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Jeferson Miola

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Por que a pesquisa Quaest é preocupante para o governo

Colunista Jeferson Miola defende que o governo saia 'do neoliberalismo, preserve sua base e dispute a hegemonia dos iludidos com a demagogia da extrema-direita'

Luiz Inácio Lula da Silva (Foto: Ricardo Stuckert / PR)
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A pesquisa da Consultoria Quaest publicada em 6/3 traz resultados preocupantes para o governo.

Numa interpretação apressada a mídia, analistas e políticos de variados espectros ideológicos atribuíram os dados desfavoráveis ao governo à declaração do Lula comparando a tragédia dos palestinos sob o regime nazi-sionista de Netanyahu com a realidade vivida pelos judeus sob Hitler durante o nazismo.

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A declaração, ainda que possa ter contribuído para a manutenção da tendência desfavorável ao governo que se verifica há meses, não parece ser a melhor explicação para os resultados encontrados. Dois aspectos pelo menos corroboram isso.

Primeiro, porque a fala do Lula, considerada “exagerada” por 60%, foi feita em 18/2, e a pesquisa mostra que a tendência desfavorável ao governo começou a se delinear a partir de agosto/23, pelo menos seis meses antes, portanto.

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Em segundo lugar, ainda que a repercussão do assunto na comunidade evangélica possa ter tido mais impacto que nas outras religiões, a parcela de evangélicos na pesquisa foi de 31% da amostra total, enquanto católicos foram 45%, sem-religião 18%, e de outras religiões 5%.

É preciso, por isso, se analisar o conjunto de quesitos avaliados, e não apenas um deles, para se interpretar com maior fidedignidade a fotografia revelada pela pesquisa Quaest.

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1.A tradicional lua-de-mel do governante recém eleito com a população, inclusive com eleitores que não votaram em Lula, não foi das mais tranquilas e prolongadas, e pode-se dizer que de fato esta fase de enamoramento e paciência começou a acabar cedo, já em julho de 2023.

Esse não é um fenômeno restrito ao Brasil. Tem sido observado em contextos de polarização ideológica e de rápida aceleração das conjunturas. A incapacidade de governos, em especial os progressistas, de darem respostas concretas para aplacar o mal-estar difuso da população com décadas de promessas neoliberais descumpridas produz a transferência de votos de um campo a outro do espectro ideológico. O Chile é um bom exemplo a esse respeito.

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Em todas as tabelas da pesquisa verifica-se um fenômeno comum: agosto/23 foi o último mês da série de pesquisas da Quaest em que [1] os índices favoráveis ao governo Lula tiveram algum crescimento em relação a pesquisas anteriores, e que [2] os índices desfavoráveis ao governo tiveram alguma queda.

As tabelas mostram, a partir daí, uma tendência constante de [1] piora dos índices positivos para o governo, e de [2] aumento das posições negativas no período.

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Isso significa, portanto, que a aprovação ao governo veio caindo lenta e constantemente desde agosto/23, quando era de 42%, até chegar aos 35% em fevereiro/24; ao passo que a reprovação também cresceu de modo constante, de 24% em agosto/23, para 34% em fevereiro/24.

2.O trabalho do Lula na Presidência é aprovado majoritariamente pelo eleitorado tradicional do PT e do lulismo: 68% entre os nordestinos, 61% entre as pessoas que ganham até 2 salários-mínimos [SM], e 59% dentre brasileiros/as com nível fundamental de escolaridade. Contudo, mesmo nesses três segmentos a avaliação positiva caiu, respectivamente, 4%, 8% e 7% em relação aos patamares de agosto/23.

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A pesquisa indica, por outro lado, que o governo não está conseguindo conter a desaprovação crescente junto ao eleitorado majoritário da extrema-direita – evangélicos, pessoas com renda entre 2 e 5 SM, acima de 5 SM, e residentes nas regiões sul e sudeste do país.

Além disso, no intervalo de um ano [fevereiro/23 a fevereiro/24] o governo perdeu apoio junto a segmentos que podem servir como “sentinelas” da eficácia das políticas públicas e da percepção da realidade econômica cotidiana: mulheres, que passaram de 58% de apoio para 51%; população de 16 a 34 anos, de 57% para 46%; pessoas com ensino superior incompleto, de 53% para 45%; com renda entre 2 e 5 SM, que caíram de 56% para 45%; e pessoas pardas, que reduziram de 61% para 53% o nível de apoio a Lula.

3.A percepção dos entrevistados sobre a situação econômica do país é diferente da percepção do mercado, das finanças e do grande capital, para quem a economia vai muito bem, obrigado, porque os fundamentos neoliberais, fiscalistas e de austeridade estão preservados e os juros do BC mantidos na estratosfera. Ocorre, porém, que é bom para a Faria Lima não é nada bom para a imensa maioria da população.

O crescimento de 2,9% do PIB em 2023, que é 0,1% menor que os 3% do último ano de Bolsonaro, pode mascarar como positiva uma sensação que não é percebida da mesma maneira pela maioria das pessoas, principalmente o eleitorado petista.

Os 86% de eleitores do Lula que em fevereiro/23 tinham uma expectativa positiva em relação à economia, caíram para 69% em fevereiro de 2024, uma queda relevante.

A maioria dos pesquisados sente grande mal-estar com a situação econômica concreta, do dia-a-dia. Um mal-estar econômico que é constante desde o início do governo, mas que vem crescendo sustentavelmente, culminando com a piora da percepção sobre custo de vida, da carestia dos alimentos, tarifas públicas, e do achatamento do poder aquisitivo [tabela]:A proporção de quem reclama do aumento dos preços dos alimentos dobrou entre agosto/23 e fevereiro/24: saltou de 37% para 73%. A queixa dos preços dos combustíveis também quase dobrou no período citado, passando de 31% para 51%, e a percepção de quem avalia ter subido o gasto com contas alcançou 63%.4.Em resumo, a pesquisa Quaest mostra que o presidente Lula tem fortes motivos para se preocupar com a avaliação do seu governo, em especial neste ano de eleições municipais acirradas.

O controle de comissões cruciais da Câmara dos Deputados por bolsonaristas mais truculentos e fanatizados adiciona dificuldades ao governo, que terá de pagar as emendas parlamentares até 30 de junho, enquanto poderá ter de fazer cortes orçamentários devido ao arcabouço fiscal.

É de se mencionar, além disso, que este cenário fortalece o poder de Arthur Lira e eleva o preço político [e orçamentário] do chefe do bando de extorsionários e achacadores.

Estamos diante de uma situação de relativo impasse político, de “empate ideológico” no Brasil. A própria Consultoria Quaest revelou, em pesquisa mais antiga, que 90% de quem votou no Lula repetiria o voto nele, e 90% de quem votou no Bolsonaro votaria nele novamente.

Nesse cenário de polarização acirrada, com uma extrema-direita ativa e engajada, poder de mobilização e força convocatória, qualquer perda de base social e eleitoral do governo pode ser decisiva, podendo causar derrotas eleitorais neste ano e em 2026.

Para evitar a confirmação deste horizonte preocupante, o governo precisa urgentemente sair do labirinto neoliberal para conseguir preservar sua base social de sustentação e disputar a hegemonia das parcelas da população iludidas com a demagogia da extrema-direita.

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