Ruy Conde avatar

Ruy Conde

Jornalista e estrategista em comunicação. CEO da It Comunicação Integrada

2 artigos

HOME > blog

O risco dos resumos de IA do Google: quando a tecnologia ameaça reputações

Se a informação é poder, a desinformação automatizada é risco sistêmico. A busca por eficiência não pode se sobrepor ao direito fundamental de não ser difamado

Logo do Google (Foto: REUTERS/Dado Ruvic/Imagem ilustrativa)

O Google lançou recentemente o recurso de resumos produzidos por inteligência artificial em sua busca. A promessa é clara: sintetizar, de forma rápida, as principais informações sobre qualquer tema, poupando o usuário de abrir links e navegar por sites. É a busca deixando de ser apenas um índice para se tornar também um editor. A novidade vem acompanhada de um alerta do próprio Google: os resumos podem conter erros. Esse aviso não é detalhe técnico, é o coração do problema. Em temas neutros, como “qual a capital da Nova Zelândia”, o risco é pequeno. Mas, quando a ferramenta resume a vida de pessoas e instituições, um erro pode equivaler a acusação falsa, capaz de destruir reputações. Em pesquisas recentes, ficou evidente que a IA pode gerar variações preocupantes ao tratar de nomes. Em alguns casos, o resumo dizia que determinada pessoa teria sido formalmente denunciada por ato ilegal. O problema: isso nunca ocorreu. A informação vinha de uma reportagem genérica, sem individualizar a denúncia. Ao “resumir”, a IA transformou uma narrativa imprecisa em acusação direta. Não é caso isolado. Há relatos de resumos que distorcem entrevistas, confundem datas, associam empresas a escândalos de concorrentes ou atribuem falas a autoridades que jamais as proferiram. Como o sistema reformula a cada busca, o mesmo tema pode aparecer em versões diferentes — todas com potencial de espalhar erros. O impacto se multiplica porque a ferramenta está no buscador mais usado do mundo. Ao contrário de uma matéria jornalística, que pode ser corrigida, ou de um post em rede social, que pode ser apagado, o resumo de IA se renova indefinidamente, repetindo distorções. Não por acaso, já há processos nos Estados Unidos contra o Google, movidos por grupos de mídia que questionam a perda de audiência e receita. Mas a disputa não é só econômica. O ponto central é: quem responde quando a IA atribui a alguém uma acusação inexistente? No Brasil, decisão recente do Supremo Tribunal Federal sobre responsabilidade das plataformas abre caminho para que casos de difamação gerados por IA cheguem ao Judiciário. A tendência é que empresas como o Google passem a ser cobradas não apenas por remover conteúdos ilegais após notificação, mas também por prevenir distorções que causem danos à honra e à imagem. Essas imprecisões não são deslizes técnicos. Quando a IA erra em temas sensíveis — como reputação profissional, histórico de empresas ou conduta de autoridades —, o dano pode ser imediato e profundo. No ambiente digital, uma acusação inexistente repetida por uma ferramenta dominante ganha aparência de verdade, mesmo sem base factual. Se a informação é poder, a desinformação automatizada é um risco sistêmico. A busca por eficiência não pode se sobrepor ao direito fundamental de não ser difamado. *Ruy Conde é CEO da It Comunicação Integrada, estrategista em reputação e estudioso dos impactos da inteligência artificial na comunicação. Em 2023, participou da elaboração da primeira Declaração de Princípios de Direitos Humanos sobre Inteligência Artificial no Mercosul, aprovada na 42ª Reunião de Altas Autoridades sobre Direitos Humanos (RAADH), em Brasília.

* Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.