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Gustavo Conde

Gustavo Conde é linguista.

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Onde está a rebeldia do povo brasileiro?

O linguista Gustavo Conde co-enuncia a pergunta-senha de Lula e questiona pelo que ainda estamos esperando: "em sua última entrevista, Lula perguntou aonde está a rebeldia do povo brasileiro. É uma senha e tanto. Excesso de bom comportamento, caras pálidas, mata (...) É por isso que Lula ainda está preso e é por isso que essa prisão política se arrasta como uma tortura de fios elétricos enterrados na carne de um país inteiro"

Foto: Francisco Proner Ramos (Foto: Francisco Van Steen Proner Ramos)
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De 1984 a 2002 foram 18 anos. Foi esse o tempo preciso para que a população brasileira saísse da ditadura e escolhesse seu destino dentro da democracia e da soberania popular. 

Desde a campanha das diretas, passando pelas três derrotas de Lula e, finalmente, chegando na vitória de um partido genuinamente popular, com base social real, o Brasil amargou uma longa travessia até entender o que de fato estava em jogo com relação ao seu futuro e às suas potencialidades. 

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Sarney, Collor, Itamar e FHC foram uma imensa e dolorosa ‘pinguela’, com seus planos econômicos excludentes, improvisados e falsamente conciliatórios. Foram 18 anos de profunda incompetência, subserviência, pobreza, estagnação e sucateamento – isso não é retórica, basta ver as estatísticas do período. 

O plano real, untado por tecnocratas e bajuladores da coroa como elemento de redenção econômica estrutural – tem até filme B sobre ele – foi um misto de remendo mal feito e oportunismo ‘contrastivo’ – sic. 

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Contrastivo, porque depois de décadas de hiperinflação, em que nenhum economista digno do nome conseguiu fazer a lição de casa e articular o grau básico de uma economia – que é estabelecer uma ‘unidade monetária’ para o país – a criação de uma moeda foi apenas isso: lição de casa. 

Como sói acontecer nas hostes narcísicas tucanas, fizeram um estardalhaço de marketing com o maldito plano, acreditando que ele serviria para reeleger o PSDB até o apocalipse. 

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Em São Paulo, estado politicamente mais atrasado do país, a tese colou – porque aqui tucanos são reeleitos como em uma mini ditadura. No Brasil real, verdadeiro e imenso, a fraude foi descoberta na compra da reeleição e na desvalorização cambial de 1999, verdadeiro estelionato eleitoral que jogou FHC ao seu lugar de direito: a sarjeta da história.  

Em um país em que nenhum governante fez a lição de casa, quem a cumpre vira rei. Ou: em terra de cego, quem tem um olho acaba levando a fama de enxergar alguma coisa.  

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O nível rasteiro da nossa política econômica só foi rompido com a chegada real da democracia, em 2003, já que a redemocratização não pode ser fulanizada pelas datas festivas chanceladas por nossa historiografia de cativeiro: o que aconteceu em 1985, 1989, 1994 e 1998 foram socos seguidos em nosso desejo por soberania e democracia. 

O que houve nessa pinguela famigerada foi o prolongamento da ditadura, pois a ditadura brasileira não foi apenas uma ditadura militar, como já dito: foi uma ditadura civil-empresarial-midiático-militar. 

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O componente retirado desse sintagma monstruoso foi apenas o elemento ‘militar’. A ditadura civil-midiático-empresarial seguiu, livre, leve e solta, com a censura de sempre, a tortura de sempre e os assassinatos de sempre, tudo muito bem alinhavado com o Grupo Globo e com o PSDB. 

Essa ditadura só ruiu, de fato, em 2003 e o dado que chancela essa leitura é emblemático: em 3 meses de governo Lula, a desigualdade social havia regredido 11%. 

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O que vemos agora é uma transição de volta ao estado natural das coisas para a nossa elite egoísta, burra, violenta e antipovo: um golpe aplicado pelo PSDB, com o auxílio de Michel Temer e Eduardo Cunha, próceres dessa elite assassina, seguido da eleição do fascismo – que, às vezes, chega ao poder através de eleições, miseravelmente. 

