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Jose Carlos de Assis

Economista, doutor em Engenharia de Produção pela Coppe-UFRJ, professor de Economia Internacional da UEPB

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O que pode vir depois da deposição de Bolsonaro

O Executivo nada constrói. O próprio presidente sem apetite para governar disse que veio para destruir, não para construir. Os bancos públicos não financiam. E as empresas não tem estímulo para investir porque não há demanda

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Até onde alcançam minhas informações de história, nada no mundo, exceto guerras, pode ser comparável à tragédia brasileira contemporânea. Não nos estão roubando apenas o presente. Querem reescrever a História para salvar, sem qualquer benefício prático, a reputação da ditadura. Estão nos roubando as perspectivas de vida decente no futuro com ajustes fiscais permanentes e a destruição do patrimônio público. As principais instituições juntaram-se num conluio macabro para soldar seus próprios privilégios e escravizar o povo.

O Executivo nada constrói. O próprio presidente sem apetite para governar disse que veio para destruir, não para construir. Os bancos públicos não financiam. E as empresas não tem estímulo para investir porque não há demanda. O governo afirma-se como vendilhão impune dos bens estratégicos nacionais, do petróleo à energia elétrica. O Judiciário finge que não vê evidências de ilegalidade e inconstitucionalidade de seus atos. O Legislativo aprova tudo que seja antinacional e anti-povo. Enquanto isso a Lava Jato é o poder absoluto da República, agora locupletando-se das próprias multas que tem aplicado.

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Por trás disso tudo estão as Forças Armadas, guardiães da vitória de Jair Bolsonaro nas eleições, e virtuais donas do poder uma vez tendo sido eleito. Chegamos ao cúmulo de torcer para que assumam o poder abertamente na hipótese de impeachment  ou de renúncia forçada do presidente boçal. Entretanto, há nisso também os piores riscos. O primeiro é o despreparo evidente dos militares para o exercício do poder supremo direto da República. Na ditadura, tiveram ajudas civis importantes, como a do então desenvolvimentista Roberto Campos.

A grande incógnita do momento se chama Mourão, o vice. Observando os primeiros meses do governo, ele pode concluir, como faz grande parte da população e como fizeram as revistas das últimas semanas, que o experimento Bolsonaro é um absoluto fracasso e uma irresponsabilidade cívica que devem ser encerrados. Mas será que o certo para ele é Paulo Guedes, o superministro de ineficácia infinita que vendeu a alma para o objetivo único de liquidar a Previdência pública? Será que acreditam que Paulo Guedes está certo, e o errado é o Congresso Nacional por ter ameaçado rejeitar seu plano macabro?

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O destino a curto prazo da República está nesse ponto: se Mourão concluir que Guedes está errado, há esperança para alguma composição política acima das cinzas do neoliberalismo radical e dos interesses pornográficos do mercado. Se achar que está certo, vamos nos preparar para um período dramático de convulsões sociais que os militares no poder vão confundir com comunismo, socialismo, agora também fascismo, e o que mais podem sua ignorância ou ingenuidade alimentadas de preconceitos anacrônicos nas escolas de estado maior.

Na primeira hipótese considerada eu me colocarei ao lado dos que, ajudando Mourão a costurar um pacto social de emergência no país, procurarão regenerar a economia, retomar o desenvolvimento e restaurar a ordem trabalhista destroçada pelos agora réus Michel Temer e Moreira Franco. Há muito ressentimento justificado no ar, de forma que a costura desse pacto dependerá da existência ou não de militares desenvolvimentistas no Brasil.

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Na segunda hipótese, apertem os cintos! Uma convulsão social não nasce do acaso. Pensem numa grande marcha  pacífica contra o desemprego recorde, perto dos 12%,  na Av. Paulista ou na Rio Branco no Rio. A revolta e a ira dos miseráveis estão no ar. Avançam imprudentemente sobre a polícia. A polícia atira. São 11 mortos. O governo culpa  esquerdistas. Marca-se nova manifestação. Mais mortes. Outras capitais aderem. O Brasil entra em convulsão. Alguns militares ganham medalhas por matar gente do povo. Ainda não é revolução. Mas pode haver revolta de militares que se recusam a ser os novos capitães do mato.

