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Décio Lima

Presidente do Sebrae Nacional

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O sistema eleitoral e a qualidade da democracia

Projetos de salvação individual, ao custo da ruína da democracia, como o distritão e formas de financiamento que estimulem as desigualdades agora existentes em nossos processos eleitorais, seriam um prejuízo severo para nosso país, nosso povo, nossa democracia e para a própria qualidade de nossa liberdade

congresso (Foto: Décio Lima)
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A existência e qualidade da democracia estão ligadas de forma visceral ao tipo de sistema eleitoral adotado. Obviamente a primeira exigência para que haja democracia é a igualdade política entre os cidadãos "Uma pessoa, um voto" é o valor fundamental de qualquer sistema democrático. Isso basta para que a democracia se realize? Tenho fortes motivos para acreditar que não. A universalidade do voto é imperativa, mas é pouco. Para que a democracia tenha qualidade é preciso garantir também que a eleição aconteça em condições mínimas de liberdade. A presença do voto universal na ausência de liberdade articula aberrações políticas como as que convencionamos chamar de voto de cabresto e curral eleitoral, práticas corriqueiras da República Velha que deitaram raízes profundas na tradição política brasileira. Através de tais práticas o exercício da liberdade de escolha é condicionado em formas e meios que coagem o eleitor, consciente ou inconscientemente, até que o livre arbítrio esteja suprimido. A restrição da liberdade de escolha pode se dar por muitas formas e inclusive de maneiras sutis. A dificuldade do eleitor em acessar informações verdadeiras e precisas sobre os concorrentes, ocasionada, por exemplo, por uma mídia partidarizada e sem ética é condição que compromete severamente a liberdade de escolha do eleitorado. A diferença de poder econômico entre as candidaturas, permitindo a algumas alcançar o público de forma mais ampla e profunda, é outro caso de cerceamento de liberdade possível mesmo dentro de um sistema aparentemente igualitário.

Estas são grandes questões para um sistema democrático, mas não seus únicos problemas. A própria representação é algo problemático. A amplitude e complexidade das sociedades contemporâneas inviabiliza que possamos todos nos representar diretamente, o tempo todo, sobre todas as questões. A representação, baseada no voto universal e livre, é a forma que as sociedades democráticas escolheram para lidar com tal complexidade. A idéia é simples, mas a execução é complexa e problemática, tanto que não existe nenhum consenso a respeito. Sociedades livres diversas constituíram, em diálogo com suas particularidades, modelos eleitorais diversos para tentar resolver o enigma da representação. A questão não é simples, quando voto devo poder escolher não só quem me representa, mas também o que será defendido em meu nome, o voto não pode ser uma carta branca para que meu representante faça o que achar mais apropriado, devo ter, de antemão, garantias sobre seu nível de comprometimento com questões que considero pertinentes. A vinculação dos mandatários a partidos, que portam plataformas políticas, e um modelo eleitoral que considera a opinião do eleitor sobre ambos, e divide o poder entre eles, é, embora imperfeita, a melhor fórmula encontrada na experiência histórica das sociedades democráticas.

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Contra todos estes valores, consagrados pela tradição democrática do Ocidente, surge no Congresso Nacional uma proposta de reforma política que caberia melhor ao sistema feudal do que a uma democracia moderna. O distritão, ao tornar majoritárias as eleições proporcionais, ignora a posição dos eleitores de cada estado sobre as grandes questões políticas em discussão, não permite que a pluralidade de opiniões se manifeste através de forma equilibrada na composição dos parlamentos e faz com que o eleitor decida somente quem é o dono de feudo a quem ele dará uma carta branca. Outro resultado é a dificuldade que tal projeto opõe a renovação dos parlamentos ao forçar os partidos a diminuírem o número de candidaturas, e consequentemente de possibilidades de escolha do eleitor, e a lançarem somente os mais conhecidos, geralmente os que já ocupam cargo de representação. O modelo de distritão é tão insuficiente para a qualidade da democracia que só é adotado por quatro países, todos muito menores que o Brasil.

Outra questão extremamente importante é a intervenção direta do poder econômico no resultado das eleições, o que resulta em uma profunda desigualdade de condições entre as candidaturas. Este é um assunto sério e controverso, mas tão importante para a qualidade da democracia que estou convencido da necessidade de um referendo popular que realize um amplo debate sobre as formas de financiamento do processo eleitoral e permita ao eleitor decidir qual considera mais apropriada para nossa realidade. Precisamos consolidar um modelo transparente, justo e equilibrado, que garanta uma otimização dos gastos, minimize a intervenção do poder econômico, promova determinada igualdade de condições entre as candidaturas e torne a disputa mais justa, aprimorando a liberdade de escolha do eleitor. Projetos de salvação individual, ao custo da ruína da democracia, como o distritão e formas de financiamento que estimulem as desigualdades agora existentes em nossos processos eleitorais, seriam um prejuízo severo para nosso país, nosso povo, nossa democracia e para a própria qualidade de nossa liberdade.

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