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Victor Viana

Jornalista

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Pezão visto por um jornalista da região que o elegeu ou a força da insistência

O atual governador fluminense, Pezão, deu ao PMDB o terceiro mandato consecutivo do partido no estado do Rio de Janeiro, tendo como uma das suas principais bases eleitorais o interior

Governador do Rio de Janeiro, Luiz Fernando Pezão 28/01/2015 REUTERS/Ueslei Marcelino (Foto: Victor Viana)
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Pezão é um sujeito que se fosse um desenho animado poderíamos dizer que foi mal desenhado. Ele parece inacabado. Quando o via pela TV como vice, passava a impressão de todo vice, de ser apenas um abajour. Mas Pezão não era isso, era também um assecla de Cabral. Diferente da maioria dos vices, figuras que estão ali para garantir o espaço do grupo que deu apoio, Pezão era “parceiro”. Quando o vi pela primeira vez de perto foi nas eleições municipais de 2012. Pezão, nesse período como membro do séquito do governador do Rio, esteve na comitiva de Cabral no município praiano de Búzios (uma cidade, de acordo com o IBGE, de apenas 28 mil habitantes, no entanto, um palco iluminado de celebridades, milionários e políticos se refrescando durante todo o ano em suas mais de 20 praias). Eles estavam na cidade acompanhados de políticos da Região, como o ex-presidente da Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj), deputado Paulo Melo (PMDB), morador de Saquarema e hoje esvaziado dos superpoderes de outrora, encurralado na parede pelos Picciani e citado por Leandro Andrade Azevedo (delator revelou que houve pagamento em 2014 por meio de recursos não contabilizados à campanha dele para a Assembleia Legislativa do Rio), e o, na época, deputado suplente Jânio Mendes (PDT), morador de Cabo Frio e candidato a prefeito desta cidade. Todos estavam em Búzios para dar suporte à campanha à reeleição de Mirinho Braga(PDT) para prefeitura de Búzios.

O atual governador fluminense, Pezão, deu ao PMDB o terceiro mandato consecutivo do partido no estado do Rio de Janeiro, tendo como uma das suas principais bases eleitorais o interior. Foi uma grande luta começada já no governo do seu antecessor e amigo, atualmente preso, Sergio Cabral – era preciso vencer a hegemonia interiorana de Garotinho(PP), que apoiava Marcelo Crivela(PR). Naquela tarde em Búzios cachorros grandes do PMDB foram introduzidos entre a massa caiçara por cachorros pequenos do PDT. A deputada Cidinha Campos (PDT), que se juntou ao grupo no outro dia em Cabo Frio para comício de Janio Mendes-que tinha o apoio total do atual prefeito Marquinho Mendes (PMDB), para prefeito de lá, berrava sobre a capacidade de Pezão para “governar” o estado mais do que gritava sobre a capacidade de Mirinho e Janio para governarem os dois municípios praianos. Vale lembrar que Mirinho e Janio perderam as eleições, assim como a maioria dos que receberam o apoio de Cabral e Pezão no restante do estado.  Mas era o começo, ou talvez o momento de revelar, o que hoje é latente- a transformação do partido de Brizola, de esquerda com ideal trabalhista, em um mero satélite do PMDB. Durante todo o comício ficou evidente o quanto todos ali presentes a busca por plasmar na mente dos interioranos que Pezão era o cara, a bola da vez, o sucessor. Dezenas de vezes se repetiu das bocas de quase todos os presentes a frase: “Pezão, o vice-governador que mais fez obras.”. Era claro: Pezão é o candidato do PMDB para governar o Rio de Janeiro e, como sempre, para agradar a massa é preciso dizer que ele faz obras, mesmo Pezão nem sendo o governador naquele momento. Estrategicamente o colocaram na função de administrador das obras. Quando assumiu após a renúncia de Cabral, em 3 de abril de 2014,  logo nos primeiros dias mostrou toda sua energia (a mesma que o fez  prefeito e quase lenda em Piraí, sua cidade natal) e montou uma agenda puxada, onde chegou a ter de quatro a seis compromissos por dia. Inaugurar obras era o que mais gostava de fazer. No final de 2016 uma delação ligou o chefe de obras de Pezão a um cartel de licitações ainda na gestão de Cabral (as obras que ele inaugurara no período que era governador em exercício). Ironicamente, de acordo com a delação do ex-presidente do TCE Jonas Lopes de Carvalho, os conselheiros do Tribunal de Constas do Estado (TCE) recebiam repasses regulares de propina de empresas que executavam obras do estado justamente para não atrapalhar o andamento dos contratos. Pezão nega.

