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Helena Iono

Jornalista e produtora de TV, correspondente em Buenos Aires

122 artigos

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O retorno do MAS ao governo da Bolívia e o papel da Argentina na volta de Evo Morales

A experiência e a ponte entre a Argentina e a Bolívia nos obrigam a rememorar e também dispor-se a reconstruir os melhores momentos e conquistas da história

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Neste domingo, 8 de novembro, o povo argentino e latinoamericano vibraram com a volta do Movimento ao Socialismo (MAS) ao governo, a posse do presidente eleito Luís Arce, e o vice-presidente David Choquehuanca, de origem aimará, na Bolívia. O retorno se dá com uma vitória contundente de 55,1% de votos do MAS contra 28% de Carlos Mesa. O governo argentino de Alberto Fernández, ao aliar-se à iniciativa mexicana de López Obrador e conceder exílio a Evo Morales, jogou um papel importante no tabuleiro latino-americano e mundial para exercer, junto à resistência do povo boliviano, um fator de pressão para derrotar o golpe fascista e o governo de fato de Añez. No ato de posse presidencial, um especial e comovente abraço se realizou com o mandatário argentino. 

No desfile cívico militar na praça Murillo em La Paz (Bolívia), após os amplos discursos, de posse presidencial na Assembleia Legislativa, ficou evidente que a grande força motora da resistência ao golpe e da recolocação do MAS no governo, foi além do voto, a capacidade de mobilização dos trabalhadores mineiros e camponeses, junto aos povos originários presentes aí, em cordões festivos e infindáveis. Muito significativa também a participação de jovens militares no desfile, incluindo o corpo de defesa presidencial, os “colorados de Bolívia”, e o forte apelo ao exército para cumprir a defesa da pátria, da constituição e do povo. Recordou-se ao histórico coronel Gualberto Villaroel (1910-1946) e suas palavras: “Não sou inimigo dos ricos, mas sim, mais amigo dos pobres”. Um desfile emblemático, uma inspiração para que o novo governo esteja atento e estabeleça uma união cívico-militar nos moldes da revolução bolivariana da Venezuela herdeira do legado de Hugo Chávez: “a revolução é pacífica, mas não desarmada!”.

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“Já não mais perseguição à liberdade de expressão, já não mais a judicialização da política, já não mais o abuso do poder”. “Já não mais impunidade. Justiça, irmãos! Mas a justiça tem que ser verdadeiramente independente. Ponhamos fim à intolerância, à violação dos direitos humanos e da nossa Madre Terra.” (Algumas palavras do discurso do vice-presidente, David Choquehuanca)
Além da Justiça, torna-se necessária uma mudança no Exército e na Polícia boliviana  que descumpriram seu dever de defesa da vida e da dignidade do povo boliviano para impedir o golpe do governo de facto em 2019. Está em debate como uma nova era de avanços do poder popular e controle social será requerida com a posse de Luís Arce e a volta de Evo Morales (que iniciou a sua comovedora “caravana do retorno à Pátria”), partindo de Quiaca em Jujuy (Argentina), onde saudou especialmente à líder argentina dos povos originários Milagro Salas: “Comparto a luta de Milagro. Cedo ou tarde a justiça chega. Estamos contigo. Muita força, irmã Milagro!”.

Depois de jantar e tomar o café da manhã com Evo Morales em Quiaca na 2a. feira, retornando da posse de Luís Arce, Alberto Fernandez o acompanhou até passar a Villazón (cidade boliviana fronteiriça), onde o despediu, num ato comovedor, entregando-o ao povo boliviano que o esperava no outro lado da ponte Horácio Guzmán para seguir até Chimoré. Trata-se de uma enorme caravana de exilados, 145 cidadãos bolivianos e 17 ex-funcionários do governo de Evo Morales, entre eles o ex-vice-presidente, Álvaro Garcia Liñera, em 100 veículos até Villazón, aos que se juntaram outras centenas em território boliviano, para caminhar mais de mil quilômetros até Chimoré. A oposição não respeita a democracia, provocando interrupções das estradas. Mas, a caravana segue, buscando outros caminhos, e sempre acolhida pela população massiva dos vilarejos. Veja aqui, minuto a minuto das imagens e das reuniões de Evo Morales com o povo durante a comovente caravana no Página12.

