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Bia Willcox

Bia Willcox é advogada, jornalista e pesquisadora nas áreas de Empreendedorismo, Inovação e Marketing. Atua como mentora de negócios e escreve sobre os impactos da hiperconectividade, da inteligência artificial e das tecnologias emergentes nas relações humanas e no futuro da sociedade.

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Oceano Azul em 2025: ainda existe ou já virou lenda corporativa?

Como a inovação acelerada e a cópia em escala global estão transformando oceanos azuis em territórios disputados

Oceano Azul em 2025: ainda existe ou já virou lenda corporativa? (Foto: reprodução)

Em 2005, dois professores de negócios, W. Chan Kim e Renée Mauborgne, lançaram uma ideia que soava como música para os ouvidos de qualquer empreendedor: fugir do “oceano vermelho” — aquele mercado cheio de competição feroz e guerra de preços — e nadar para um “oceano azul”, vasto, calmo e cheio de oportunidades, onde você poderia crescer sem rivais por perto.

Era como trocar uma corrida de carrinho de bate-bate por um passeio de veleiro ao pôr do sol. Quem não compraria essa imagem?

Quando o livro saiu, os exemplos eram de arrepiar qualquer MBA que se preze. O Cirque du Soleil não competiu com circos tradicionais — criou uma categoria nova misturando teatro, dança e acrobacias para um público adulto e sofisticado. A Nintendo Wii ignorou a guerra gráfica do PlayStation e Xbox para focar em jogos familiares e controles intuitivos, conquistando avós e crianças que nunca tinham tocado em um videogame. O Yellow Tail transformou vinho em uma bebida descomplicada para quem se intimidava com rótulos franceses cheios de termos técnicos. E a Southwest Airlines voou para longe das grandes companhias aéreas, oferecendo voos baratos, diretos e sem frescura — virando a empresa aérea mais lucrativa dos Estados Unidos por décadas. 

A Hering provou que até camiseta básica pode virar oceano azul. Quando as importações chinesas invadiram o Brasil nos anos 2010, ameaçando esmagar a indústria têxtil nacional, a marca centenária catarinense não entrou na briga por preço mais baixo. Em vez disso, apostou numa jogada inteligente: transformou produtos simples em marca desejada. Criou uma rede de franquias robusta, investiu pesado em branding e adotou estratégias digitais para criar conexão emocional com o cliente. O resultado? Conseguiu cobrar mais por uma camiseta branca básica do que muitos concorrentes internacionais, provando que, no oceano azul brasileiro, quem tem marca forte nada melhor que quem só tem preço.

Esses pioneiros realmente conseguiram criar mercados do zero, surfar sozinhos por anos e faturar alto, enquanto a concorrência ficava olhando de longe, sem entender direito o que estava acontecendo.

Mas aqui está o problema: a internet cresceu, o mundo acelerou e, hoje, qualquer boa ideia vira alvo em questão de minutos. 

O problema da velocidade digital: a era do Ctrl+C, Ctrl+V global

Quando a teoria surgiu, a internet ainda era uma adolescente. Hoje, vivemos na era do “copiar e colar” em escala global. Uma boa ideia pode ser replicada em semanas, às vezes em dias.

Lembra do Zoom, que virou sinônimo de videoconferência na pandemia? Parecia o oceano mais azul possível, até que Microsoft Teams, Google Meet e outras gigantes da tecnologia desembarcaram com recursos similares e distribuição massiva. O TikTok criou um formato revolucionário de vídeos curtos, mas, em pouco tempo, Instagram (Reels), YouTube (Shorts) e até LinkedIn copiaram a fórmula.

Até mesmo sucessos brasileiros enfrentam essa realidade. O Nubank criou um oceano azul no setor bancário com seu cartão roxo sem anuidade e atendimento 100% digital. Funcionou por anos, mas hoje enfrenta dezenas de fintechs e bancos tradicionais que migraram para o digital com ofertas similares.

