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Euler Costa

Professor e doutor em Políticas Públicas e Formação Humana na UERJ

13 artigos

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O mi-mi-mi dos militares

Sigam então o conselho de vosso comandante em chefe e, resolvam seus problemas, que não são poucos. Problemas éticos, de conduta, de caráter, de corrupção, de moral, transparência e etc. E, de uma vez por todas, deixem de ser um peso morto, que o povo desse país é obrigado a carregar há mais de 200 anos

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Não é de hoje que sabemos muito bem que, uma boa parte dos militares das Forças Armadas não se contenta mais a sua função de vigilantes e protetores do país e da soberania territorial. Não sei se eles acham pouco, ter que proteger uma país, com quase 17 mil quilômetros de fronteiras e um dos maiores litorais do mundo. 

Fora isso, há um sem número de coisas que os militares poderiam se ocupar como, por exemplo, proteger a Amazônia brasileira dos constantes ataques de grileiros, garimpeiros e madeireiros. Poderiam também ajudar a proteger os indígenas (nosso maior patrimônio), povos originários e os verdadeiros donos da terra Brasilis. Também poderiam ajudar com a logística e apoio para levar alimento aos milhões de brasileiros que hoje vivem em insegurança alimentar, aproximadamente 110 milhões, segundo relatório Luz 2021. Ainda poderiam também atuar na construção de casas populares para os milhões de famílias em situação de rua desde o fim do programa MCMV. 

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Além de ajudarem a sociedade de forma real e positiva, melhoraria a imagem das FFAA junto à população e, de quebra, fariam jus aos bilhões em folha de pagamento e pensões que custam ao povo brasileiro anualmente.

Contudo, ao invés disso, preferem se ocupar com coisas mais interessantes como pintar meio fio, capinar e cortar a grama dos quartéis, manter os caminhões e jeps limpos, lustrar seus coturnos e passar caol (produto antigo que dá brilho em metais) na fivela do sinto para ficar bem brilhante. Ah sim, ainda tem as corridas matinais para manter a boa forma da tropa. Afinal o leite condensado tem que ter um destino, não é mesmo? Realmente são coisas muito mais importantes para a atividade militar. E não podemos nos esquecer dos exercícios de simulação de combate e manutenção da lei e da ordem, já que o Brasil está sempre em risco eminente de ataque. Temos muitos inimigos, como os EUA, sabem como é, né? 

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Bom, mais deixemos de lado as questões secundárias e vamos ao que interessa. Depois do último golpe militar (o de 1964, sim, porque houve outros antes, como a própria “proclamação da República”, por exemplo, que foi um golpe covarde e traiçoeiro em Don Pedro II) e os 21 anos de ditadura, com a redemocratização, os militares pareciam ter adotado uma postura mais discreta, guardados em seus quartéis, cuidavam de seus assuntos em seu “mundo paralelo”. 

Claro que isso não significava que eles haviam desistido de manter as rédeas do comando do país, mas digamos que eles aceitaram afrouxar os “arreios” e deixaram os civis tomarem as decisões, desde que eles não tivessem perdas financeiras e seu “status” de instituição incorruptível fosse mantido. Para isso aprovaram a lei de anistia de 1979, garantindo que nenhum dos seus, seria condenado pelos crimes contra os direitos humanos. Todos os anos de mortes, torturas e desaparecimentos estariam anistiados para sempre. E assim o é até hoje, bem diferente da nossa vizinha Argentina e do outro vizinho, o Uruguai. Porém, com a instalação da Comissão da Verdade em 2011, início do 1º mandato de Dilma Rousseff, fez com que os militares olhassem para o governo e o PT como uma verdadeira ameaça.

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Ocorre que a tutela sempre existiu, mas de forma sutil. Porém uma turma linha dura da velha guarda se mantinha lá, e fazendo escola. Uns dos expoentes da escola linha dura eram o general Augusto Heleno e seu contemporâneo, o general Eduardo Vilas Boas, aquele que se notabilizou, quando a frente do comando do Exército, ameaçou o STF por um tuíte, quando do julgamento do habeas corpus do ex- presidente Luís Inácio Lula da Silva.

Os militares voltaram ao cenário político após o golpe midiático jurídico parlamentar de 2016 contra a então presidenta Dilma Rousseff. O empossado presidente Michel Temer logo se adiantou e pôs vários militares no primeiro e segundo escalão do seu governo. Temer quebrou uma tradição criada por FHC e seguida pó Lula e Dilma e nomeou um militar para o ministério da defesa. Este ministério vinha sendo comandado por civis, com o intuito de demonstrar que as FFAA estavam subordinadas às intuições democráticas. Era esse o simbolismo, mas Temer que vivia se agarrando a “cabelos no mar” devido a sua baixíssima popularidade, pensou em garantir seu mandato até o fim.Vale lembrar que Temer é cria da ditadura militar, começou sua carreira advogando para vários militares. Foi procurador geral do governo de Franco Montoro, 1º governador de São Paulo eleito por voto direto em 1982. Assim como Brizola, Montoro era um democrata, mas Temer tinha seus caminhos e sua boa relação com os militares ajudava Montoro, por tanto, ele tinha transito livre entre eles.

