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Danielle da Rocha Cruz

Professora de Direito Penal e Processo Penal da UFPB

6 artigos

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O que o depoimento de Tacla Durán nos diz sobre a delação premiada?

Tacla Durán confirma as suspeitas em relação aos acordos de delação que estão no centro das gravíssimas violações perpetradas durante algumas investigações e processos da Lava Jato

Tacla e Moro (Foto: Danielle da Rocha Cruz)
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O Depoimento de Tacla Durán deixou muitos brasileiros perplexos. Suas palavras certamente estão ecoando nas mentes de muitas pessoas que se sentem manipuladas pelo discurso do “combate à corrupção”. Apesar de todas as evidências mostrarem a flagrante violação de direitos e garantias fundamentais perpetradas pela Operação Lava Jato, havia aqueles que acreditavam no objetivo de toda a barbárie inconstitucional que se seguia como algo importante para acabar de vez com o mal que assolava o país. O que parecia representar a concretização da justiça, torna-se um grande pesadelo para a esmagadora maioria dos brasileiros, incluindo os festivos manifestoches, que está pagando um preço bastante pelo “desmonte” da corrupção no Brasil.

Mas voltemos ao cenário da Comissão de Direitos Humanos da Câmara dos Deputados, onde Tacla Durán nos mostra, de forma muito clara, o conjunto  das artimanhas utilizadas por alguns profissionais do Direito para conseguir obter a “verdade real” na Operação Lava Jato, não sem antes cometer alguns “arranhões” na Constituição (curioso termo usado pelo ex-Presidente Fernando Henrique Cardoso em matéria publicada no Jornal Estado de São Paulo, referindo-se ao impeachment/ golpe da Presidenta Dilma Rousseff).

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Um dos institutos do Processo Penal que mais ganharam notoriedade com a Operação Lava Jato foi a delação (ou colaboração), um dos pontos altos do depoimento de Tacla Durán. A delação premiada é um dos meios de obtenção de prova previstos na legislação brasileira. Tem como objetivo desbaratar organizações criminosas através da contribuição de uma ou mais pessoas envolvidas de alguma maneira nas atividades ilícitas realizadas pela organização.

Após a criminalização dos partidos políticos, com destaque para o PT, a utilização indiscriminada da delação premiada tornou-se o principal instrumento probatório da Operação Lava Jato. Um dos requisitos legitimadores da delação premiada é a voluntariedade. O investigado ou acusado/delator deverá apresentar as informações que julgue relevantes para a elucidação do crime, sem qualquer tipo de coação, ameaça ou tortura. No entanto, após ser questionado pelo Deputado Paulo Pimenta sobre se as delações premiadas realizadas no âmbito da Lava Jato estavam sendo realizadas mediante tortura psicológica, Tacla Durán responde de forma contundente sobre os graves subterfúgios utilizados para se conseguir os acordos de delação. Confirma o que já parecia acontecer nos porões da Polícia Federal de Curitiba.

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Em seu depoimento, Tacla Durá desmascara a farsa dos acordos de delação premiada celebrados no âmbito da Lava Jato, chegando, inclusive, a denunciar um mercado negro que teria surgido a partir da excessiva e desmedida utilização do referido instituto. É bem verdade que a incontestável farsa que permeava as delações já podia ser observada com as conduções coercitivas, as prisões temporárias ou preventivas de delatores e de seus parentes realizadas antes da celebração dos acordos. É evidente que tais artifícios suprimem o caráter voluntário da delação, consistindo em verdadeira utilização de tortura psicológica contra os colaboradores, o que, consequentemente, invalida quaisquer provas obtidas a partir de acordos firmados por eles. Os “arranhões” à Constituição realizados com tais métodos são de extrema gravidade. A partir da Operação Lava Jato, houve um empoderamento do Poder Judiciário, do Ministério Público e da Polícia investigativa que resultou, na realidade, em uma mola propulsora para um incessante autoritarismo judicial.

Esse autoritarismo passou a fazer parte da rotina dos brasileiros, que, muitas vezes, no ingênuo afã de solucionar o grande problema nacional da corrupção, passaram a aplaudi-lo ou a exaltá-lo. As consequências do autoritarismo judicial saltam aos olhos: relativização da presunção de inocência, com a admissibilidade de execução provisória da pena (se é provisória, é porque pode ser alterada, o que representa uma das mais graves violações das garantias constitucionais); restrição da ampla defesa e do contraditório, com o indeferimento injustificado de oitivas de testemunhas; violação da busca da verdade, ao considerar-se a delação premiada como prova inconteste acerca dos fatos investigados; quebrantamento da imparcialidade, com pré-julgamentos divulgados na impressa e nas redes sociais, antes mesmo do recebimento de recursos e de petições, quando o princípio da imparcialidade está nas bases do processo penal constitucional, de modo que qualquer processo conduzido com a sua violação está eivado de vícios insanáveis. Não se pode mensurar os prejuízos para o Estado Democrático de Direito que estão sendo suportados com tamanha arbitrariedade.

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Tacla Durán confirma as suspeitas em relação aos acordos de delação que estão no centro das gravíssimas violações perpetradas durante algumas investigações e processos da Lava Jato. A delação premiada é um meio de obtenção de prova previsto na legislação. No entanto, seus requisitos letigitimadores não podem ser afastados em nome do combate à corrupção ou de qualquer crime que seja, pois tais requisitos representam a necessidade constitucional de limitar a atuação investigativa como meio de proteção de direitos e garantias fundamentais.

O Brasil passa por momentos de instabilidade política que também decorrem de algumas decisões judiciais. Nesse contexto, são bastante pertinentes as palavras de Piero Calamandrei ao tratar da relação entre a justiça e a política: “Houve, durante o fascismo, mais do que se imagina, magistrados heroicos dispostos a perder o posto e até a enfrentar o confinamento para defender sua independência; houve, depois, uma grande massa de magistrados apegados às leis e dispostos, sem discutir o regime de que haviam emanado, a aplicá-las com digna imparcialidade. Mas, infelizmente, também houve (é preciso confessar) alguns magistrados indignos que, para chegar rapidamente aos mais altos cargos de direção, sujeitaram sem escrúpulos sua consciência.”

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Danielle da Rocha Cruz é professora de Direito Processual Penal da UFPB, integrante de rede de Professores Pela Liberdade Democrática, autora e organizadora dos livros Estado de Direito e Direitos Fundamentais (2005) e Criminalidade Informática (2006).

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