Ou seja: voltamos ao estado de coisas pré 2003 e pré 1985: uma ditadura civil-midiático-empresarial-militar. 

Bolsonaro foi expulso do exército, mas ele é o mais general de todos os generais brasileiros, se se considerar a psicologia decrépita dos presidentes boçais da ditadura. 

Bolsonaro é a soma de Castello Branco, Costa e Silva, Médici, Geisel e Figueiredo, com sua burrice latente, seu instinto assassino recorrente e sua compulsão à mentira. 

Bolsonaro é o retorno da ditadura em seu estado máximo de ânimos e bestialidades. Nem toda MPB do mundo poderia descrever o terror embutido e encarnado nessa abominação inumana cujo nome de batismo assusta e ofende. 

É por isso que Lula ainda está preso e é por isso que essa prisão política se arrasta como uma tortura de fios elétricos enterrados na carne de um país inteiro. 

Dilma Rousseff, torturada e presa pelo terrorismo assassino de estado de outrora – que volta ainda mais forte hoje, torturando a Amazônia, o litoral nordestino, os indígenas, as mulheres, os pobres, pretos, gays, crianças e idosos – sabe muito bem o que esperar desse sufocamento golpista intermitente. Ela diz que não ficará pedra sobre pedra.  

Essa pedra de Dilma não é um pedregulho bem comportado, à espera de um chute poético deferido por um transeunte solitário e idealista. Essa pedra é uma pedra de sangue, é a pedra no meio do caminho do fascismo e do mercado financeiro. 

Há um pudor muito grande no Brasil quando se fala em ‘sangue’. Nossa elite covarde tem pânico do sangue. Ele faz sangrar assepticamente o povo à distância, mas tem medo de sentir o sangue desse povo escorrendo pelos seus antebraços. É mais um dispositivo de poder discursivo disponibilizado em nossa história antidemocrática: tudo, menos sangue.  

E assim, cumprem-se 500 anos de dominação. Sangue? Só para reestabelecer a lei e a ordem, aliás, protocolo que será intensificado nas próximas semanas, quando o Brasil explodir, como o Chile. 

Não se irá combater uma nova ditadura 4.0 civil-midiático-empresarial-militar com a crença no poder judiciário, na opinião pública, no bom senso das autoridades e nas instituições. 

O que se costuma esquecer nessas hostes do bom comportamento sociológico é que a língua é uma instituição e, consequentemente, o povo é uma instituição – a mais importante de todas. 

É preciso respeitar a instituição Povo. E para que isso aconteça, é preciso que o povo se respeite a si mesmo. 

Em sua última entrevista, Lula perguntou aonde está a rebeldia do povo brasileiro. 

É uma senha e tanto. Excesso de bom comportamento, caras pálidas, mata. 

Excesso de idolatria também mata. É hora de o povo ser mais uma vez protagonista da história deste país, assim como foi em 2002, dando um banho de democracia e soberania e elegendo a si mesmo como governo, num processo sem precedentes de empoderamento popular real – e sem volta, como muitos de nós ainda insistimos em acreditar. 

Mais do que isso: no processo de redemocratização real que foi a eleição de Lula em 2002, o resultado foi espetacular. Emprego, salário, direitos, avanços, crescimento, soberania e felicidade real, aferida por institutos de pesquisa. 

Lula livre, sim. Mas povo livre e soberano, também. Livre para tomar as ruas, livre para dizer o que pensa, livre para construir democraticamente um país, sem medo da responsabilidade que é lutar contra uma elite violenta e vingativa. 

O fulcro desta complexa bifurcação histórica tem muitas metáforas latentes e poderosas. Pedir a liberdade de Lula é pedir a liberdade do povo. É essa lição que a história está tentando nos ensinar há 566 dias.  

Assista a Live do Conde: 

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