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Daniel Quoist

Daniel Quoist, 55, é mestre em jornalismo e ativista dos direitos humanos

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Por que as Forças Armadas se sujeitam a tudo isso?

Lamentável ver que o capital das FFAA arduamente amealhado nos últimos  34 anos se esvai rapidamente como areia por entre os dedos. E tudo por sua fome de poder, porque no mundo atual não existe aposta política mais arriscada que apoiar e servir de anteparo a crises em governos de extremistas, sejam de esquerda ou de direita, como é o nosso caso

Por que as Forças Armadas se sujeitam a tudo isso?
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Triste a sina das Forças Armadas brasileiras. Sobreviveram a 21 anos de ditadura, de 1964 a 1985, mas em apenas 5 meses de 2019, poderão não sobreviver como referência da Nação, exemplo de patriotismo, paradigma de civismo.

Em pouco mais de 150 dias viram seu capital minguar. O inicio do inferno astral, mais verde oliva que branco ou azul marinho, começou quando foi chamada (ou se ofereceu?) para preencher os vazios do governo de Jair Bolsonaro com oficiais das mais diversas patentes.

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O que vemos é que nem um dos governos militares — de Castelo Branco a Fugueredo — contou com tantos generais em seu primeiro escalão do que o governo de Jair Bolsonaro. A história, como sabemos, sempre lerda, é implacável. Não tardará o momento em que os militares brasileiros serão retratados com as tintas da mediocridade e do apego ao poder puro e simples. Vê-se logo de saída que o poder é afrodisíaco não apenas para civis. Para militares também.

Lamentável ver que o capital das FFAA arduamente amealhado nesses últimos 34 anos se esvai rapidamente como areia por entre os dedos. E tudo por sua fome, ganância e ambição frenética de poder, porque no mundo atual não existe aposta política mais arriscada do que apoiar e servir de anteparo a crises em governos de extremistas, sejam estes de esquerda ou de direita, como é o nosso caso.

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Nunca um governo mostrou-se tão inábil e inapto para governar como o atual. Porque este governo desdenha da democracia, faz bem pouco caso dos direitos humanos comezinhos, louva torturadores oriundos dos tempos em que militares chefiavam o pais com mão de ferro, levando a cabo ações truculentas como o fechamento do Congresso, decretando ampla e odiosa censura a jornais e revistas, e se mantendo graças a prisões, torturas e assassinato de seus opositores civis. Novamente, temos um governo sem qualquer apreço pela imprensa, a desafiar a lógica e o bom senso a três por quatro. Não bastasse a priorização da estapafúrdia agenda de armar a população, vemos seu pendor por um rápido afrouxamento nas leis ambientais, uma intenção insana visando abolir medidas de trânsito que diminuem o número de vitimas nas estradas, o que inclui até a preocupação em abolir o uso de cadeirinha de crianca em automóveis. Que tem gente maluca na cabine de comando ninguém mais parece ter dúvidas.

E, no entanto, tudo isso faz parte da pauta prioritária do governo. Estancar o desemprego nem pensar. Melhorar nossas universidades, só se for o contrário — soficá-las financeiramente para depois extingui-las. E a Reforma da Previdência mostra-se não mais que um biombo em que a mídia ajusta seu foco e mantém ainda coesos os inimigos de sempre do Brasil — os banqueiros, o capital
Internacional aqui imiscuído, os sonegadores nababescos em geral. A mídia conservador vê o cenário de "non sense" generalizado como coisa de amadores, grotesco, folclórico. E nada mais. Os interesses na reforma da Previdência são outros. Mas nenhum deles tem a ver com equilíbrio das contas públicas, com geração de emprego, e menos oferece qualquer garantia de um melhor futuro para o Brasil.

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É a esse governo que as Forças Armadas amarrou seu futuro.

