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Carlos Lula

Ex-presidente do Conass (Conselho Nacional de Secretários de Saúde)

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O Maranhão e suas tarefas inadiáveis

Entre potencial desperdiçado, crise ética e estagnação econômica, o Maranhão precisa romper velhos padrões para construir um futuro mais justo e democrático

Parque Nacional dos Lençóis Maranhenses (Foto: Julius Dadalti)

Alguns estados carregam contradições que dizem menos sobre seu povo e mais sobre a forma como foram administrados ao longo das décadas. O Maranhão é um desses casos.

Reúne posição geográfica estratégica, patrimônio ambiental singular, imenso potencial turístico e uma das populações mais jovens do país. Mesmo assim, permanece entre as últimas posições do ranking de renda per capita do IBGE, alternando entre o penúltimo e o último lugar.

Essa distância entre potencial e realidade mostra que o estado convive com desafios conhecidos, mas ainda não enfrentados com a profundidade necessária.

O primeiro deles é recuperar a ética na política, condição sem a qual nenhum projeto de desenvolvimento se sustenta. Por muito tempo, o Maranhão foi marcado por escândalos, desvios e disputas internas que confundiram governo e interesses privados.

Corrupção não é uma abstração moral. Ela cobra preço alto em serviços públicos que deixam de existir, estradas que não se concluem e oportunidades que desaparecem. Infelizmente, o Maranhão saiu das páginas da política e retornou para a editoria de polícia.

Os últimos anos, contudo, mostraram como o estado pode avançar quando adota padrões institucionais mais sólidos. Entre 2015 e 2022, a extrema pobreza caiu mais de 40% e a educação básica revelou sinais concretos de melhora.

Eram resultados consistentes, capazes de iniciar um ciclo de responsabilidade pública. No entanto, esse ciclo vem sendo atravessado por sinais de retrocesso, com práticas patrimoniais voltando a ganhar espaço em áreas sensíveis da administração.

Sem ética e transparência, o Maranhão continua preso a um tipo de gestão que corrói confiança e bloqueia qualquer agenda séria de transformação social.

Ao mesmo tempo, o estado precisa enfrentar com realismo a estagnação de sua economia. O número de empregos formais caiu de 818 mil, em 2021, para 685 mil em 2025.

É perda expressiva para um estado que dispõe de um dos maiores portos do país, vasto território agricultável, energia renovável abundante e atrações turísticas únicas.

Enquanto isso, a dependência de programas sociais cresce de maneira preocupante. Em janeiro de 2021, cerca de 960 mil famílias estavam inscritas no Bolsa Família. Em 2025, são 1,15 milhão.

O programa é essencial e deve ser protegido, mas ele não substitui uma estratégia de desenvolvimento que gere autonomia, renda e oportunidades para a juventude que já representa a maioria da população.

O Maranhão precisa de uma economia que se mova, que industrialize parte de sua produção, que atraia investimentos e que converta suas vantagens naturais em prosperidade para quem vive aqui.

Essas duas frentes — ética pública e desenvolvimento econômico — esbarram em uma terceira tarefa inadiável: o fim das oligarquias e a modernização da cultura política.

O problema não está na presença de famílias na política, algo comum em democracias, mas na lógica que naturaliza o poder como herança. Quando a alternância real diminui e as decisões passam a circular em espaços cada vez mais fechados, o estado perde vitalidade democrática.

O resultado é um governo menos transparente, mais vulnerável à captura privada e distante da sociedade. Como lembrava Robert Dahl, a pluralidade só existe onde há alternativas verdadeiras, não apenas formais.

O Maranhão nunca consolidará um projeto de desenvolvimento enquanto persistir a ideia de que o futuro pode ser decidido por poucos, em arranjos previsíveis e resistentes à fiscalização social.

O estado já mostrou que é capaz de avançar quando combina responsabilidade pública, políticas sociais bem estruturadas e instituições que funcionam. Mas agora precisa ir além.

Precisa reconstruir a ética na política como fundamento, recuperar sua capacidade econômica como motor e modernizar sua cultura política como garantia de democracia viva. Sem enfrentar essas três tarefas, continuará oscilando entre o desejo de mudança e a repetição de um passado que sempre limitou seu horizonte.

O Maranhão pode mais do que tem entregado. Pode ser protagonista no Nordeste, referência ambiental, potência turística e polo de oportunidades para sua juventude. Mas nada disso virá por inércia.

Depende de uma decisão coletiva de abandonar práticas que nos atrasam e sustentar, com firmeza, uma nova visão de futuro: um futuro em que o Estado seja patrimônio público, a economia gere prosperidade e a política deixe de ser um círculo fechado para se tornar espaço aberto de debate, alternância e responsabilidade. O Maranhão só será o que pode ser quando ousar romper com o que sempre foi.

* Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.