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Pepe Escobar

Pepe Escobar é jornalista e correspondente de várias publicações internacionais

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O que acontece na Rússia depois do Dia Mais Longo?

"Após a 'rebelião' Wagner, a excitação da OTAN com a possibilidade de a Rússia descambar para o caos logo se converteu no mais total desapontamento", diz Pepe

Presidente da Rússia, Vladimir Putin (Foto: Sputnik/Gavriil Grigorov)
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O primeiro esboço dos extraordinários acontecimentos que tiveram lugar na Rússia no Dia Mais Longo – sábado, 24 de junho – nos leva a um vespeiro novo em folha.

A Maioria Global quer muito saber o que vem em seguida. Examinemos as principais peças desse tabuleiro de xadrez.

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O Chanceler Sergei Lavrov vai direto ao ponto: ele fez lembrar a todos que o modus operandi do Hegêmona é apoiar tentativas de golpe sempre que isso seja de seu interesse. O que se encaixa com o fato de que o FSB vem investigando exaustivamente se e como a inteligência ocidental estaria envolvida no Dia Mais Longo.

O Presidente Putin não poderia ter sido mais inequívoco:

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"Eles [o Ocidente e a Ucrânia] queriam que os soldados russos matassem uns aos outros e que soldados e civis viessem a morrer para que, ao final, a Rússia perdesse, nossa sociedade se fragmentasse e sufocasse em uma guerra civil sangrenta (…) Eles esfregavam as mãos, sonhando em se vingar de seus fracassos no front e durante a chamada contraofensiva, mas seus cálculos estavam errados".

Entre em cena o Coletivo Ocidental – do Secretário de Estado Anthony Blinken para baixo – tentando freneticamente se distanciar do ocorrido, apesar de a CIA ter deixado vazar, através de seu clássico porta-voz, o Washington Post, que eles sabiam da "rebelião".

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A agenda era dolorosamente óbvia: a derrota de Kiev em todas as frentes seria ritualmente escamoteada por uma ampla cobertura da "guerra civil" fake que estaria ocorrendo na Rússia.

Não há revólver fumegante – ainda. Mas o FSB vem seguindo diversas pistas para demonstrar que a "rebelião" foi montada pela CIA/OTAN. O espetacular fracasso torna a próxima cúpula da OTAN, a ter lugar em 11 de julho, em Vilnius, ainda mais incandescente.

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Os chineses, tal como Lavrov, também foram direto ao ponto: o Global Times assegurou que a ideia de que a "revolta Wagner enfraqueceria a autoridade de Putin é uma fantasia irrealista do Ocidente", e que "a forte capacidade de dissuasão mostrada pelo Kremlin" aumentou ainda mais sua autoridade. É essa a versão que circula nas ruas russas.

Os chineses chegaram a essa conclusão após a importante visita do Chanceler-Adjunto Andrei Rudenko, que imediatamente voou para Pequim no domingo, 25 de junho. É assim que a blindadíssima parceria estratégica funciona na prática.

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"A rebelião" como jogada de relações públicas - É possível afirmar que a melhor explicação, até agora, dos aspectos práticos do Dia Mais Longo Day foi dada por Rostislav Ischenko.

A Maioria Global exultará em saber que o teatro armado por Prigozhin, no final das contas, deixou o Coletivo Ocidental atordoado, confuso e arrasado: não era para essa coisa toda ter desencadeado um caos total na sociedade e no exército russos?

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Mesmo no decorrer do rapidíssimo "motim" fake, a Rússia continuou a massacrar as forças de Kiev – que, por sinal, espalharam a narrativa de que a fase principal da "contraofensiva" seria lançada exatamente na noite de 24 de junho. Como era de se esperar, esse foi apenas mais um blefe.

Voltando às ruas russas. A "rebelião" – embutida em uma complicadíssima trama – no final das contas, foi interpretada por muitos como sendo nada além de mais uma exibição de força (do mestre de cerimônia Prigozhin, não da maioria esmagadora dos soldados do Wagner). A "rebelião" acabou sendo uma jogada de relações públicas ocidental, uma série de imagens (bem desbotadas) para consumo global.

Mas agora é fatal que as coisas se tornem muito mais sérias.

Lavrov, mais uma vez, apontou o papel desempenhado pelo sempre bravateiro Le Petit Roi, Emmanuel Macron, aliado dos Estados Unidos: "Macron, claramente, viu no desenrolar dos acontecimentos uma oportunidade de concretizar a ameaça de a Ucrânia vir a desferir um golpe estratégico contra a Rússia, mantra ao qual os líderes da OTAN vêm se aferrando".

Portanto, da mesma maneira que Kiev e a mídia do Coletivo Ocidental, acrescentou Lavrov, Macron permanece sendo parte de uma única "máquina" que trabalha contra Moscou. Nisso, Lavrov concorda com Putin, que afirmou, sobre a intervenção feita por Macron no domingo, que "a totalidade da máquina militar, econômica e de informação do Ocidente foi posta em marcha contra nós".

E isso é fato.

Apostando em um "bloqueio econômico de longo prazo" - Um outro fato agrava as nuvens mais agourentas que assomam no horizonte.

Enquanto ninguém prestava atenção, um minicongresso de representantes da área de segurança nacional teve lugar em Copenhagen, exatamente nos dias fatais de 24 e 25 de junho.

É possível que eles estivessem discutindo a "paz na Ucrânia". O presidente era ninguém menos que Jake Sullivan, Consultor de Segurança Nacional dos Estados Unidos.

Presentes ao encontro estavam Brasil, Alemanha, Reino Unido, França, Itália, Dinamarca, Índia, Canadá, Arábia Saudita, Turquia, África do Sul, Japão, Ucrânia – e o proverbial eurocrata da não-soberana União Europeia.