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Temer trouxe de volta os militares para posições estratégicas e sensíveis do governo como: ABIN (Agencia Brasileira de Inteligência), chefia do gabinete da Casa Civil, FUNAI, recriou e deu a um general o GSI ( Gabinete de Segurança Institucional – uma espécie de “pode tudo”) e por último devolveu o ministério da Defesa a um militar, o general Joaquin Luna e Silva, que substituiu o civil Raul Jumgmann. Temer ainda alterou uma lei que deu aos militares a prerrogativa de julgar os crimes comuns (como homicídio) praticados pelos seus integrantes, apenas na justiça militar. Ele ainda realizou várias operações de GLO (garantia da lei e da ordem) e colocou o estado do Rio de Janeiro sobre intervenção militar durante 11 meses, cujo interventor na época é justamente o atual ministro da Defesa de Bolsonaro (e que antes foi ministro da Casa Civil), o general Walter Braga Netto. Inclusive foi durante sua gestão à frente ao estado do Rio de Janeiro, que a vereadora, Marielle Franco e, seu motorista, Anderson, foram executados, num dos crimes que mais abalaram o país e o mundo, e que, mais de três anos depois, continua sem resposta.

Porém, o que pretendo demonstrar é a total incoerência dos chefes das FFAA, quando emitiram uma nota totalmente desproporcional, após uma manifestação, em minha opinião, muito branda, e até certo ponto cuidadosa, do presidente da CPI da Covid-19, o senador Omar Aziz, do AM – PSD, quando resumidamente, disse que as Forças Armadas deveriam estar com vergonha de ter tantos militares de alta patente, envolvidos no caso da compra de vacina superfaturada da Índia – COVAXIN, além do caso onde o cabo da PM de Minas Gerais, Dominguette – que alega ter recebido uma proposta de propina, no valor de US$ 1,00 por dose na compra de vacinas da empresa DAVATI, o que daria algo em torno de dois bilhões  de reais em propina.

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A incoerência está na postura adotada pelos chefes das FFAA em vários acontecimentos e escândalos escabrosos, que ocorreram ao longo dos últimos três anos e, em todos eles, o silêncio foi a resposta dada. A seguir vou apresentar, cronologicamente, os principais fatos, colocando a manchete, a fonte e a data da publicação:

1. Corrupção nos quartéis, Ministério Público detecta desvios de R$ 191 milhões nas Forças Armadas - Portal UOL – 25/10/17. 

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2. Para especialistas, intervenção federal no Rio deixa saldo negativo – Correio Braziliense – 28/12/18.

3. Militares do Exército fuzilam carro de família com 80 tiros no Rio – O caso do músico Evaldo em Guadalupe – EXAME – 08/04/19.

4. Militar brasileiro preso com 39 quilos de cocaína na Espanha recebe pena de seis anos – portal G1 – 24/02/20.

5. Exclusivo: A desastrosa Operação do Exército que levou à morte de Evaldo Rosa – Pública – 29/04/20.

6. 73 mil militares receberam o auxílio emergencial indevidamente, diz Defesa – CongressoemFoco – 12/05/20.

7. Bolsonaro formaliza general Pazuello como ministro interino da Saúde – Pder360 – 02/06/20.

8. Ministério da Defesa justifica leite condensado "para dar energia aos militares" – Governo gastou 15 milhões em leite condensado – Correio do Povo – 21/01/21.

9. Além de picanha e cerveja, verba pública pagou bacalhau e uísque para militares – Ao longo do ano de 2020 as Forças Armadas compraram 700 toneladas de picanha e 80 mil litros de cerveja – CongressoemFoco -  13/02/21.

10. TCU deixa Pazuello nu ao analisar exigências para compra de vacinas - General rejeitou oferta da Pfizer alegando entreves contratuais: 'Ninguém precisa ser expert em direito para saber que valor saúde vem primeiro’, disse TCU – Veja – 18/03/21.

11.  Ex-ministro Pazuello participa de ato ao lado de Bolsonaro sem máscara – Depois de poupar presidente na CPI, Ex-Ministro da Saúde participa de ato político no Rio – CNN – 23/05/21.

12. Governo Bolsonaro baixou artificialmente rombo futuro da previdência militar, diz TCU – Folha de São Paulo – 15/06/21.

