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Ben Norton

Jornalista independente e editor do Geopolitical Economy Report

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Ocidente está politicamente fora de contato com o resto do mundo, admite estudo da União Europeia

Estudo financiado pelo Conselho de Relações Exteriores da União Europeia revela que o Ocidente está politicamente fora de contato com o Sul Global

(Foto: Reprodução)
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Artigo de Ben Norton publicado originalmente no Geopolitical Economy Report em 26/2/23. Traduzido e adaptado por Rubens Turkienicz com exclusividade para o Brasil 247

Um estudo feito por um think-tank de elite financiado pelo governo europeu descobriu que, enquanto os EUA e a Europa estão se aproximando mais, o Ocidente está cada vez mais politicamente fora de contato com o resto do mundo.

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O relatório do Conselho Europeu de Relações Exteriores, financiado pelos membros da União Europeia (EU), admitiu que o sistema de “supremacia globa estadunidense” está em rápido declínio e muitas pessoas no Sul Global querem um novo “mundo multipolar”.

A série de enquetes concluiu que a guerra por procuração da OTAN na Ucrânia confirmou a renovada centralidade do poder dos EUA para a Europa”, unindo o Ocidente sob a liderança de Washington. Atualmente, os europeus e os estadunidenses “têm muitas visões em comum sobre as principais questões globais”.

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Porém, esta “consolidação do Ocidente está ocorrendo num mundo pós-Ocidental cada vez mais dividido”, reconhece o estudo. O Sul Global está se movendo na direção oposta.

O estudo descreve “um amplo hiato entre o Ocidente e o ‘resto’ no que concerne aos seus desejados resultados para a guerra e entendimentos diferentes sobre como os EUA e a Europa apoiam a Ucrânia”.

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O relatório admite que, mesmo se a Ucrânia de alguma forma consiga vencer a guerra por procuração com a Rússia, “é altamente improvável que ela restaure a ordem liberal global liderada pelos EUA”; ao invés disso, “o Ocidente terá que viver como um polo de um mundo multipolar”.

Os 13% da população global no Ocidente estão fora de contato com o ‘resto’ do mundo 

Este estudo foi realizado pelo Conselho Europeu de Relações Exteriores (ECFR — European Council on Foreign Relations), um think-thank notoriamente belicista que expressa um viés abertamente anti-Rússia e anti-China.

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O ECFR é financiado pelo Parlamento Europeu e vários governos europeus — incluindo a Alemanha, a França, a Itália, a Espanha, a Bélgica, a Irlanda, a Noruega, a Dinamarca, a Finlândia e a República Tcheca, bem como o aliado-chave Japão.

Para este relatório, a ECFR comissionou enquetes na:

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  • China
  • Índia
  • Turquia
  • Rússia
  • EUA
  • Reino Unido

Ele também pesquisou pessoas em nove importantes estados-membros da União Europeia, aos quais ele se refere coletivamente como os EU9:

  • Dinamarca
  • Estônia
  • França
  • Alemanha
  • Itália
  • Polônia
  • Portugal
  • Romênia
  • Espanha

Os pesquisadores entrevistaram um total de 19.765 adultos entre o final de dezembro de 2022 e o início de janeiro de 2023.

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A amostra de participantes no Ocidente foi representativa da população em geral. Mas o estudo descobriu que na China, na Índia e na Rússia, as pessoas pesquisadas só vinham de grandes cidades, o que significa que os resultados não refletem as visões daqueles que vivem em áreas rurais.

O estudo sofre de vieses. Esta inclinação ficou clara quando o relatório se referia, repetida e enganosamente, à guerra por procuração da OTAN contra a Rússia na Ucrânia facilmente como “a guerra de Putin” e “a agressão russa”. Como se o Ocidente não tivesse desempenhado um papel fundamental em começar o conflito ao patrocinar um violento golpe de Estado em Kiev em 2014, violando repetidamente as promessas de não expandir a OTAN para o leste após a reunificação da Alemanha em 1990; sabotando os acordos de Minsk e as conversações de paz; e ignorando o pedido de garantias de segurança de Moscou em 2021.

Porém, apesar das muitas falhas do estudo da ECFR, os seus resultados transmitem uma mensagem inequívoca: o Ocidente está fora de contato com o resto do mundo.

O relatório reconhece isto ao escolher como o seu título: “Ocidente Unido, separado do resto”.

