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Ronaldo Lima Lins

Escritor e professor emérito da Faculdade de Letras da UFRJ

203 artigos

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O pária e o "gripezinha"

Em nosso modelo de democracia, nos habituamos a substituir pessoas íntegras e toleramos incapazes e irresponsáveis. Por sorte há brechas no sistema. Num surto de lucidez, a ideia de transformar o 03 em Embaixador em Washington DC não vingou. Deve ser por que Deus é brasileiro

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Um país que se pretende digno, no concerto entre as nações, não desconhece que as palavras regem os fatos, ainda mais do que os fatos as palavras. Sem elas, não se tira conclusões e não se encaminham direções de governo. É uma razão entre outras pela qual a história, para preservar-se, se faz por escrito. Os franceses, por exemplo, conheceram a sua Revolução pelos escritos de Jules Michelet. Por isso, o Itamaraty sempre mostrou cuidado ao redigir notas e relatórios. Afinal, mais de uma vez, erros de dicção, para não falar de interpretação, estiveram na raiz de conflitos armados e até de invasões. Diplomatas conhecem o valor das palavras sobretudo quando escritas – e hoje, multiplicadas pela imprensa, atingem lugares remotos, além da linha do equador e do nosso hemisfério. 

Chega a surpreender, diante da incontinência verbal da atual administração, que um dia alguém imaginou designar o sr. Eduardo Bolsonaro, o 03, membro da Comissão de Relações Exteriores da Câmara, para o cargo de Embaixador do Brasil nos Estados Unidos. A sutiliza de “patas de elefante” que o notabiliza, dá a impressão de afastá-lo de quaisquer funções que exijam contenção e educação. Mesmo na Comissão que integra, não se encaixa como uma luva nos requisitos dos modelos estabelecidos. Estabanado e ansioso por demonstrar que serve aos seus ideais de capitalismo, não hesitou em atacar a China por causa do 5G à beira de entrar em licitações para o nosso sistema de teles. Não parou para pensar que o governo de Pequim constitui o nosso principal parceiro comercial e que, se reduzir suas compras em 10%, ficaremos em palpos de aranha. A embaixada da China, é claro, reagiu. Afinal, os ataques não vinham de qualquer um. Eram do filho do Presidente e membro da Comissão de Relações Exteriores. Por isso, não procedem os fricotes do ministro Ernesto Araújo, novamente orgulhoso de ser pária, em nota de protesto frente à polêmica. Numa orquestra, quando um desafina, os outros vão atrás... Ao final, a sinfonia inteira fracassa. 

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Mas não sejamos exigentes. O 03 tem a quem puxar. O pai é useiro e vezeiro em tropeçar nas palavras. Já lhe aconteceu em diversas ocasiões. Numa delas, quase provocou uma crise institucional imaginando levar aos limites do golpe seu relacionamento com o Supremo Tribunal Federal. E o pior: pensa que possa desdizer o dito em sucessivos desmentidos na hora ou muito mais tarde. É o caso da sua “gripezinha”, a maneira como se referiu à epidemia do Convid 19, minimizando a gravidade da doença e se imaginando imune a ela. Ele mesmo, em certo instante, infectou-se com o vírus que, por seu turno, onde passa, enche os hospitais e deixa um rastro mortos. Escapou vivo, segundo assegura, em função de seu físico atlético. Pena que a disposição demonstrada pelo corpo não corresponda à mente em proporções idênticas para lhe assegurar uma boa performance à testa do governo. 

Num rápido exame - ou noutro, mais minucioso -, verifica-se que, no plano das estratégias verbais nos revelamos abaixo de crítica. Por alguma razão (voltamos aos problemas de um país digno), dirigentes não despreparados são impedidos de continuar. Em nosso modelo de democracia, nos habituamos a substituir pessoas íntegras e toleramos incapazes e irresponsáveis. Por sorte há brechas no sistema. Num surto de lucidez, a ideia de transformar o 03 em Embaixador em Washington DC não vingou. Deve ser por que Deus é brasileiro. 

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