O deus do fascismo cristão já está entre nós

Que tipo de afinidade pode ter um homem que se intitula um defensor da ordem, da moral e dos bons costumes, com outro homem que pede a senha do cartão de crédito dos seus seguidores e usa o nome de Deus para enriquecer a custa da fé das pessoas? Em condições normais não haveria afinidade entre essas duas pessoas, mas quando estamos falando de política tudo é possível. E quando ela se mistura com a religião, nem se fala. Observamos se formar alianças escatológicas, de fazer qualquer profeta mensageiro do apocalipse ficar de boca aberta. Eu acho que nem São João seria capaz de prever o surgimento de tantas bestas juntas. Mas ele avisou para que ficássemos atentos.

O Partido Social Cristão, que tem o fingido, digo, ungido Pastor Marco Feliciano como uma de suas mais fortes representações e cujo líder é o santificado Pastor Everaldo, aquele que, segundo as más línguas, teria soltado um pum diante de William Bonner durante uma entrevista com os presidenciáveis no jornal nacional, acaba de anunciar uma contratação bombástica para o seu elenco. Trata-se do Deputado e "showman" do Super Pop da Rede TV, Jair Messias Bolsonaro, que chega ao partido como pré-candidato à presidência em 2018. Foi uma festa! Um delírio! Nem a contratação de Neymar pelo Barcelona rendeu os gritos de: "Mito", emitidos pelo público presente na apresentação do novo craque da política social cristã. Ops! Eu disse social cristã? Com Jair Bolsonaro no partido?

Como eu já havia dito no começo do texto, as afinidades e as alianças na política, por vezes, beiram a escatologia bíblica. Já vimos Sarney, Collor e Lula se abraçando e trocando gentilezas. Os mesmos que no passado eram inimigos quase que mortais. Chego a pensar que a política consegue fazer o que a religião não consegue. Unir as pessoas em um só pensamento e fazê-las perdoar os seus inimigos 70 x 7 vezes, desde que essa conta se converta em cifras e seja transferida para o saldo bancário dos perdoadores e dos perdoados. Eu fico imaginado como seria uma chapa formada por Jair Bolsonaro e Marco Feliciano como vice. Glória Pires diria: "Não sou capaz de opinar", mas eu e todos aqueles que não querem ver o retrocesso emergir do esgoto do esquecimento feito uma besta apocalíptica que procura a quem devorar, precisamos opinar. M elhor, devemos responder a isso nas urnas.

Todo esse lobby em torno da candidatura de Jair Bolsonaro a presidência, tende a se intensificar. Na visão e na mente de alguns, o nobre deputado surge como um deus que trará a salvação eterna para o país. Não podemos negar que o seu discurso contundente e combativo, seduz a primeira audição. E ele se aproveita muito bem do momento desastroso que atravessa a moral política do Brasil, para lançar o seu dardo envenenado e quase letal. Também não posso negar que algumas opiniões dele são de fato sensatas, como por exemplo, a sua luta contra a propagação da ideologia de gênero nas escolas de ensino fundamental e contra a legalização das drogas. Concordo com ele. Mas isso é apenas uma opinião pessoal dele, e também minha. Não nos credencia a sermos candidatos a presidente do Brasil por isso. É muito pouco. O que mais ele tem a oferecer?

Bolsonaro já se posicionou contra as cotas e contra os programas de inclusão social, criados pelo governo do PT. Segundo ele, o bolsa-família só serve para sustentar vagabundos e as cotas para negros e pobres são um atentado a meritocracia. Quem pensa dessa forma acredita que todos têm as mesmas condições de chegarem juntos e em igualdade ao mesmo ponto, ainda que um largue bem na frente do outro na corrida. Isso é negar que exista injustiça social no país. Isso é negar que o período de escravidão deixou um legado de inferioridade para os descendentes dos escravizados. Isso é fascismo estúpido e institucionalizado. O mesmo deputado em entrevista à apresentadora Luciana Gimenez soltou a seguinte pérola: "Existem mulheres que até são competentes". Depois dessa, podemos imaginar qual seria o papel da mulher num possível governo do ilustre deputado. Se você, mulher que lê esse artigo, sabe servir cafezinho e pilotar o fogão com competência, sorria! Não faltará emprego para você.