As nações ocidentais pesquisadas no estudo têm uma população combinada de cerca de 1 bilhão de pessoas — aproximadamente 13% da população global de 8 bilhões.

Esta é uma mera fração das populações da China (1,41 bilhão), da Índia (1,39 bilhão), da Rússia (142 milhões) e da Turquia (83 milhões).

Juntos, estes últimos países têm uma população de um pouco mais de 3 bilhões de pessoas — consistindo de cerca de 38% da população global.

As enquetes da ECFR mostram quão significativamente a opinião pública dos 13% no Ocidente diferem daquela das potências eurasianas. 

A visão do Ocidente sobre a guerra na Ucrânia não é compartilhada pelo resto do mundo

No seu relatório, o Conselho Europeu de Relações Exteriores declara que a guerra por procuração “na Ucrânia marca tanto a consolidação do Ocidente como a emergência de uma longamente anunciada ordem internacional pós-Ocidental”.

“Muitos na China declaram que o apoio estadunidense e europeu à Ucrânia é motivado pelo desejo de proteger a dominação ocidental”, reconhece o estudo.

E para a vasta maioria dos chineses e dos turcos, o apoio ocidental à Ucrânia é motivado por razões diferentes de uma defesa da integridade territorial da Ucrânia, ou da sua democracia”, acrescenta o estudo.

45% das pessoas pesquisadas na China, 38% na Rússia, 30% na Turquia e 23% na Índia disseram que os EUA apoiam a Ucrânia simplesmente para “defender a dominação ocidental”.

quadro
O que você pensa que é a principal razão do apoio dos EUA à Ucrânia? Em porcentagens, da esquerda para a direita: para defender a integridade territorial da Ucrânia, para defender a Ucrânia como uma democracia, para defender a dominação ocidental, para defender a sua própria segurança.

A pluralidade destas nações eurasianas pensa o mesmo sobre Bruxelas.

40% das pessoas pesquisadas na China, 46% na Rússia, 27% na Turquia e 23% na Índia disseram que a Europa está apoiando a Ucrânia afim de “defender a dominação ocidental”.

quadro
O que você pensa que seja a principal razão para a Europa apoiar a Ucrânia? Em porcentagens, da esquerda para a direita: para defender a integridade territorial da Ucrânia, para defender a Ucrânia como uma democracia, para defender a dominação ocidental, para defender a sua própria segurança.

O relatório reconhece que “as pessoas dos países não-ocidentais têm uma clara preferência de que a guerra termine agora — mesmo se isto signifique ter que desistir de territórios.”

54% das pessoas pesquisadas na Índia, 48% na Turquia, 44% na Rússia e 42% na China pensam que “o conflito entre Rússia e a Ucrânia precisa ser parado quanto antes possível, mesmo se isto signifique que a Ucrânia dê o controle de áreas para a Rússia”.

Adicionais 12% das pessoas na Índia, 8% na Turquia, 29% na Rússia e 12% na China disseram que “a dominação ocidental do mundo precisa ser empurrada para trás, mesmo se isto signifique aceitar a agressão territorial da Rússia contra a Ucrânia”.

quadro
Qual destas opções refletem melhor a sua visão? Em porcentagem, da esquerda para a direita: O conflito entre a Rússia e a Ucrânia precisa ser parado, mesmo se isto signifique que a Ucrânia ceda o controle de áreas à Rússia; a dominação ocidental do mundo necessita ser empurrada para trás, mesmo se isto signifique aceitar a agressão territorial russa contra a Ucrânia; a Ucrânia precisa retomar todo o seu território, mesmo que isto signifique ter uma guerra mais longa ou mais ucranianos mortos, ou desalojados. Texto na parte de baixo do quadro: O restante dos pesquisados responderam “Nenhuma das opções acima”, “Não sei”, ou não responderam à pergunta.

Enquanto a maioria das pessoas nos EUA, no Reino Unido e na Europa consideram que a Rússia é um “adversário com quem estamos em conflito”, a situação é o oposto na Índia, na China e na Turquia.

80% das pessoas pesquisadas na Índia veem a Rússia como um aliado ou um parceiro (51% como um “aliado que compartilha os nossos interesses e valores” e 29% como um “parceiro necessário com quem nós temos que cooperar estrategicamente”).

Na China, 79% das pessoas pesquisadas veem a Rússia como uma aliada ou parceira (35% como uma aliada e 44% como uma parceira necessária). 

