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Fernando Horta

Fernando Horta é historiador

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Os três Dino’s

"Na figura de Dino, hoje, convivem três “pessoas” com formações e objetivos diferentes", avalia

O diretor-geral da Polícia Federal, Andrei Passos, e o ministro da Justiça e Segurança Pública, Flávio Dino (Foto: Tom Costa/MJSP)
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Flávio Dino é um sujeito admirável. Já digo de antemão que ele (e em certa medida o Ricardo Capelli) são os fiadores da democracia brasileira neste momento. O papel que Alexandre de Moraes cumpriu durante o período eleitora, hoje, Dino assume também. O episódio do 8 de janeiro criou um presidenciável. A fraqueza política de Flávio Dino era seu relativo insulamento, sendo conhecido no nordeste e pouco em nível nacional. Em uma semana de governo, a direita deu de presente à esquerda mais um nome presidenciável sanando a falta de conhecimento que o restante do país tinha das qualidades de Flávio Dino.

Tenho acompanhado todas as declarações do ministro e confesso que me angustia muito ver a angústia de Flávio Dino tentando conter Flávio Dino e, por vezes, Flávio Dino discordando de Flávio Dino. Me explico:

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Na figura de Dino, hoje, convivem três “pessoas” com formações e objetivos diferentes. Por um lado há o militante comunista Flávio Dino que se arrepia com as coisas do mundo e tem um senso de justiça tão aguçado quanto sua capacidade de análise pragmática da política. Para esse “Dino”, é evidente que o golpe teve sucesso, eis que quebrou a simbologia dos poderes de Brasília e é ainda mais evidente que teve ajuda interna das forças armadas e talvez até de ministros do governo Lula. Esse primeiro Dino treme de raiva ao falar do 8 de janeiro e, por vezes, toma a palavra nos discursos do ministro, levantando a voz e chegando a quase denunciar a conspirata interna que induziram Dino e Lula a um erro de cálculo político.

Há, também, um segundo Dino juiz. Juiz de Direito que se esforça na análise pessoal e desapaixonada dos fatos, buscando a “verdade real” das coisas e se submetendo à tirania da comprovação empírica ou, ao menos, do corpo indiciário robusto. Esse Dino, que se formou em anos de prática jurisdicional, sabe que só pode formar juízos após as investigações transformarem o sentimento em relações de causa e consequência comprováveis. O Dino-juiz está toda hora moderando o Dino militante e exigindo sobriedade e cuidado hermenêutico na utilização das palavras. É normalmente o primeiro Dino que fala, tem demonstrado erudição, cuidado e até certa doçura ao falar das coisas do golpe. O Dino-juiz, contudo, é acusado de ser “soft” pelo Dino militante e esse conflito fica evidente nas falas do ministro.

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O terceiro Dino é o ministro de Estado do Governo Lula. Este Dino sabe que precisa olhar os fatos a partir de um ponto de vista mais amplo, buscando os caminhos possíveis de governabilidade. Nesse sentido, se é preciso fazer calar a paixão do militante ou o sentido de justiça do juiz, o Dino ministro assim o faz. Elogiando desafetos no governo, empenhando confiança e lealdade a instituições que no próprio dia oito lhe morderam a mão, esse outro Dino ainda ensaia seus passos nesse circuito de “alta política” cujo objetivo está mais voltado ao futuro do que ao presente. O Dino ministro normalmente faz calar os outros dois e, embora não consiga disfarçar totalmente seu desconforto, tem trabalhado para fortalecer a estrutura político-institucional montada por Lula. Ainda que não concorde totalmente com ela.

Esses três Dinos não convivem harmoniosamente em Flávio Dino. O fazem aos solavancos. Dino trepida sua voz e se exaspera quando o militante toma a frente, aquieta-se e invoca princípios jurídicos quando o juiz exige temperança, e ameniza culpas, responsabilidades e comportamentos quando o ministro força o pensar estratégico-político de longo prazo. É divertido ver as alterações de tom nos discursos improvisados de Flávio Dino. É quase fisicamente perceptível as diferenças dos três Dino’s. O tom de voz, a exasperação da forma como projeta o corpo e os braços e mesmo o tom condescendente (meio à contragosto) dão conta desta alteridade toda.

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Confesso que não sei de qual dos Dino’s o Brasil hoje precisa mais. Como militante, rogo que o Dino sanguíneo e utópico prevaleça. Como historiador fico encantado pela forma metodológica que o juiz Dino cata na realidade as evidências (ou a falta delas) para moderar o seu discurso e como analista político entendo o Dino ministro. A sobrevivência do governo é imperiosa, mas que Dino não perca sua verve. Talvez um dia venhamos a agradecer por termos um ministro 3 e 1.

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