13.  Filhas solteiras de militares recebem até R$ 117 mil mensais - País gastou R$ 19,3 bilhões com pensões militares ao longo de 2020. Filhas representam 60% dos beneficiários – Portal Terra – 03/07/21.

14.  Quem é quem nos 4 núcleos do suposto esquema de corrupção na compra de vacinas – Núcleo militar – Elcio Franco (Coronel); Marcelo Blanco (Tenente - coronel); Coronel Guerra; Alex Lial Marinho (Tenente – coronel) – Gazeta do Povo – 06/07/21.

Bom, após essa lista de fatos ocorridos em pouco mais de três anos, e, diga-se de passagem, após o golpe de 2016, podemos observar que, a aventura dos militares, fora do seu “mundo paralelo” (os quartéis), deu luminosidade a muitas coisas que, provavelmente, jamais saberíamos, mas este é o preço que se paga quando se quer mais poder e, desvia-se de suas funções elementares. 

Todavia, o mais importante de tudo! Em nenhum dos casos citados acima, os chefes das Forças Armadas se pronunciaram de alguma forma. Pelo contrário, no caso do general da ativa, ex-ministro da Saúde, Pazuello, que participou de ato político - cometendo flagrante violação contra o Regulamento disciplinar do Exército, infringindo o artigo 57, que se aplica ao caso do general: “Manifestar-se, publicamente, o militar da ativa, sem que esteja autorizado, a respeito de assuntos de natureza político-partidária” – nada aconteceu.

Qual foi a atitude tomada pelo comandante da do Exercito? Absolveu Pazoello e fez mais, decretou sigilo de 100 anos, isso mesmo, 100 anos de sigilo no processo de transgressão do ex-ministro. Ora, que moral tem uma força que age assim frente a uma flagrante afronta ao seu comando? É obvio que Bolsonaro usou Pazoello como um aríete para derrubar a barreira que impedia aos militares de tomarem partido, ou terem opinião partidária. Risco muito bem calculado.

É interessante, pois um governo que sempre defendeu, de forma completamente equivocada e tosca, um movimento ideológico chamado de “Escola sem partido”, acaba por criar o precedente para termos as “Forças Armadas com partido”! Seria cômico, se não fosse trágico. 

Não que a história dos militares brasileiros seja cheia de glorias e glamorosa, não! Está muito longe disso, senão vejamos um breve resumo histórico: Guerra do Paraguai (1864 – 1870), um dos mais tristes massacres de um povo, um país que florescia como potencia industrial na América do Sul e, por isso, os EUA exigiram que o Brasil ajudasse na sua destruição. Até hoje o Paraguai sofre as conseqüências desta guerra covarde; Guerra de Canudos (1896 – 1897), mas também poderia se chamar Massacre de Canudos, onde pobres camponeses foram massacrados, pois as idéias socialistas de um líder estava chamando a atenção.

Mas, pensando bem, Temer e agora Bolsonaro podem ter feito um grande favor ao país. Ao colocar os militares de forma sistemática e maciça em suas gestões, deram ao povo, a oportunidade de ver com mais clareza e luz o que ficava nas sobras. 

A final de contas, durante os 21 anos de ditadura militar, nunca se ousou falar em corrupção, até por que não existia investigação. Porém, esta semana o Datafolha apresentou vários resultados de sua ultima pesquisa. E dois resultados, em particular, chamaram muito a atenção. Para 62% dos entrevistados, militares da ativa não devem participar de atos políticos ou se envolver com política. O outro resultado é ainda melhor: para 58% dos entrevistados os militares não devem ter cargos em governos. Ou seja, podemos agradecer a Bolsonaro, por mostrar ao povo quem brasileiro, quem realmente são os militares, desconstruindo o mito de incorruptíveis e imaculados. Principalmente os de alta patente!

Para concluir, digo então ao ministro da Defesa, Walter Braga Netto, e aos seus três mosqueteiros, parafraseando seu presidente: “Chega de frescura e de mi-mi-mi, vão ficar chorando até quando? Temos que enfrentar os problemas!”

Sigam então o conselho de vosso comandante em chefe e, resolvam seus problemas, que não são poucos. Problemas éticos, de conduta, de caráter, de corrupção, de moral, transparência e etc. E, de uma vez por todas, deixem de ser um peso morto, que o povo desse país é obrigado a carregar há mais de 200 anos. 

Saiam da posição parasitária que se encontram, confortavelmente e, façam jus aos seus gordos soldos e, seus vários privilégios trabalhistas e previdenciários. E se mesmo assim, não souberem como ajudar o país a crescer e voltar aos trilhos da democracia e do desenvolvimento, pelo menos não atrapalhem! Voltem para seus quartéis, meio fios, caminhões, coturnos e fivelas brilhantes, de onde nunca deveriam ter saído.

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