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Ainda em 2014, eleição para presidente, deputados, senadores e, claro, governadores: Pezão é mesmo o candidato. Eu era naquele momento chefe de redação do jornal satírico O Perú Molhado – um semanário anárquico que circulou bravamente por 34 anos ininterruptos conquistando admiradores e inimigos na mesma proporção. Eu não iria votar em Pezão, na verdade praticamente ninguém que compunha a redação na época o tinha como candidato, mas uma força invisível vinda de algum lugar soprava forte – com ameaças econômicas, inclusive, nos colocava contra a parede: Pezão tinha de ser a capa do jornal daquela semana (o lendário fundador Marcelo Lartigue tinha morrido há poucos meses). A insatisfação tomou conta de todos, o que fazer? O jornal foi confeccionado sem uma palavra de apoio, mas a capa ainda precisava sair. Em conjunto – como era muito comum no Perú, publicamos uma reprodução do Abapuru e escrevemos a chamada “O Perú apoia Tarsila” e riscamos uma seta que indicava o pezão da estranha figura. Acredito que poucos intenderam, os políticos locais tenho certeza que não. No fim Pezão venceu.

Voltando a 2013, mês de junho, com a conivência do deputado Jânio Mendes foi aprovado na Alerj um projeto de lei que desviava o esgoto que caía na Lagoa de Araruama (que banha os municípios de Cabo Frio, São Pedro da Aldeia, Iguaba Grande e Araruama) para o Rio Una, que desagua na Praia Rasa – que mesmo estando nos limites do município de Cabo Frio atingia diretamente as praias da península de Búzios.  O projeto aprovado em regime de urgência liberava R$ 11,5 milhões para a realização da transposição só precisava da sansão de Sergio Cabral.  A população do balneário se revoltou, e, com total apoio do jornal O Perú Molhado, se mobilizou. O alvo não era só Cabral, era também Pezão. O povo estava esperto, sabia que ele era a Bola da Vez na esfera do poder estadual.

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Nesse período era repórter em O Perú Molhado e participei ativamente, junto com o editor  Marcelo Lartigue e o repórter Hamber Carvalho, do fechamento de um edição especial sobre o crime ambiental que seria cometido contra Búzios caso efluentes fossem jogado no Rio Una. Ali entre risadas e finalização de textos ácidos e críticos chegamos, junto com o restante da equipe, à capa em que aparece Pezão e Cabral tampando seus narizes e comentando sobre o cheiro de esgoto de Búzios. O jornal chegou até a ALERJ e ao Palácio Guanabara e causou grande reboliço entre os membros do governo. 

Nesse meio tempo Garotinho surfava na onda negativa de Pezão e sentava o pau em seu blog:

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“No mês de março, o vice-governador Pezão participou na cidade de Búzios, de um encontro com todos os prefeitos eleitos no estado no ano passado. Aproveitou para fazer promessas ao povo de Búzios, mas era tudo enganação. Na verdade, Pezão e Sérgio Cabral estão dando à cidade turística um presente de grego. Vão jogar todo o esgoto da Região dos Lagos no rio Una, em Búzios, e com isso segundo ambientalistas afetar algumas das praias famosas da cidade. A população está revoltada e sentindo-se enganada por Pezão. Assim não vai longe.”  - Postagem de 02/06/201.

