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Para que prova se tenho convicção?

No julgamento do ex-ministro Chefe da Casa Civil José Dirceu pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4) chama atenção o aumento despropositado da pena de prisão de 20 anos e dez meses – fixada pelo juiz Federal Sérgio Moro – para 30 anos, nove meses e dez dias de reclusão; de igual modo, para justificar a falta de provas em processo contra o ex-presidente Lula, Deltan Dallagnol e seus asseclas disseram que os crimes perpetrados por Lula e demais acusados são de difícil prova, afirmando que isso seria fruto da profissionalização de suas práticas, condenando, assim, sem provas

Ex-ministro José Dirceu deixa a sede da Polícia Federal em Brasília em direção a Curitiba (Marcello Casal Jr/Agência Brasil) (Foto: Leonardo Yarochewsky)
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No julgamento do ex-ministro Chefe da Casa Civil José Dirceu de Oliveira e Silva pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4) chama atenção o aumento despropositado e absurdo da pena de prisão de 20 anos e dez meses – fixada pelo juiz Federal Sérgio Moro – para 30 anos, nove meses e dez dias de reclusão, bem como o fundamento apresentado pelo desembargador relator João Paulo Gebran Neto que além de fixar a descomunal pena de 41 anos para José Dirceu, referindo-se ao crime de corrupção, sustentou que: “Embora nesses casos dificilmente haja provas das vantagens indevidas, adoto a teoria do exame das provas acima de dúvida razoável”.

De igual modo, para justificar a falta de provas em processo contra o ex-presidente Lula, Deltan Dallagnol e seus asseclas disseram que os crimes perpetrados por Lula e demais acusados são de difícil prova, porém afirmam que isso não é apenas fruto do acaso, mas sim da profissionalização de suas práticas e de cuidados deliberadamente empregados pelos réus.

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Em seu opúsculo sobre “as lógicas das provas no processo” o procurador da República que ficou nacionalmente conhecido à custa de suas exibições, inclusive em templos religiosos, justifica a “atenuação da rigidez da valoração da prova” quando, segundo o autor, tratar-se de crime “cuja prova é difícil”. Em nome da “dificuldade probatória em crimes complexos”, Deltan Martinazzo Dallagnol[1] propõe na esteira de Sérgio Fernando Moro, a “criação de regras probatórias compatíveis com as dificuldades”, ou seja, “maior elasticidade na valoração probatória”.

O que o procurador da República propõe, na verdade, é uma relativização da prova ou uma inversão dos princípios limitadores do poder punitivista estatal. Os idealizadores da absurda proposta atropelam o sagrado princípio de que se não há prova suficiente para condenação deve o acusado ser absolvido, princípio que se revela no conhecido aforismo jurídico: “In Dubio Pro Reo”, corolário do princípio da presunção de inocência.

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Pelo visto, notadamente, em relação à teratológica decisão que condenou José Dirceu, o procurador da República da “Lava Jato” tem feito escola e o que antes era inadmissível – condenação sem prova – hoje é admitido em nome da “dificuldade probatória”.

Sombrio os tempos em que a prova – certeza da autoria e da materialidade do crime – é desprezada em nome do eficientismo e da lógica perversa de que “os fins justificam os meios”.

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Os magistrados precisam compreender, na esteira de Geraldo Prado, que “as garantias do processo penal são, relativamente às liberdades públicas afetadas pela persecução penal, garantias materiais dos direitos fundamentais”.[2] Mais adiante, o sempre lúcido processualista, afirma que: “O processo penal, pois, não deve traduzir mera cerimônia protocolar, um simples ritual que antecede a imposição do castigo previamente definido pelas forças políticas, incluindo-se nesta categoria os integrantes do Poder Judiciário”. [3]

Em sua instigante obra “Guia Compacto do Processo Penal conforme a Teoria dos Jogos” Alexandre Morais da Rosa acentua que: “A história do constitucionalismo é a progressiva ampliação da esfera pública de direitos, de conquistas e rupturas”. Assim sendo, em uma concepção garantista, a Constituição “deixa de ser meramente normativa (formal), buscando resgatar o seu próprio conteúdo formador, indicativo do modelo de sociedade que se pretende e cujas linhas as práticas jurídicas não podem se afastar, inclusive no âmbito do direito e do processo penal”.[4]

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Michele Taruffo salienta que “a principal função da prova é oferecer ao julgador informação confiável acerca da verdade dos fatos em litígio”. Mais adiante, observa que “a valoração das provas tem por objeto estabelecer a conexão final entre os meios de prova apresentados e a veracidade ou falsidade dos enunciados relativos ao fatos em litígio”.[5]

Segundo ensina Geraldo Prado,

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Provar é atividade de sujeito. Prova-se um fato que tem determinada qualidade, mas se prova por intermédio da atividade dos sujeitos e as Constituições hoje não podem ficar limitadas em sua interpretação, quando se cuida da proibição de provas por meios ilícitos. Também deverão dirigir a atenção à questão a respeito de quem foi o sujeito produtor da prova e o que ocorre quando um sujeito que não poderia produzir atividade probatória a produz, fazendo valer o sistema da ineficácia dos atos jurídicos. [6]

A decisão que condenou o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, assim como a decisão que condenou o ex-ministro Chefe da Casa Civil José Dirceu é coberta por ilegalidade, trata-se de decisão carecedora de prova e que se baseia exclusivamente em palavras levianas e suspeitas de coréus. Ambas as decisões tem como escopo aniquilar o “inimigo político” e satisfazer a opinião publica (da) que goza diante do do espetáculo midiático.

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Referindo-se ao Estado Pós-democrático Rubens Casara observa que:

O distanciamento do valor “verdade”, que nunca era seguramente alcançado por meio da reconstrução histórica que se dava no procedimento penal, mas que servia de norte de atuação desde que respeitados os limites éticos à busca da verdade, desapareceu, e com a preocupação com a verdade esses mesmos limites éticos. O universo do espetáculo é o da ilusão, da aparência de acontecimento capaz de gerar sensações extraordinárias e hiperbólicas.

Na concepção do processo penal democrático e constitucional, a liberdade do acusado, o respeito a sua dignidade, os direitos e garantias fundamentais são valores que se colocam acima de qualquer interesse ou pretensão punitiva estatal. Em hipótese alguma pode o acusado ser tratado como “coisa”, “instrumento” ou “meio”. De tal modo, não se pode perder de vista a formulação kantiana de que o homem é um fim em si mesmo.

Julgadores de piso ou do Supremo precisam entender – se é que não compreendem – que o processo penal é manifestação de poder com estreita relação com a ideologia dominante de cada país. Logo, em países autoritários e fascistas prevalecerá um sistema processual autoritário caracterizado por cerceamento de direitos e inexistência de garantias. Ao contrário, nos sistemas democráticos (democracia material) os direitos e garantias fundamentais assumem status de princípios, independente de estarem ou não expressados na Constituição.

Por tudo, é imperioso ressaltar que somente o sistema acusatório – que privilegia o devido processo legal; a imparcialidade do juiz; a separação entre julgar e acusar; a igualdade entre as partes; o tratamento digno dado ao acusado como pessoa; a publicidade; o contraditório e a ampla defesa – é que tem guarida no processo penal democrático e, consequentemente, no Estado democrático de direito.

(Publicado originalmente no Justificando)

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