O povo expulso da "Casa do Povo"
A cena de brutalidade evocou os piores momentos do autoritarismo brasileiro
Chocante, é o mínimo que se pode dizer, na “Casa do Povo”, a expulsão de um manifestante carregado por quatro homens para fora do edifício. Ele havia se exposto a respeito de um tema palpitante, entre outros, naquele Parlamento. Parecera malvisto numa reunião de evangélicos, como um corpo estranho. Em recinto destinado a eleitos, qualquer indivíduo com certeza se revelaria hostil e suspeito. Sejam quais forem os argumentos contra ele, no entanto, a cena de brutalidade, através dos corredores, evocou os piores momentos do autoritarismo brasileiro. Quem ordenou a medida? Sem dúvida, alguém com bastante poder para tanto, indiferente a repercussões negativas, como se estivesse acima da Lei. Terá sido uma nova orientação interna, emanada de um dirigente recém empossado e dado a extravagâncias verbais, para mencionar o mínimo?
Enquanto o carregavam corredor afora, os agentes da segurança escutavam os gritos de dor, associados à indignação do cidadão, para quem algo de semelhante, antes, parecia impossível. O restante da população, graças ao noticiário transmitido de pronto, também custava a crer nos próprios olhos. Estaríamos realmente assistindo à estupidez se passando na capital da República, em Brasília, justo no local de debates e argumentos políticos? Imaginava-se que se inventara o recinto com vistas a melhorar o país. Ou involuíramos, de cenas espúrias para cenas espúrias, com participantes eméritos na direita, como se quisessem descer a escada da dignidade até o derradeiro degrau?
O camarada arrastado por adversários mais corpulentos não gritou no vazio. Não encontrou, talvez, a reação escandalizada que se esperava junto à opinião geral.
À margem do acontecimento, mostrou-se inacreditável, igualmente, a ausência de parlamentares que interferissem para impedir que se chegasse tão longe. É uma região que se enche de gente, de todas as cores e orientações partidárias na hora do dia... Além de jornalistas e fotógrafos, contudo, aparentemente, não havia testemunhas de maior relevo com moral humanitária para chamar o grupo à razão.
É possível que em pouco tempo, como costuma ocorrer naquela casa, premida pela intensidade dos acertos e desacertos, poucos se recordem do exemplo de ignorância que ali teve lugar. Na crônica dos costumes da instituição, a não ser que haja censura (o que como sinal das aberrações do momento, não soa impossível), não troquem o feito pelo não feito. Os registros cinematográficos não mentem. Quem o desejar poderá consultá-los.
De qualquer modo, causa espécie que na hora ninguém se animou pelo menos a conduzir os questionamentos ao Hugo Motta, o Presidente que começou sua gestão afirmando que “ainda estava ali”. Fica a nosso encargo, no meio do silêncio, a dúvida. Nações que aspiram à grandeza cuidam de seus princípios de cidadania. Então, onde estão os nossos?
* Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.