Além da velocidade, 2025 trouxe novos critérios para definir sucesso: impacto ambiental, propósito social e transparência. Não basta inovar — é preciso provar que sua inovação não vai afundar o planeta no processo.

A Patagonia exemplifica essa nova realidade ao transformar roupas esportivas em símbolo de ativismo ambiental, chegando ao ponto de publicar anúncios pedindo para as pessoas não comprarem seus produtos. No Brasil, o Grupo Boticário seguiu caminho similar: investiu pesado em sustentabilidade décadas antes de o tema virar moda, tornando-se a terceira empresa de beleza mais sustentável do mundo e criando programas sociais que já beneficiaram mais de 200 mil mulheres em situação de vulnerabilidade.

Outro fator que Kim e Mauborgne não poderiam prever em 2005: as gigantes da tecnologia se tornaram máquinas de identificar e esmagar oceanos azuis nascentes. Amazon, Google, Meta e Apple têm recursos para entrar em qualquer mercado promissor e muscular a concorrência. É como ter tubarões-brancos nadando em todos os oceanos simultaneamente, farejando qualquer gota de sangue de inovação.

Sua startup de delivery está indo bem? O Uber aparece. Criou um app revolucionário de fotos? O Instagram copia. Inventou uma nova forma de pagamento? A Apple já está desenvolvendo algo similar. É o capitalismo de plataforma em sua forma mais darwiniana.

Então, acabou o Oceano Azul?

Não necessariamente. A ideia continua útil para enxergar oportunidades onde ninguém olha — em nichos específicos, mercados emergentes ou setores tradicionais que ficaram parados no tempo. O Magazine Luiza reinventou o varejo tradicional, misturando lojas físicas com e-commerce de forma pioneira. A marca de roupas Patagonia criou seu oceano ao posicionar sustentabilidade como luxo. O Spotify não inventou música digital, mas criou um modelo de assinatura que matou a pirataria e os CDs de uma vez.

Mas é ingenuidade — ou má-fé intelectual — pensar no Oceano Azul como um mar calmo e permanente. O mais sensato, hoje, é tratá-lo como um momento, não como destino final. É aproveitar a calmaria enquanto constrói motores para navegar quando a maré mudar.

A pergunta que realmente importa em 2025

Cansei de ouvir empreendedores perguntando “como criar um oceano azul?” como se fosse uma receita de bolo. A pergunta mudou. Hoje é: “como construir capacidade de reinvenção contínua?”

Porque 2025 nos ensinou que oceanos azuis são temporários por natureza — e isso não é necessariamente ruim. A convergência tecnológica acelerou ainda mais a cópia de modelos. IA generativa, automação e plataformas no-code democratizaram a inovação. Uma startup consegue replicar, em semanas, o que antes levava anos para desenvolver.

O empreendedor esperto de 2025 não procura um oceano azul eterno. Ele constrói um portfólio de mini-oceanos — inovações menores, mais ágeis, que pode pivotar rapidamente quando a concorrência chegar. É como ter várias embarcações pequenas em vez de um transatlântico: mais manobrável, menos risco de naufrágio catastrófico.

A Netflix exemplifica isso perfeitamente: começou com DVDs por correio, migrou para streaming, depois para produção original e agora explora jogos e publicidade. Cada movimento foi um novo oceano azul antes que o anterior secasse completamente.

Sustentabilidade virou pré-requisito, não diferencial. Empresas que ainda pensam em ESG como “nice to have” já nasceram defasadas. Comunidades batem algoritmos — grupos no WhatsApp, comunidades no Reddit e até lives no Instagram estão criando tribos que influenciam mais que influenciadores tradicionais. Quem conseguir construir comunidades genuínas — não apenas seguidores — terá oceanos azuis mais duradouros.

O segredo não está mais em encontrar águas vazias, mas em desenvolver músculos de adaptação que o mantenham sempre surfando a próxima onda.

Porque, no mundo de 2025, a única constante é que seu oceano azul de hoje será o vermelho de alguém amanhã — e talvez essa seja exatamente a beleza do jogo.

* Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.