Um governo desenvolvimentista, do tipo de uma determinada época da ditadura dos anos 70, conduziria o povo para uma negociação. O governo Geisel fez isso. Não sei por que cargas d´água Mourão critica Geisel economicamente, quando a economia foi um inequívoco acerto dele.  Quanto ao pacto, não adianta apelos hipócritas. Só há confiança caso seja apresentado um programa de pleno emprego e de desenvolvimento confiável. Lideranças trabalhistas devem ser aceitas como interlocutores válidos. De empresários não se pode esperar nada: são a escória da nação cujo único objetivo é escravizar os trabalhadores.

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No plano social, o interregno Bolsonaro nos remete às greves históricas de 1917 em São Paulo e outras cidades do país. Também nesse caso o empresariado resistia estupidamente a negociar. Teve que ceder. Agora não se precisa dele. A burguesia nacional é a única burguesia do mundo, apoiada em assessores imbecis, que trata salário exclusivamente como custo, e não como receita potencial de consumo. É extremamente reacionária e incapaz de ver seus interesses, por exemplo, numa progressista política industrial.

Em tese, talvez tratar com os militares seja melhor que tratar com a burguesia. Covarde, ela aceita qualquer medida vinda de autoridade. Ela tem sido a primeira a ceder os interesses nacionais em favor dos seus interesses particulares. Lutou violentamente para destruir a política trabalhista. Sua representação política é infame. Na indústria, muitos dirigentes – os donos da Fiesp, por exemplo – sequer são industriais. São burocratas com o comando de uma imensa estrutura corporativa, Sesi e Senai, bancada não por eles mas por impostos.

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Mourão faz declarações importantes sobre política externa, mas foi muito mal informado, como disse, a respeito dos feitos positivos da ditadura de 64. Em lugar de reescreverem a história no aspecto político, os militares deveriam se concentrar nos aspectos econômicos positivos da era Geisel. Ninguém há de perdoar o regime pelos mortos, mas em economia uma política liberal (porém não neoliberal) teria sido muito melhor para o povo, como agora. Foi uma época de  desenvolvimento, financiado, sim,  por recursos externos então abundantes na esfera internacional, os chamados petrodólares.

Os revisionistas neoliberais alegam que o endividamento prejudicou o país. Não é verdade. O endividamento está presente numa ampla infraestrutura energética e logística, desde Itaipu a Balbina e Tucuruí, grandes rodovias e a Ferrovia do Aço, na indústria petroquímica tripartite, na siderurgia, entre outras grandes obras. Claro, nem um neoliberal renitente poderia imaginar que o FED americano subisse os juros, referência para os créditos tomados, para mais de 20%. Estupidez foi o governo Figueiredo, com Delfim no comando da economia, não ter declarado a moratória em 1982!

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Situações econômicas extremas levam a exasperação de parte a parte. Nos anos 60, depois do golpe, e passado o tremendo ajuste fiscal de Campos e Bulhões, o país chegou a 68 exasperado. A economia estava retomando mas não se sabia disso. A insatisfação tomou as ruas na forma de passeata dos 100 mil. Alguns jovens revoltados preparavam-se para a guerrilha urbana. Os militares não chegaram ao AI-5 por acaso, mas pelo movimento dialético inexorável da sociedade estressada por uma situação econômica de extrema restrição. Se Mourão apostar nesse caminho, mais vale que seja cassado junto com Bolsonaro por conta de fraudes, reconhecidas por este último, nas eleições presidenciais.

P.S. Se alguém está interessado numa avaliação da política econômica e da economia política da ditadura, veja “O Grande Salto para o Caos”, Zahar Editor, que escrevi em parceria com a professora Maria da Conceição Tavares, em 1985. Nossa crítica não foi ao fato de se financiar o desenvolvimento com dívida, na era Geisel, mas sim a estúpida política financeira de Mário Henrique Simonsen pela qual o Banco Central enxugava a contrapartida interna da entrada de recursos externos com títulos públicos, gerando duas dívidas, a externa e a interna, mantendo exageradamente baixa a liquidez da economia.

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