O narcisismo maligno de Hugo Motta
Motta é um homúnculo político e usou da força policial interna para desalojar de sua cadeira um impertinente Braga
Pouco importa se Jair Bolsonaro amargará quinze, nove ou cinco anos atrás das grades. O marginal que tentou, sem disfarçar, destruir a democracia brasileira resta defenestrado da política junto com a dúzia de descerebrados militares que o circundaram. A tal “dosimetria” que a Câmara aprovou, e que ainda circulará pelas vias legislativas por um curto tempo antes de ir a sanção ou vetos de Lula, é mesmo vergonhosa, mas servirá na prática como um “cala-boca” aos bolsonaristas empedernidos. C’est fini para a turba, que por ora terá de abraçar a candidatura natimorta de Flávio.
O Judiciário cumpriu seu papel quanto aos golpistas. Aplicou-se o direito com celeridade e os criminosos foram todos condenados. O Brasil deu um exemplo ao mundo de funcionamento institucional diante de uma ameaça urdida no gabinete do presidente da República. O resíduo tóxico dessa jornada, contudo, sobrevive latente no Parlamento.
São bem conhecidos o corporativismo, o fisiologismo e o oportunismo do Congresso Nacional, mas na presente legislatura tais “ismos” elevaram-se ao absurdo. O que se viu na Câmara na terça-feira (9) constitui a perfeita demonstração da incapacidade do presidente Hugo Motta (Republicanos-PB) de encarar o contraditório – este, representado pelo deputado Glauber Braga (PSol-RJ) – com altivez.
Motta é um homúnculo político e usou da força policial interna para desalojar de sua cadeira um impertinente Braga, ao passo que meses atrás manteve-se dócil por 48 horas enquanto bolsonaristas ensandecidos faziam festa sobre as poltronas da mesa diretora da Câmara, sobre a dele inclusive. Desta vez, também a imprensa foi retirada do recinto “aos costumes”.
Na sequência, após um discurso protocolar de defesa institucional – ninguém diria nada diferente daquilo –, o homúnculo Motta deu andamento a uma pauta anódina para em seguida por em votação a “dosimetria”. Como a coluna fez meses atrás, a análise mais pertinente dos comportamentos do presidente da Câmara não pode prescindir da psicologia.
Hugo Motta é médico, apesar de nunca ter exercido a medicina sob tantos holofotes quanto os que lhe dão brilho no comando do corpo parlamentar mais fisiológico e reacionário de que se tem notícia. Na política, o afilhado de Arthur Lira (Progressistas-PB) vende a imagem do liberal sempre aberto do diálogo, educado, bem penteado. Um perigo.
O psiquiatra Jerrold M. Post realizou estudos importantes sobre indivíduos obscuros alçados ao poder – já escrevemos sobre isso neste espaço, e vale o reprise. Post fundou o Centro de Análise de Personalidade Política da CIA. É autor de obras como “Dangerous Charisma: The Political Psychology of Donald Trump and His Followers” (2019) e “Leaders and Their Followers in a Dangerous World” (2004). Em sua avaliação, indivíduos que ascendem ao poder a partir da obscuridade e se tornam tiranos geralmente compartilham de um “narcisismo maligno”, distúrbio severo que beira a paranoia.
O narcisista de Post, contrariado, humilha e se vinga. Sua patologia denomina-se Síndrome do Conciliador Cativo, que costuma caracterizar moderados que, para sobreviverem politicamente, se submetem à lógica autoritária de seus aliados.
Um exemplo acabado de conciliador cativo, além de Motta, é o ex-presidente da Câmara dos Representantes dos Estados Unidos Kevin McCarthy, que se apresentava como moderado e “homem do diálogo” dentro do Partido Republicano, tendo sido eleito com promessas de governabilidade bipartidária.
Por oportuno, reprisemos a seguir parágrafo de artigo aqui publicado recentemente:
No exercício da presidência da casa legislativa, McCarthy fez repetidas concessões à extrema-direita trumpista para se manter no cargo, incluindo abertura de processo de impeachment sem provas concretas contra o presidente Joe Biden. McCarthy também permitiu que parlamentares extremistas ditassem a pauta e usassem o Congresso como palco de desinformação. Acabou destituído por seu próprio partido ao perder o controle de sua ala mais radical.
* Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.




