O queijo de leite cru, de leite cozido e o feito com leite pasteurizado
O sabor do leite foi redescoberto, com variações entre as regiões leiteiras do país. Já são observados sabores minerais, apimentados ou cítricos
Há 200 anos o químico Louis Pasteur lançou as bases da microbiologia, ramo da ciência que trata dos micróbios (microrganismos) - e das doenças que eles causam, como a varíola, a raiva e a tuberculose. Um dos seus mais importantes legados foi a pasteurização, processo que consiste em elevar e depois baixar a temperatura dos alimentos rapidamente, algumas vezes, de forma a obter um produto estéril, livre de contaminação. O leite pasteurizado dominou o mercado para consumo humano, nas indústrias de carnes, massas e bebidas.
Mas nos queijos não foi bem assim. Leite pasteurizado não tem um sabor que se destaque, ficando todos muito parecidos ou pasteurizados. Isso exigia o emprego de outras substâncias que lhes dessem sabor, como os fermentos, as especiarias, geléias ou frutas.
O resultado da pasteurização são queijos mais “pobres’ de sabor, mais padronizados. Exatamente o que os queijos franceses, italianos, holandeses e espanhóis não são. Afinal, são feitos de leite cru, não pasteurizado.
Leite cru, desde que colhido com cuidados sanitários, pode ser consumido sem problemas, ainda mais se for fervido (mas não esfriado rapidamente). Este processo é padronizado, mecanizável e manualizado, podendo receber o poderoso selo do SIF - Serviço Federal de Inspeção Dessa forma os queijos podem guardar o sabor do leite e ser envelhecidos ou fermentados sem problemas. Daí a enorme variedade de queijos na Europa, com fungos na sua massa (Gorgonzola, Roquefort), na sua capa (Brie, Camembert), duros (Pecorino, Grana Padano), entre os milhares de tipos desenvolvidos.
No Brasil as questões sanitárias impediram o mercado de queijo de leite cru se estabelecesse. Mas na década de 2010 começou a surgir uma legislação mais moderna, que culminou em 2019 com a lei do queijo artesanal, que abarcou a produção desses queijos, estabelecendo parâmetros de saúde pública para sua produção. Essa batalha foi capitaneada pelo povo mineiro, que conseguiu a definição de duas áreas de produção: Canastra e Serro. O que é surpreendente é o resultado final desse processo.
O Brasil se tornou do dia para a noite, num grande produtor de queijos finos, feitos com leite cru. Em pouco mais de 10 anos marcas surgiram e se internacionalizaram, como o queijo do Reinaldo (tipo Minas, curado, da canastra), o Lua Cheia, feito pela queijaria serra das Antas, de Bueno Brandão, MG, o morro azul, de Pomerode, Santa Catarina e o Atalaia, da parte paulista da serra da Mantiqueira. Todos foram premiados em concursos internacionais e ganharam destaque mundial.
Saímos dos infindáveis queijos brancos como a neve e gosto de chuchu maduro e das enormes pilhas de queijo meia-cura, um tanto indigestos, para queijos brie, camembert e parmigiano, todos de boa qualidade. Ouve uma melhoria geral da produção de queijos brasileiros, que revelou insuspeitos mestres queijeiros, que não se limitaram a copiar os europeus, mas tem sido inovadores, trazendo novos sabores e aromas, temos queijos de diversas maturações, com cinzas, cúrcuma, sementes, entre muitas invenções.
O sabor do leite foi redescoberto, com variações entre as regiões leiteiras do país. Já são observados sabores minerais, apimentados ou cítricos. Já produzíamos o melhor requeijão do mundo, o catupiry. Agora estamos enfrentando a grande potência dos queijos – a França - e temos ganho em algumas categorias.
* Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.