Avançando novamente para 2014, ainda assim, Pezão venceu e teve expressiva votação em Búzios. Como? Praticamente todos os políticos da cidade o apoiaram, entre eles o atual prefeito André Granado (PMDB), que derrotou Braga em 2012.

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Ainda em 2014 fomos, a convite como vários outros profissionais de imprensa, à Piraí para participar do “O Piraí Digital” (Lartigue ainda estava vivo). Não posso negar que ficamos empolgados com o que ouvimos (não posso dizer que vimos). Chegamos a fazer um caderno especial com reportagens, entrevistas e comentários sobre tecnologia e as ações realizadas em Piraí. Na recepção na casa de Pezão fui direto tentar uma entrevista, Pezão – talvez reconhecendo Macelo (Lartigue), que estava ao meu lado, tentou se esquivar. Já tínhamos, como Perú Molhado, causado bastante desgaste a ele quando ainda era só vice de Cabral e governador em exercício. Insisti até que a contragosto me disse que falaria comigo após o almoço. O cerquei por todo o dia, e quando os jornalistas famosos se afastaram, e a maioria dos políticos se foram, eu e Marcelo ainda  estávamos lá, de barriga cheia e meio bêbados (serviram muita cerveja lá). Ele não tinha como escapar, e foi até cordial. Na entrevista respondeu apenas o que o interessou responder e desviou todas as vezes que perguntei sobre o esgoto em Búzios. Chamou Búzios muitas vezes de joia da coroa, expressão que o vi usar depois em outros locais e entrevistas também para diversas outras cidades do interior do estado. Mas ele queria mesmo era falar sobre as Unidades de Polícia Pacificadora (UPPs), que naquele momento eram vistas como algo positivo de seu governo. Mas na Região dos Lagos e restante do interior fluminense já era consenso entre a população que elas tinham causado uma migração de bandidos para as pequenas cidades – mesmo Beltrame negando sempre quando vinha à região “prestar contas”. Outro tema que o interessava muito era a construção do Arco Metropolitano, que recentemente o delator  Benedicto Júnior afirmou ser uma das construções em que empresas foram escolhidas previamente antes das  licitações em uma espécie de bingo.

Demos uma trégua a Pezão e quase um ano depois, em Janeiro de 2015 saiu a seguinte nota em O Globo:

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Depois da campanha eleitoral que o levou à reeleição, o governador Luiz Fernando Pezão trocou a sua Piraí por Búzios para descansar no fim de semana. Ele chegou ontem no fim da tarde, hospedou-se na casa de um amigo em Manguinhos e, de bermuda azul e branca e sem camisa, foi para o Bar do Gordo, no Porto da Barra, conhecido por servir o melhor pastel da Região dos Lagos e que fica perto da casa onde o governador está hospedado. Denilson Braga, o Gordo, irmão do ex-prefeito Mirinho Braga, serviu a cerveja para o governador e seus amigos e parentes. A primeira-dama, dona Maria Lúcia, preferiu ficar em casa.

Pezão pediu um pastel de camarão e chegou a posar para fotos com um vereador e turistas que vão ao local para ver o por do sol e degustar frutos do mar nos restaurantes do Porto da Barra, que tem atraído antigos frequentadores da tradicional Rua das Pedras.