Em outra entrevista, agora ao CQC da Bandeirantes, o futuro presidenciável disse que: "Esse papo de igualdade é coisa de comunista". Opinião interessante para quem se filia a um partido social cristão e se alia a homens de Deus como Pastor Everaldo e Marco Feliciano, que são representantes do evangelho de Jesus Cristo na terra. Ou pelo menos deveriam ser, já que Cristo sempre condenou a opressão aos menos favorecidos e pregou a igualdade entre todos. Talvez por isso tenha sido crucificado pelos poderosos e meritocratas, os quais o acusavam de blasfemo e agitador, uma espécie de socialista na sociedade tucano-judaica da época. Bolsonaro não representa os interesses do povo, ele representa o retorno do domínio ditatorial da elite fascista, inconformada por ter perdido espaço. E olha que o espaço ocupado pelo povo nem foi tão significativo como de veria e ainda pode ser.

O sanhaço pela prisão do ex-presidente Lula se dá justamente pelo fato de sua possível candidatura em 2018. Possibilidade essa que assusta a direita e tira o sono do candidato derrotado nas últimas eleições, já que ele nutre uma eterna esperança de um dia se tornar presidente do Brasil e devolver a seus pares o controle do gado desgarrado, que depois que teve acesso a outros pastos e provou de uma grama mais verde e mais saborosa do que a que lhe era tradicionalmente servida, não está mais disposto a voltar ao pasto de origem. Temos sim que lutar para que toda corrupção seja investigada e punida com o devido rigor e não importa quem a tenha praticado. Se for comprovada a culpa, que seja aplicada a pena cabível. O que não pode haver é uma escolha seletiva de políticos a serem punidos ou ainda uma espécie de represál ia a quem ousou a fazer algo em favor do proletariado, desagradando assim à classe dominante.

Confiar a um militar, ávido por poder e glória e que já demonstrou em algumas de suas opiniões e em muitas de suas atitudes, que é autoritário, machista e ditador, a esperança de um país melhor, mais igual e mais justo, é no mínimo falta de bom senso ou uma demonstração de ódio extremo ao governo atual. Ódio esse que cega e não permite enxergar que um novo chicote se aproxima disfarçado de laço de fita e só depois que ele começar a estalar nos lombos, principalmente dos menos favorecidos, causando mais choro e ranger de dentes, se dará conta de que a poesia recitada com tanto ardor pelo suposto salvador da pátria, não passava de versos fascistas bordados por eufemismos democratas agradáveis aos ouvidos dos mais desatentos.

Essa tríade, Bolsonaro, Everaldo e Feliciano, pode até soar como a escalação imponente de um ataque arrasador de um time de futebol, que dará muitas alegrias a sua torcida e aterrorizará os seus adversários. Uma espécie de Messi, Suárez e Neymar do P.S.C. Apenas não nos esqueçamos de que o Brasil não pertence a uma só torcida, ou pelo menos não deveria pertencer, e que o adversário a ser abatido pode ser você, desde que não concorde em torcer pelo time do momento. Voltando ao livro do apocalipse, ele nos revela entre outras palavras, que uma besta seria curada de uma ferida de morte, seria adorada por todos e conduzida ao seu reinado como um verdadeiro deus. Fazendo uma analogia não literal com a situação política atual, diria que a "besta", é o Capitão pré-candidato, que rena sceria após uma morte já atestada (Ditadura Militar) e que equivocadamente ressurge com força e encanta o povo com seu discurso e aparências invioláveis e incorruptíveis.

O deus do fascismo cristão já está entre nós. A sorte é que pelo menos esse apocalipse pode ser evitado.

Amém?