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Roberto Ponciano

Escritor, mestre em Filosofia e Letras, especialista em Economia. Doutorando em Literatura Comparada

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Ouro de tolo: Lehman, Textor e a fraude aos credores

(Foto: Reuters)
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Lehman produziu a maior fraude fiscal, bancária e financeira da história brasileira. Avaliada inicialmente em 40 bilhões, o rombo pode ser muito maior. Só um fundo de pensão de servidores públicos (outra leda ilusão, a substituição da aposentadoria pública por fundos de pensão) perdeu, na roubalheira de Lehman, Sicupira e quejandos, 11 bilhões de reais. Até ontem Lehman era festejado como o menino de ouro do capitalismo brasileiro, o mágico capaz de fazer brotar ouro em pedra, de investir startups a partir do nada, de fazer brotar ouro do chão. Hoje caiu em desgraça e agora é sinônimo de desonestidade, há uma corrida do “salve-se” quem puder pelo botim do que restou, após o ataque especulativo dele, em que concorrem bancos, governo, trabalhadores.

Mas o assunto não é Lehman, é novamente a tal “mágica” SAF. O novo ouro de tolo. Walter Benjamin dizia que o capitalismo é uma religião, uma crença, para funcionar necessitamos que acreditemos nele. O que eu vejo de gente, inclusive de esquerda, defendendo as tais SAFs como “soluções mágicas” para o futebol brasileiro me faz doer o estômago. Sou marxista demais para acreditar nesta mitificação do capitalismo e nas mistificações que ela carrega. Sim, clubes de futebol são empresas, de um outro tipo, mas são. Sim, necessitam faturar para sobreviver, mas não, um bando de aventureiros obscuros (como, por exemplo, o trumpista e ultraconservador John Textor) não são a solução para nada. São apenas apostadores que querem lucrar no chamado capitalismo cassino.

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O capitalismo é uma crença e que vive de novos ritos. Até ontem Lehman era sinônimo de perfeição e de funcionamento harmônico de um sistema que só não funcionaria melhor por culpa de uma pseudo burocracia, de um Estado malvado, dos seus entraves burocráticos e de seu excesso de impostos. Na fundação Lehman, uma juventude dourada de novas lideranças (incluindo Alessandro Molon) pontuam, defendendo as ideias desta tal capitalismo sustentável. Todo sistema de crenças se baseia apenas e tão somente em que não creiamos mais no mundo real. O capitalismo pressupões a burocracia e os tais (mal)ditos empresários são contra pagar impostos mas vivem o tempo inteiro do financiamento continuado do Estado e, agora, para sanar o prejuízo do seu crime financeiro, o antes ultraneoliberal Jorge Paulo Lehman defende escancaradamente a ajuda estatal a suas empresas.

Assim também são as SAFs. De uma hora para outra o futebol brasileiro será salvo se for vendido, a preço de banana, para grupos de obscuros empresários estrangeiros que poderão reduzir cada clube a exportador de pés de obra baratos a serem vendidos em mercados mais rentáveis. Para isto, cria-se uma lei de recuperação dos clubes em que condições de refinanciamento de dívidas de clubes insolventes são criadas apenas e tão somente se estes clubes sejam alienados para este mesmo grupo de obscuros milionários, saudados como salvadores da pátria (lembrei-me imediatamente da novela Roque Santeiro). No dia que John Textor (vulgo Jontex) assumiu o Glorioso um jornalista serviçal e idiota ultrapassou todos os limites do viralatismo ao comparar a entrega do clube à Revolução Francesa e a tomada da bastilha. Seria com se os sans cullotes tivessem feito a Revolução para que a Monarquia pudesse governar a França sem entraves e a Bastilha fosse tomada para se manter o regime feudal.

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A declaração recente de Jontex, defendendo o calote fiscal, foi defendida com unhas e dentes, e em uníssono, por jornalistas esportivos (que defendem a SAF como o novo Eldorado) e “especialistas em investimento”, porque no fundo nosso sentimento de viralatismo nos massacra. Senti-me num filme de John Wayne, no qual o civilizado caubói matador de índios chega aqui no Brasil para por ordem nesta bagaça. Na mágica SAF, as dívidas não podem sumir, porque senão, simplesmente, a SAF seria uma ilegalidade criada para dar um viés legal à fraude contra credores. O Regime Centralizado de Execuções é um privilégio que a SAF tem para quitar com um prazo maior suas dívidas para com o Estado. Agora, que este John Wayne trumpista ache que a SAF é um vale tudo para ele se apropriar do patrimônio do Botafogo sem necessitar prestar contas das dívidas antigas é algo completamente imoral. Jontex reclama de que tem que pagar as dívidas do clube que ele comprou.

No mágico capitalismo brasileiro privatizações foram feitas com o patrimônio público vendido a preço de banana e as dívidas ficando com o Estado, como, por exemplo, o Banerj, e ainda com dinheiro público. A forma como a SAF começa a ser tratada pela imprensa vira-lata tupiniquim nos lembra bem isto. Em nome da “salvação” dos clubes tem jornalista simplesmente defendendo a fala criminoso de Jontex dizendo que não vai pagar dívidas e que vai ignorar execuções, sendo que a pré-condição contratual da propalada SAF era exatamente pagar estas dívidas.

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De um lado jornalistas com sentimento de viralatismo indômito fazem malabarismo teórico para defender a “solução SAF”, de outro, torcedores desesperados por títulos compram o outro de tolo como se fosse uma salvação. Eu escrevi que em 10 anos o fosso da SAF no futebol brasileiro pode ser tão grande que necessitaremos de uma nova mágica para salvar os clubes das SAFs. Não há almoço grátis, não há solução mágica. 700 milhões de reais divididos em parcelas anuais para comprar clubes como Vasco, Botafogo ou Cruzeiro são pagos com as rendas dos próprios clubes!

É a famosa roupa nova do imperador e eu acuso: “o rei está nu”! Jontex reclama porque ele quer pagar ao Botafogo com o dinheiro do próprio Botafogo, ele precisa parar de pagar as dívidas para recuperar seu “investimento”. Esta aventura da SAF me faz lembrar muito a frase do bispo Desmond Tutu sobre a Áfríca do Sul. “Eles vieram e trouxeram a bíblia, pediram que nós fechássemos os olhos e orássemos, ao abrir, nós tínhamos a bíblia, e eles a terra”. Na mágica contabilidade da SAF os investidores pagam o investimento com dinheiro do próprio clube tendo condições únicas para “quitar as dívidas”. E não faz nem um segundo que aportaram aqui nas terras tupiniquins trazendo seus espelhos e badulaques e, é óbvio, já não querem mais pagar as dívidas.

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A SAF só é uma “solução mágica” porque nosso viralatismo e nossa crença num “capitalismo mágico” (como era até ontem o de Jorge Paulo Lehman, o plantador de startups) nos faz crer que D gera D’. Não existe almoço grátis e nem solução mágica, a tal palavra “modernidade” tem mais de duzentos anos e serve apenas de engodo para mistificar e mitificar relações capitalistas que devem ser desnudadas e mostradas como são.

A SAF é só a entrega dos clubes de futebol e aventureiros estrangeiros cujo objetivo único é o lucro. Não demorou nem 2 segundos para John Wayne ameaçar calote e nos chamar de “aborígenes”. Mas tem gente que vai festejá-lo, porque o sentimento de viralatismo parece mesmo algo inato à alma nacional.

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