O que esconde a escala 6X1
A escala 6x1 rouba tempo, saúde, convívio e futuro dos trabalhadores. É urgente a mobilização pelo fim desse modelo
* Márcio Ayer, presidente do Sindicato dos Comerciários do Rio de Janeiro, Miguel Pereira e Paty do Alferes
* Tadeu Arrais, coordenador do Observatório do Estado Social Brasileiro
O Sindicato dos Comerciários do Rio de Janeiro (SECRJ) e o Observatório do Estado Social Brasileiro realizaram um estudo inédito sobre os impactos da escala 6x1 na vida da classe trabalhadora brasileira. Intitulado “O que esconde a escala 6x1 – Roubo de tempo e cotidiano dos trabalhadores precarizados”, o levantamento analisou informações de entrevistas com 3.775 trabalhadores e trabalhadoras submetidos à escala 6X1 em 394 municípios brasileiros.
Entre dezembro de 2024 e março de 2025, os participantes responderam a um questionário com 26 perguntas sobre condições de trabalho e deslocamento, saúde física e mental, rendimentos, assédio e expectativas em relação ao futuro, entre outras informações. A partir das respostas, o estudo apresenta um panorama do sofrimento de quem trabalha seis dias por semana, mais de oito horas por dia, uma escala que não permite equilibrar trabalho e vida privada.
A pesquisa demonstra que o comércio – especialmente hipermercados, atacarejos e hortifrutis – é o epicentro da precarização da escala 6x1, com jornadas desumanas, salários baixos e altos índices de adoecimento. Mais de um terço (36,9%) dos entrevistados atuam nesses setores, sendo as funções mais comuns as dos vendedores, operadores de caixa e atendentes.
A pesquisa apontou a concentração da escala 6X1 na faixa etária entre 18 e 24 anos de idade. Não por acaso, segundo a Pnad/IBGE de 2024, é o grupo que apresenta a mais alta taxa de desemprego (12,9%), bem acima da média nacional (6,2%) – e que por isso aceita empregos mais precários e com menor remuneração. Os empregos formais com maior participação percentual de jovens entre 18 e 24 anos, sob a escala 6x1, são, respectivamente, repositores (41,84%), atendentes de loja (34,67%) e atendente de mercado (34,48%).
A escala 6x1 tem impactos diretos na perda de convívio familiar, sendo que nos 30 dias anteriores à data em que responderam a pesquisa, 52% dos trabalhadores tiveram as folgas de domingos ou feriados trocadas por outros dias, o que impactou suas vidas privadas. Além disso, 25% relataram que a escala 6x1 prejudicou relacionamentos familiares e pessoais.
Dentre os entrevistados, 45% recebem entre um e 1,5 salários mínimos, sendo que o telemarketing e a operação de caixa concentram os menores rendimentos, de até um salário mínimo. Nessas funções mais precarizadas, as mulheres pretas são maioria absoluta, representando, por exemplo, 89,7% dos operadores de caixa.
Em relação ao assédio e ao adoecimento, 34% dos entrevistados sofreram ameaças verbais ou físicas por parte de supervisores, sendo que 27% precisaram de atestados médicos no último mês e 21% registraram atrasos devido à exaustão. As principais queixas são as metas inalcançáveis, tarefas extras não contratadas e falta de descanso, sendo que os trabalhadores e trabalhadoras também têm medo de serem demitidos devido à apresentação frequente de atestados.
A escala 6x1 é ainda mais cruel com aqueles que moram nas grandes cidades. É o caso dos municípios da Região Metropolitana do Rio de Janeiro, em que os trabalhadores percorrem grandes distâncias (acima de 20 km) e permanecem longo tempo no deslocamento casa-trabalho-casa. Entre os entrevistados, 24% gastam mais de duas horas no trajeto. O que, somado às longas jornadas, com horas extras frequentes, tem impacto na redução das horas de sono, estudo e lazer.
Os dados da pesquisa demonstram que a escala 6x1 rouba tempo, saúde, convívio e futuro dos trabalhadores. É urgente, portanto, a mobilização pelo fim desse modelo, com redução de jornada sem corte de salários, transporte digno e políticas contra o assédio moral.
* Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.