Notem que a maioria dos países pertencia ao G7, lado a lado com três membros dos BRICS e dois aspirantes à admissão no BRICS+.

"Paz na Ucrânia", nesse contexto, significa o chamado "plano de paz de 10 pontos de Zelensky", que implica uma total derrota estratégica para a Rússia – incluindo a restauração das fronteiras ucranianas de 1991 e o pagamento de colossais "indenizações" por parte de Moscou.

Não é de surpreender que a China não tenha participado. Mas três países dos BRICS – podemos chamá-los de os elos mais frágeis – estavam presentes. Os BRICS e os membros em potencial dos BRICS+ representam os seis "estados-pêndulo" que serão implacavelmente cortejados e/ou submetidos a Guerras Híbridas barra-pesada pelo Hegêmona para que eles se "comportem bem" no que diz respeito à Ucrânia: Brasil, Índia, África do Sul, Turquia, Arábia Saudita e Indonésia.

Há também o 11º pacote de sanções da União Europeia, que exacerba enormemente a guerra econômica contra a Rússia, como atestado por Kirill Logvinov, Representante Permanente em Exercício junto à União Europeia.

Logvinov explicou que "Bruxelas pretendia arrastar o máximo de países para essa guerra (…) Há uma nítida mudança, de uma blitzkrieg fracassada, que dizia-se ter como propósito causar danos irreparáveis à Rússia, para um jogo de múltiplos lances com o objetivo de estabelecer uma espécie de bloqueio econômico de longo prazo contra nosso país".

Isso é puro território de Guerra Híbrida – e os principais alvos são os seis "estados-pêndulo".

Logvinov observou que "a União Europeia sempre prefere usar de chantagem e coerção. Uma vez que a União Europeia continua sendo o principal parceiro econômico de muitos países, bem como fonte de investimentos e de doações financeiras, Bruxelas, obviamente, tem suficiente poder de influência para exercer pressão. Desse modo, espera-se que a luta da União Europeia contra a recusa a aplicar sanções seja longa e intransigente".

Bem-vindos, portanto, às sanções extraterritoriais, ao estilo União Europeia, que cria listas negras de empresas de outros países "suspeitos" de reexportar mercadorias proibidas para a Rússia, ou de praticar comércio de petróleo sem levar em conta o chamado preço máximo do petróleo russo.

Diversão ao sol de Belarus - Em meio a tantas emoções baratas, qual será o próximo papel do protagonista do Dia Mais Longo (e mesmo de momentos anteriores)? E isso tem importância?

Os acadêmicos chineses gostam de nos fazer lembrar que os períodos turbulentos da China – por exemplo, os dias finais das dinastias Han e Tang – sempre tiveram como causa os chefes guerreiros se recusarem a obedecer as ordens do Imperador.

Os janissários do Império Otomano – o Wagner daqueles tempos – tinham como tarefa proteger o sultão e lutar suas guerras. Eles acabaram tendo o poder de decidir quem poderia ser sultão – tanto quanto os legionários do Império Romano acabaram decidindo quem seria Imperador.

Os conselhos chineses são sempre prescientes: cuidado com a forma de usar seus soldados. Assegurem-se de que eles acreditam naquilo pelo qual lutam. Caso contrário, eles se voltarão contra você e o atacarão.

O que nos leva a Prigozhin mais uma vez mudando sua versão (ele é especialista no assunto).

Ele agora diz que junho 23-24 foi apenas uma "exibição de força" para expressar seu descontentamento. O principal objetivo era provar a superioridade do Wagner sobre o Exército Russo.

Bem, todos sabiam disso: os soldados do Wagner vêm lutando incansavelmente há mais de dez anos, na Líbia, na Síria, na República Centro-Africana e na Ucrânia.

E foi por isso que ele pôde se gabar de que "o Wagner avançou 700 quilômetros sem encontrar resistência. Se a Rússia tivesse pedido que eles assumissem o controle da guerra desde o início, tudo teria terminado na noite de 24 de fevereiro de 2022".

Prigozhin vem aludindo também a um acordo com Belarus – espalhando mais nevoeiro de guerra quanto à possível transferência do Wagner para a jurisdição de Belarus. A OTAN já está aterrorizada de antemão. É de se esperar mais inchamento dos orçamentos militares – a ser imposto na cúpula de Vilnius, no próximo mês.

Acampamentos destinados a alojar pelo menos 8.000 combatentes do Wagner já vêm sendo construídos em Belarus, na região de Megilev – segundo o jornal independente "Vyorstka" ("Layout").

A verdadeira história por trás disso é que Belarus, já há algum tempo, vem esperando um possível ataque da colérica Polônia. Paralelamente, além de fazer a OTAN entrar em modo surtado, Moscou poderia estar examinando a possibilidade de abrir uma nova frente entre Lviv e Kiev.

O Wagner em Belarus faz total sentido. O exército bielorrusso não é exatamente forte. O Wagner defende o front ocidental russo. Isso fará a OTAN surtar – mesmo figurativamente, forçando-a a gastar somas ainda mais astronômicas. E o Wagner pode, tranquilamente, usar aeroportos de Belarus para continuar suas – repaginadas – atividades no Oeste Asiático e na África.

Tudo o que aconteceu desde o Dia Mais Longo é parte de uma sensacional reviravolta de enredo em uma série em andamento – muito mais fascinante que qualquer coisa que a Netflix possa oferecer.

Mas o que a maioria da opinião pública russa realmente parece esperar não é uma outra Cavalgada das Valquírias farsesca. Ela espera uma séria drenagem do pântano burocrático de estilo soviético e um real compromisso em levar essa "quase guerra" à sua conclusão lógica o mais rápido possível.

Tradução de Patricia Zimbres

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