compromisso com as aplicações dele no exterior. Ele não consegue nem entender o Brasil. Esse tipo de elite nós não vamos trazer [para o debate]. Eles já desistiram do Brasil… Uma parte dos empresários, eu diria, são mais oportunistas do que empresários. Eu conheço empresários verdadeiros que tem compromisso com o Brasil. Aquele dono da Havan representa a elite empresarial brasileira?”

Mas, uma parte da elite, acredita ela, ainda conserva o interesse em crescer e contribuir para o desenvolvimento do país. O debate precisa contar com eles, com os jovens, com os estudantes e a com população pobre. “Nossa força tem que ser buscada, especialmente, naqueles que não podem desistir do Brasil”, acrescenta.

A dificuldade reside em como trazer para o debate aqueles que não sentem a presença do Estado. “Não consigo avaliar até que ponto o ataque ao Estado conquistou corações e mentes. Como o Estado não chega a grande parte do povão, eles não vão defender o que não conhecem. E sem um Estado forte e reorganizado, nós não sairemos do atoleiro em que estamos. Nosso desafio não é fácil, mas temos por onde começar.”

Serviço

 - Seminário: “Um projeto de desenvolvimento para o Brasil” (disponível no canal da Coordenadoria do Futuro no YouTube)

- Promovido pela Coordenadoria Futuro, ligada ao Centro de Estudos Avançados da Universidade Federal de Pernambuco, e a Academia Pernambucana de Ciência

- Palestrante: Tânia Bacelar - Doutora em Ciências Econômicas pela Universidade de Paris I/Panthéon-Sorbonne, a professora Bacelar foi Diretora de Planejamento Regional da SUDENE, Diretora de Economia da Fundaj, Secretária de Planejamento e Secretária da Fazenda do Estado de Pernambuco, Secretária de Políticas de Desenvolvimento Regional do Ministério da Integração Nacional, e Secretária de Planejamento da Prefeitura do Recife. Atualmente, a professora integra o corpo docente dos cursos de graduação e mestrado em Geografia, Ciência Política, e Desenvolvimento Urbano e Regional, da Universidade Federal de Pernambuco.

iBest: 247 é o melhor canal de política do Brasil no voto popular

Assine o 247, apoie por Pix, inscreva-se na TV 247, no canal Cortes 247 e assista:

Carregando os comentários...
CONTINUA APÓS O ANÚNCIO

Cortes 247

CONTINUA APÓS O ANÚNCIO
CONTINUA APÓS O ANÚNCIO