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Marcelo Uchoa

Advogado e professor de Direito

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O dia em que o governo americano drogou seu povo

O documentário “Freeway Crack in The System”, de Marc Levin, disponível na Netflix, ajuda nesta reflexão sobre a questão das drogas. O filme aborda a geopolítica das drogas através dos relatos de Freeway Rick Ross, lendário traficante das décadas de 80 e 90, que, antes de cumprir 20 anos de prisão em regime fechado, dominou o controle da distribuição de cocaína e crack em quase todos os EUA, a partir das comunidades afro-americanas dos arredores de Los Angeles

drogas, crack, tráfico (Foto: Marcelo Uchoa)
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Assim como em partida de futebol, todos creem possuir opiniões infalíveis sobre o tema das drogas. Sem titubear, indicam-se vilões e mocinhos num jogo complexo que mata crescentemente, a cada ano, centenas de milhares de pessoas no mundo. Contudo, criminalizar ou descriminalizar o uso de substâncias; liberar e regulamentar produção, comércio e consumo; lidar com o fenômeno como questão de segurança, saúde ou relegando-o à esfera da individualidade, reconhecido o caráter cultural-recreativo, religioso, medicinal, de certas drogas, são conjecturas que somente serão adequadamente realizadas, se bem compreendidas as circunstâncias que levam ao trânsito quase desimpedido dessas substâncias no meio. O documentário “Freeway Crack in The System”, de Marc Levin, disponível na Netflix, ajuda nesta reflexão.

O filme aborda a geopolítica das drogas através dos relatos de Freeway Rick Ross, lendário traficante das décadas de 80 e 90, que, antes de cumprir 20 anos de prisão em regime fechado, dominou o controle da distribuição de cocaína e crack em quase todos os EUA, a partir das comunidades afro-americanas dos arredores de Los Angeles.

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O documentário reúne ex-traficantes, antigos integrantes da DEA (sessão antidroga do Departamento de Justiça estadunidense), parlamentares dos EUA que endossaram, mas hoje condenam, o endurecimento das leis de drogas, somando, ainda, contribuições do jornalista investigativo Gary Webb, vencedor do Prêmio Pulitzer de 1990, “suicidado” na esteira das denúncias ora reavivadas, sobre as relações clandestinas do governo Ronald Reagan com xiitas iranianos, milícias anti-sandinistas e traficantes latino-americanos, no escândalo que ficou conhecido como Irã-Contras. Em síntese, a trama consistia em articulação engendrada em finais da guerra fria para impedir o avanço iraquiano no oriente médio e revoluções socialistas na América Central. Via Israel, às escondidas dos órgãos internacionais de segurança e do congresso dos EUA, armas norte-americanas eram levadas ao golfo pérsico e vultosos financiamentos retornavam de lá direcionados a organizações contrarrevolucionárias. Aportes expressivos também eram efetivados por cartéis colombianos de cocaína, que recebiam, em troca, permissão do governo dos EUA para desovar ali a produção.

Paralelamente à crítica às relações promíscuas do governo estadunidense com o narcotráfico, o documentário expõe as incoerências da já comprovadamente fracassada “política de guerra às drogas”. Revela como são estabelecidas as ligações entre consumidores e distribuidores primários e poderosas facções armadas, questionando sobre os efeitos práticos da tática institucional de combater o terror com mais terror. Condena a criminalização e o encarceramento em massa da população negra, chamando a atenção para o gravíssimo problema da estigmatização de um público que, no momento inicial do drama, era compreendido como injustiçado histórico, carente de direitos civis, em pleno processo tendencial de empoderamento político, e que, doravante, passou a ser generalizadamente identificado como de periculosidade social. No fim, a certeza de que elaborar conceitos sobre drogas a partir de premissas equivocadas, ignorando interesses geopolíticos, cifras bilionárias e disputas de poder, reduzindo a dimensão do problema ao crivo médio cotidiano, é o que o “status quo” mais quer para continuar soberano sobre o comércio e o aproveitamento econômico da adjacente rede de violência.

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