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“O companheiro Evo Morales está regressando à sua Pátria, de onde nunca devia ter-se ido. Nunca devia ter sofrido este maltrato!” “Esta é uma experiência que nos deve ensinar a todos. Nestes últimos quatro anos, a América Latina foi se desintegrando em suas individualidades. Nós não queremos países só para alguns. Queremos países para todos!” “É um dever de cada um de nós socorrer os povos que estão feridos”. “Se há um lugar na América Latina onde as estruturas sociais e econômicas mudaram, esse lugar se chama Bolívia”.  (Alberto Fernandez)

“Em pouco tempo demonstramos que a Bolívia tinha muito futuro. Nós a transformamos. Esse foi o nosso delito”. “Eu não duvidava que ia voltar, mas não acreditava que ia ser tão já. Isso foi graças à unidade do povo boliviano”.  (Evo Morales)
Durante o exílio, Evo Morales, Garcia Liñera e outros funcionários e cidadãos bolivianos refugiados na Argentina, receberam uma enorme solidariedade do povo argentino e dos imigrantes bolivianos radicados, que lhes deram acolhida, roupas, alimentos, frutas, verduras, carne e uma massiva votação ao MAS. Organizaram-se reuniões, debates e encontros de solidariedade contra o golpe. Evo Morales agradeceu antes de cruzar a fronteira: “Sinto-me surpreso pelo acompanhamento do povo argentino, especialmente do irmão presidente Alberto Fernández”. “Parte da minha vida fica na Argentina, após estes onze meses”. “Foi um exemplo prático de como os povos trabalham em solidariedade e complementariedade”. Evo Morales recordou a Nestor Kirchner e reiterou que o irmão Alberto salvou sua vida. Leia.

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Há 10 anos da morte de Nestor Kirchner e 15 anos do Não à ALCA

A experiência e a ponte entre a Argentina e a Bolívia nos obrigam a rememorar e também dispor-se a reconstruir os melhores momentos e conquistas da história. Após, a manifestação de 17 de outubro pelo Dia da Lealdade peronista, veio o 27 de outubro onde milhares de peronistas-kirchneristas saíram em caravana para recordar Néstor Kirchner que fez renascer o peronismo, a soberania nacional e os direitos humanos. Evo Morales e os exilados bolivianos completaram sua escola latino-americana neste cenário. Na mesma data, a Carta de Cristina Kirchner teve um eco central e abriu um enorme debate entre as forças políticas da Frente de Todos sobre a atual situação, redefinindo metas econômicas a cumprir, com um claro respaldo objetivo a seu par, o presidente Alberto Fernandez.

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Recordar Nestor Kirchner, significou também recordar a IV Cúpula das Américas em Mar del Plata, entre 4 e 5 de novembro de 2005, onde nasceu uma Frente emancipadora contra a dominação do EUA na América do Sul, consolidando o Mercosul. Foi uma derrota de George Bush que recebeu um contundente “Não à ALCA”, que trouxe às telas da TV, Hugo Chávez, acompanhado por Nestor e Lula, também na manifestação (onde esteve Maradona) e na reunião paralela dos movimentos sociais e sindicais da América Latina, a “Cúpula dos Povos”, com seu grito de vitória: “Não à ALCA, caralho!” . Daí nasceu a integração, incluindo vários governos progressistas de então, e a criação de organismos como UNASUL e CELAC, incorporando Cuba e excluindo os EUA e o Canadá.

É hora de recuperar a união latino-americana dos povos com novos governos populares e novas lições para um “Nunca Mais” continental. A Argentina e a Bolívia prometem um enlace fundamental para que o exemplo se propague rumo ao Chile, que já se levanta contra a Constituição de Pinochet, e o Equador, que pode levar à derrota de Lenin Moreno.  Evo Morales, hoje, 10 de novembro, já está atuando. Sua caravana passou por Uyuni, onde deu uma coletiva de imprensa e disse: “Estamos seguros que dois ou três países no futuro poderão definir o preço do lítio no mundo; isso está nas nossas mãos.” “Vamos construir indústrias de Estado, não de privados”.

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O percurso não é linearmente democrático, nem pacífico: na Argentina, a guerra de classes opositora, desestabilizadora, e midiática, operada por Macri e Patricia Bullrich é contínua, não obstante a derrota eleitoral de JxC (Juntos por el Cambio). Só o protagonismo nas ruas, da maioria organizada em movimentos sociais e sindicatos como na Bolívia e  a na Argentina, podem garantir os seus direitos e os governos que os defendem. Restabelecer uma relação de forças de poder regional como 15 anos atrás do “Não ao ALCA” em Mar Del Plata é imprescindível. Ninguém se salva só. A “Pátria Grande” é necessária, sem pruridos de defender a superioridade econômica e social da Rússia e da China e sem crer que a vitória de Biden sobre Trump mude as intenções devastadoras de guerra do poder financeiro global sobre o mundo.

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