Na Turquia, 69% das pessoas pesquisadas veem a Rússia como uma aliada ou parceira (14% como uma aliada e 55% como uma parceira necessária).

quadro
Qual destas opções reflete melhor a sua visão sobre o que a Rússia é para o seu país? Em porcentagens, opções, de cima para baixo: como uma aliada — que compartilha os nossos interesses e valores; como uma parceira necessária — com quem devemos cooperar estrategicamente; como uma rival — com quem precisamos competir; como uma adversária — com quem estamos em conflito; Não sei.

Outra pergunta na pesquisa mostra como as mídias de propaganda ocidentais manipulou a opinião pública.

A guerra por procuração na Ucrânia fez a Rússia parecer mais forte na Índia, na Turquia, na China e no próprio país, enquanto as pessoas em todo o Ocidente, agora veem Moscou como sendo mais fraca.

Este é outro exemplo de onde as visões ocidentais são o exato oposto daquelas no Sul Global.

quadro
O atual conflito entre a Rússia e a Ucrânia faz você pensar sobre a Rússia como sendo mais forte ou mais fraca do que você pensava anteriormente? Em porcentagem, da esquerda para a direita, de cima para baixo: Muito ou um pouco mais forte / Era e ainda é forte / Não sei/Não respondeu / Era e ainda é fraca / Muito ou algo mais fraca.

O relatório do ECFR admitiu que, enquanto “o presidente Joe Biden enquadrou a guerra na Ucrânia como uma luta entre a democracia e o autoritarismo”, esta não é a maneira como o Sul Global a vê.

Os pesquisadores perguntaram aos participantes qual país eles consideram que “chega mais perto de ter uma democracia verdadeira”. Esta pergunta refletiu o viés do estudo, tornando a pesquisa em uma competição para ver qual país é supostamente mais democrático.

No entanto, apesar disso, mais de três-quartos das pessoas pesquisadas na China (77%) consideraram que o seu país “chega mais perto de ter uma democracia verdadeira”, juntamente com 57% dos participantes na Índia.

Um estudo separado, conduzido em 2022 por outra organização apoiada por governos ocidentais, a Alliance of Democracies Foundation, ligada à OTAN, descobriu que 83% das pessoas na China consideram o seu governo como uma democracia, e 91% disseram que eles valorizam a democracia como sendo importante. (Nos EUA, por outro lado, apenas 49% das pessoas disseram que o seu governo é uma democracia).

quadro
Qual dos seguintes países chega perto de ter uma democracia verdadeira? Em porcentagens, da esquerda para a direita: O seu próprio país / França / Grã-Bretanha / EUA / Outras respostas / Nenhuma das propostas ou Não sabe. Texto em baixo: As respostas disponíveis incluíram: (a) os EUA, (b) China, (c) Índia, (d) Turquia, (e) Rússia, (f) França, (g) Grã-Bretanha, (h) Nenhuma das acima ou Sem resposta.

O estudo também reconheceu que “a maioria das pessoas nos principais países não-ocidentais — como a China, a Índia, a Turquia e a Rússia — preveem que o Ocidente logo será apenas um polo global dentre muitos. O Ocidente ainda pode ser a parte mais forte, porém não será hegemônico”.

Uma pluralidade de pessoas pesquisadas na China (30%) e na Rússia (33%) pensam que o mundo será cada vez mais multipolar.

Isto está em contraste gritante à pluralidade daqueles pesquisados na Grã-Bretanha (29%), na União Europeia (28%), nos EUA (26%), que veem o mundo retornando a um sistema bipolar de guerra fria entre um bloco liderado pelos EUA e um bloco liderado pela China.

quadro
Dentro de dez anos, o que será mais provável dentre as seguintes opções? Em porcentagem, da primeira coluna à esquerda, de cima para baixo: Uma distribuição mais parelha de poder entre múltiplos países / uma divisão de poder global entre dois blocos rivais, cada um liderado pelos EUA e pela China / dominação global dos EUA / dominação global da China / dominação global de um outro país (não os EUA, nem a China) / nenhuma destas / não sabe / não respondeu.

O ECFR escreveu:

Agora o Ocidente pode estar mais consolidado, porém não é necessariamente mais influente na política global. O paradoxo é que esta recém-descoberta unidade coincide com a emergência de um mundo pós-ocidental. O Ocidente não se desintegrou, mas a sua consolidação chegou num momento em que outras potências não farão simplesmente aquilo que ele deseja.

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