Por que a mídia gosta tanto de Armínio Fraga?
Muitas coisas não estão bem, porém quase tudo está muito melhor do que quando Armínio era o presidente do Banco Central, entre 1999 e 2002
Ganha uma coxinha quem responder por que a imprensa brasileira gosta tanto de Armínio Fraga, ouve-o sobre todos os assuntos, trata-o como fonte de sabedoria. Fosse Armínio consultado sobre o vai-e-vem do mercado financeiro, vá lá, pois esse é seu campo de atuação. Mas o ex-presidente do Banco Central é chamado a dar pitacos sobre tudo.
Claro, Armínio não poderia deixar de ser convocado a falar sobre o ataque trumpista ao Judiciário brasileiro e o tarifaço.
Em O Globo, o guia intelectual respondeu assim a uma pergunta sobre o impacto do tarifaço sobre o PIB brasileiro: “Acho que o impacto sobre o PIB brasileiro vem muito mais de questões internas do que externas. Algum impacto é provável, não está muito claro que vai ter um enorme impacto, pode ser setorialmente. Nossos problemas enormes estão aqui dentro. É a situação fiscal, o Banco Central abandonado, sem apoio fiscal, com esses juros altíssimos. É a situação da segurança, é a situação da corrupção. Isso é tudo coisa nossa”.
Com pouca sutileza, disse o que ele e sua turma da Faria Lima dizem sempre. Que o país gasta muito, e esse é o nosso grande problema, maior ainda que a draconiana imposição de Donald Trump.
Armínio Fraga não deveria ser convidado a falar sobre temas inerentes ao setor produtivo, pois nunca fez parte dele. O iluminado guru da mídia neoliberal trabalhou como economista-chefe e gerente de operações no Banco de Investimentos Garantia; foi vice-presidente do Salomon Brothers em Nova York, diretor-gerente do Soros Fund Management. Fundou a Gávea Investimentos, uma gestora de recursos focada em fundos multimercados e private equity. Jamais fabricou um parafuso ou plantou um pé de café.
Acerca de seu papel como presidente do Banco Central, nos anos FHC, reproduzimos a seguir artigo publicado recentemente neste espaço. Vale rememorar.
Num evento na Casa das Garças, neste 12 de fevereiro, Armínio Fraga disse ao presidente do Banco Central, Gabriel Galípolo, que a autoridade monetária precisa de ajuda da área fiscal para bem realizar seu trabalho. E assinalou: “a coisa não está bem”.
Muitas coisas não estão bem, porém quase tudo está muito melhor do que quando Armínio era o presidente do Banco Central, entre 1999 e 2002. Não se noticiou o que Galípolo respondeu ao seu interlocutor, mas poderia lhe ter lembrado que naquela profícua gestão a Selic chegou a 45% e terminou em 25%, passando de aterradora para assustadora.
Armínio pediu “ajuda à área fiscal” para promover tamanha redução da taxa básica e vender 25% como resultado exitoso do seu trabalho? Ou nem foi preciso tanto?
Com a mídia insistindo em ouvir sempre e exclusivamente os próceres do mercado financeiro, alguém precisa mostrar teimosia e lembrar dos anos em que essa gente era governo. Costumava-se bater duro em Lula quando, na sua primeira passagem pela Presidência da República, falava de uma tal “herança maldita”.
O crescimento econômico no final dos governos do Príncipe FHC era pouco mais de 2%. O desemprego havia aumentado consideravelmente, alcançando o maior índice da década - 10,5% -, enquanto a renda per capita estagnou. A confiança de consumidores e investidores desabara, refletindo na redução do consumo e dos investimentos privados. Hoje registra-se o menor desemprego da série histórica (6,4%) e um aumento crescente da renda, com o salário mínimo tendo aumentado 7,5% em termos reais.
Apregoava-se o medo de Lula, virtual eleito para substituir Fernando Henrique. Para restaurar a confiança de “os mercados”, o governo firmou nos seus estertores um acordo com o FMI em 2002, no valor de US$30 bilhões e condicionado a uma genuflexão perante a ditadura da austeridade.
Ainda hoje atribuem-se os insucessos de FHC, Pedro Malan e Armínio Fraga a intempéries econômicas internacionais. Lula enfrentou em 2008 a maior crise financeira da História desde a Grande Depressão, e saiu do governo com 85% de aprovação.
Sim, a economia mudou, o mundo mudou, tudo mudou e é arriscado fazer comparações entre aquela e esta época. Ora, então por que a mídia - os jornalões, especialmente - só ouvem os economistas saudosos da era FHC?
* Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.


