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Ronaldo Lima Lins

Escritor e professor emérito da Faculdade de Letras da UFRJ

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O lobby da (falta de) vergonha

No momento atual, quis o destino que o Executivo invista num projeto e o Parlamento, com forte presença da direita, resista a trabalhar com ele

Câ,ara dos Deputados, congresso Nacional (Foto: agência Brasil)

Um país que logre entrar num sistema democrático, egresso do escravismo e da organização colonial, traz inevitavelmente consigo pesadas distorções. São anomalias que, como na China, uma revolução ajuda a corrigir, estimulando a sociedade a enveredar numa nova versão, bem mais leve, de suas capacidades. Não havendo tais convulsões (sempre dolorosas), não há como reajustar os desequilíbrios a não ser através de uma política inteligente e sólida no pagamento dos impostos. Heranças do passado comportam, no caso, distorções pelas quais os que possuem muito se acham isentos, enquanto os que não possuem carregam o peso do Estado. Governos progressistas buscam fazer com que a balança retorne ao seu lugar de prumo, nem demais porá um lado, nem demais para outro. 

No momento atual, quis o destino que o Executivo invista num projeto e o Parlamento, com forte presença da direita, resista a trabalhar com ele. Lutas titânicas (e mesmo desesperadas) se travam, com resultados frequentemente negativos do ponto de vista dos vulneráveis, já que, em votação, não se aprovam projetos valiosos. A vitória de Lula em sua postulação para a Presidência da República não se fez acompanhar, como não ignoramos, de uma segunda vitória no Congresso. Este, com maioria do Centro e da extrema direita, ora se mostra dócil, ora arredio, através de decisões decepcionantes ou simplesmente hostis. Todos os governos, sem dúvida, enfrentam, oposição. E é bom que enfrentem. No entanto, o que hoje se assiste soma um conjunto de iniciativas que fazem corar os mais empedernidos observadores voltados para os mais arrojados desvios de condução política.

Para não falar na Pec da Blindagem e no aumento do número de deputados (já exagerado) com despesas extravagantes, alvos de repúdio expresso nas ruas em manifestações ruidosas, há mais exemplos da “falta de” vergonha. Suas excelências se recusaram a taxar as bets, os banco e os bilionários, os três bs exorbitantes da nossa desigualdade. Cabe ressaltar que os trabalhadores pagam 27% de impostos e os ricos, com seu lobby atuante, acima destacado, se recusam a arcar com 12%. Não resta dúvida que se trata de uma comparação inusitada. Defendendo seus pontos de vista, o deputado Sóstenes Cavalcante acusa a administração pública por exagerar na cobrança de tributos, uma ironia, uma vez que professores, policiais, enfermeiras etc. dobram a espinha carregando o peso do Estado. Falta de inteligência não é o que caracteriza o dito líder do PL. Talvez, falta de pudor...

Em instantes anteriores, esses cabos de guerra entre situação e oposição encontraram caminhos mais sensatos. Nem sempre, como é de se imaginar, a briga pela propriedade dos debates resvalou em clara e franca disposição antipopular, como tem sido o caso. Às vezes, prevalece o frio e nítido fio da razão, orientando atitudes e forçando situações. Recentemente, tem inexistido até a vontade de acertar, como se nas disputas restasse apenas o ódio e a vontade de atacar. Contudo, há o rumor das ruas. Elas parecem desatentas, mas continuam de plantão, prontas para, novamente, dizer não. E as eleições do ano que vem se aproximam. Será o momento de afrontá-las? 

* Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.

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