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Eu estava lá, junto do fotografo Muchacho Bicho Doido - sim, é esse o nome dele - e clicamos o momento exato em que o governador e um amigo se banhavam nas águas da Praia de Manguinhos – e que se os efluentes tivessem sido jogados no Rio Una estariam como uma Baía de Guanabara agora. Após fotografa-lo entregamos a ele um exemplar de O Perú Molhado que acabara de chegar da gráfica.  A capa era uma imagem do governador e a chamada “Tire o Pé da Lagoa”.  Pezão não gostou. Leu a matéria (o fotografamos lendo o jornal). Na matéria abordávamos os rumores de que o governo do estado estudava desviar as águas da Represa de Jurtunaiba para beneficiar a região no entorno da COMPERJ, São Gonçalo e Itaboraí. Disse a ele que gostaria de entrevista-lo sobre o tema. Com o endereço de e-mail que o governador  me passou, enviamos as perguntas (formuladas por mim e por Hamber),  a resposta não veio e publicamos a edição com Pezão na capa lendo o Perú e tinha a seguinte chamada: “Pezão descobre crise hídrica pelo Perú”.

A jornalista Berenice Seara, do jornal Extra, sempre atenta escreveu em sua coluna:

“O Jornal de Búzios "O Perú Molhado" perde a amizade com os poderosos, mas não deixa escapar a piada. A publicação estampou na capa a imagem do governador Luiz Fernando Pezão (PMDB), de folga nas praias de lá, lendo uma edição que trazia notícias sobre problemas hídricos na região. Sem rodeios e sem humildade, o jornal afirmou que Pezão descobriu a crise hídrica através de suas páginas...”

 Após essa pequena repercussão a resposta as nossas perguntas chegaram. Foi a assessoria que respondeu, claro. Mas estava na primeira pessoa.

Ao responder nossa pergunta; se usaria a água da represa de Jurtunaiba - que abastece  Búzios, onde moro, para atender à crescente demanda hídrica da região do entorno do COMPERJ, empreendimento da Petrobrás instalado no município de Itaboraí, ele afirmou que a única represa que pretendia construir é em Cachoeiras de Macacu, isso levou moradores desta cidade serrana a realizarem protestos alegando que, se  construída,  a barragem de Pezão  expulsaria centenas de famílias do campo e resultaria em um déficit de produção agropecuária para o município e áreas da região metropolitana, considerando que a área pretendida para sua implantação alagaria as terras mais férteis da região. A produção agrícola de Cachoeiras de Macacu é hoje responsável pelo abastecimento de grandes centros urbanos, como a cidade do Rio de Janeiro.

Não se pode deixar de comentar que todas essas matérias e entrevistas foram  ilustradas com muitas fotos de Pezão de  sungão preto nas praias de Búzios.

Em março de 2015, um mês após ter saído de O Perú Molhado, que caminhava rumo ao seu triste fim, eu assumia como editor chefe do Diário da Costa do Sol, com sede em Macaé. E foi na até então Capital do Petróleo – e  que hoje assiste seus políticos serem citados  por delatores  como receptores de dinheiro escuso da Odebrecht - que tive meu último encontro com Pezão (acho).

Era posse do prefeito Dr. Aluizio como presidente da Ompetro. Antes de seu discurso, chamando Aluizio de "sheik do petróleo fluminense”, Pezão  foi cercado por repórteres de jornais locais, rádios, blogs e outros enviados pelos jornais da capital. Ajudando a compor o time de jornalistas do Diário que enviamos pra cobrir o evento, eu  fui em direção ao governador: meu objetivo era fazer perguntas  ligadas ao tema do encontro apenas. Quando nossos olhares se cruzaram Pezão pareceu me reconhecer, fez uma expressão de descontentamento. No empurra, empurra, cheguei bem perto, com meu gravador em punho, fiz as minhas perguntas, Pezão virou o rosto e respondeu outro repórter. Tentei mais uma vez, ele repetiu a mesma atitude. E repetiu e repetiu por  todo o tempo que tentei  ter sua atenção.

Agora tenho meu próprio projeto editorial, um jornal digital que se propõe a noticiar e juntar formadores de opinião da baixada litorânea do Rio de Janeiro, o Prensa de Babel.  Será que no atual momento de tantos acontecimentos o governador aceitaria falar comigo sobre os rumores de um possível pedido de impeachment? 

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