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Marcelo Auler

Marcelo Auler, 68 anos, é repórter desde janeiro de 1974 tendo atuado, no Rio, São Paulo e Brasília, em quase todos os principais jornais do país, assim como revistas e na imprensa alternativa.

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O juiz e o herói

Quem disse que a nossa Justiça é cega?... (Foto: Fabio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil)
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Por Marcelo Auler, em seu blog e para o Jornalilstas pela Democracia 

Com a devida autorização do autor, o juiz João Batista Damasceno, o Blog reproduz seu artigo publicado originalmente na edição deste sábado (06/07) em O Dia. Faz isso na certeza que o texto abaixo ajuda no debate que hoje precisa ser feito sobre o papel do Judiciário e de seus operadores. Em especial aqueles que estão sendo alçados à condição de heróis, muitas vezes incensados por uma mídia que nem sempre checa suas informações como deveria. Tal como está sendo demonstrado agora pelo belíssimo trabalho do The Intercept, ao reproduzir os diálogos de procuradores e juízes da Operação Lava Jato.

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Damasceno traz ao debate o papel de juízes, inclusive com a novidade que está sendo criada no Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro da criação de uma Vara especializada em combate ao crime organizado na qual implantarão a figura do ‘juiz sem rosto’. Tal iniciativa, como explicado em reportagem da revista eletrônica Consultor Jurídico – Conjur– Presidente do TJ-RJ quer varas especializadas em organizações criminosas – visa proteger magistrados dos fóruns de bairros onde funcionam milícias, em especial na zona oeste do Rio, constantemente ameaçados pelas facções criminosas em atuam em tais regiões.

Como define a reportagem da Conjur, “a vara – composta por um juiz titular e dois substitutos indicados pelo presidente do TJ-RJ, que serão trocados a cada 60 dias – seguirá o modelo dos “juízes sem rosto”, instituído pela Lei 12.694/2012. As decisões interlocutórias, como ordens de prisão provisória, serão assinadas pelos três julgadores. A ideia é tirar o foco dos juízes e evitar que um deles vire alvo de organizações criminosas. A sentença será sempre assinada pelo titular da vara”.

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Damasceno, no artigo abaixo, diz que “o tribunal arbitrariamente escolheu a vara que será transformada em ‘vara do juiz sem rosto’. Trata-se de um magistrado oriundo da carreira militar, tal como o ex-juiz que prometeu ‘mirar na cabecinha’.” Refere-se, por óbvio, ao governador do Rio, o ex-juiz federal Wilson Witzel, com sua política de exterminar supostos marginais, que acaba atingindo inocentes em regiões carentes.

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O juiz e o herói

Juízes não são deuses ou demônios. São serem humanos iguais aos demais e sujeitos aos mesmos erros, se não estiverem republicanamente sob controle

João Batista Damasceno (*)

A mídia e a sociedade têm incensado egos e propiciado que juízes saiam dos seus papeis institucionais e assumido protagonismos incompatíveis com as funções institucionais lhes acometidas. Mas todo poder é relacional e os magistrados não assumiriam tais papéis se não encontrassem nas relações que estabelecem apoio para o que fazem. Daí é que também são responsáveis os que os apoiam ou incentivam.

Após a 2ª Guerra Mundial fortes movimentos nacionais de libertação tomaram conta dos países colonizados. As potências europeias já não mais chamavam suas colônias por este nome. Passaram a dizer que eram territórios nacionais distantes. Portugal chamava Angola de território português d´além mar. A França fazia o mesmo com Guiana Francesa e com a Argélia. As guerras de libertação nacional fizeram os franceses formular o conceito de inimigo interno e alocação de suas Forças Armadas para combate aos argelinos.

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Os Estados Unidos se apropriaram do conceito de inimigo interno e o exportaram para a América Latina, onde as Forças Armadas nacionais passaram a combater o próprio povo em proveito daquele país, instituindo as ditaduras militares no Cone Sul. A repressão aos movimentos nacionalistas propiciou a politização das Forças Armadas, mas também a judicialização da repressão política. Policiais truculentos tratados como “heróis da polícia”, homens de ouro, cerraram fileiras ao lado dos “gorilas” que reprimiam o povo. Os magistrados não ficaram fora do processo e também surgiram “juízes heróis”. E continuam a surgir.

O conceito de policial herói, truculento mas incorruptível, pressupõe um agente que pode abrir mão das regras pré-estabelecidas na luta do bem contra o mal, não estando subordinado ao Estado de Direito. Isto porque os heróis estão acima da lei.

A mesma lógica orientou o ministro Joaquim Barbosa e depois o então juiz Sérgio Moro, elevados à categoria de heróis. Um era o Batman e o outro Super-Homem e na atuação de ambos se pode apontar ilegalidades. A ideia do juiz herói decorre da corruptela do policial herói. Assim como o policial herói se coloca à margem da lei, e – neste sentido – se transforma num marginal, o juiz herói assume igual papel.

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Juízes não são deuses ou demônios. São serem humanos iguais aos demais e sujeitos aos mesmos erros, se não estiverem republicanamente sob controle.

O Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro acaba de criar a figura do ‘juiz sem rosto’ para ‘combater’ o crime organizado. Juízes combatentes ou justiceiros deixam de ser equidistantes e perdem a capacidade de julgar imparcialmente. O tribunal arbitrariamente escolheu a vara que será transformada em ‘vara do juiz sem rosto’. Trata-se de um magistrado oriundo da carreira militar, tal como o ex-juiz que prometeu “mirar na cabecinha”. Não faltará quem alegue, e com razão, que se trata de juízo de exceção em afronta à Constituição da República. Restará aos tribunais invalidar tal construção estranha ao Estado Democrático de Direito.

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(*) João Batista Damasceno é doutor em Ciência Política, juiz de direito do TJ/RJ e professor na Faculdade de Direito da UERJ.

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