Vemos atônitos, que estamos diante de um governo formado por amadores desocupados e também destrambelhados, qual "turma de ginasiais" em excursão de fim-de-ano letivo. Nesses poucos meses abundam exemplos de ausência de limites éticos. Começa por um ministério de um ridículo atroz: ministros que falseiam os próprios currículos, informando cursos superiores que não fizeram. Ministro que viu Jesus na goiabeira e se diz pós-graduado em púlpito evangélico. Ministro colombiano, escandindo forte acento "pero muchacho" a chefiar o antes respeitado ministério da Educação. Ministro envolvido até o pescoço no laranjal do PSL, o polêmico partido do presidente. Ministro astronauta fazendo vaquinha na internet para investir na ciência e tecnologia do país. Ministro das Relações Exteriores afirmando em alto e bom som e diante da imprensa internacional que "a Terra é plana", que "o Nazismo é de esquerda", que "a China é inimiga". Nessa geleia de horrores são agregados os militares com sua conhecida empáfia há muito camuflada. Seu trabalho parece ser o de servir de saco de pancadas para o ex-capitão e seus filhos voluntariosos e desbocados. Nossos militares estão bem cientes que não têm condições mínimas de vencer nem mesmo uma guerra contra a Venezuela, como aliás parece ser sonho de consumo dos Bolsonaro e do chanceler Ernesto Araújo.

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A própria vitória eleitoral de Jair Bolsonaro está viciada pelo uso contumaz, extensivo e massivo de noticias falsas (fake news). O clã presidencial é suspeito de associação com o crime organizado carioca, a convivência (e conivência) quase que institucional com os temidos milicianos. Evidências e indícios são muito fortes da prática de "achacamento" de salários de funcionários em cargos públicos da Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro por parte do agora senador Flavio Bolsonaro, além da ocorrência de práticas ilícitas de aumento de patrimônio através de transações muito suspeitas no
mercado imobiliário carioca.

A par disso — e em consequência disso — não tardará o dia em que se perguntarão aos próprios militares encastelados no governo duas perguntas: (1) Onde está Queiroz? (2) Quem matou Marielle Franco?. Quem se alia a governo com tão espetacular prontuário tem de arcar, cedo ou tarde, com o ônus a ele inerente. Algo de muito estranho deve ter ocorrido com nossos militares. Vêm demonstrando exótico fascínio pela mediocridade, pela politica mais abjeta e destrutiva tanto de costumes quanto de vidas, dado à sua fixação paranóica para conceder posse e porte de armas à população.

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Não sabemos se nossos generais, almirantes e brigadeiros estão bem cientes daquilo que escreverão historiadores quando analisarem a atual politica externa do Governo Bolsonaro. O fato é que temos um governante que bate — literalmente —continência para a bandeira norte-americana; discursa no exterior desmerecendo o povo brasileiro; cumpre visita oficial — e sem qualquer pudor ou sinais de reles constrangimento — a um órgão de inteligência, a um serviço secreto de nação estrangeira, que tem como missão maior espionar ações de outros governos visando auferir benefícios econômicos e políticos para seu próprio país. Agora busquemos na imprensa nacional qualquer viés de mínimo desconforto de nossas FFAA com tal surreal situação. Não encontraremos. Porque simplesmente não há. E de omissão em omissão os militares cavam sua própria ruína no imaginário popular.

Aspecto não menos danoso é que o inquilino do Palácio do Planalto além de tecer loas aos Estados Unidos sempre que possível, se coloca em constante papel de subserviência ante a potência mundial do Norte. Demonstra prontidão para apoiar integralmente sua política externa, ousando inclusive, declarar guerra com a Venezuela. E tudo para atender interesses econômicos do seu colega Donald Trump. Para tanto, faz pouco caso com as relações econômicas do Brasil com parceiros de peso como a China, a Rússia e o bloco de países árabes. Em relação a esses últimos estamos cansados de, em menos de seis meses!, ver o Brasil atrelado novamente à política externa dos Estados Unidos, com a obsessão do presidente Bolsonaro por agradar Israel e os EUA e de uma só tacada efetivar a transferência da nossa embaixada de Tel Aviv para Jerusalém. O que o Brasil ganha com isso... é uma imensa incógnita.

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Os militares brasileiros parecem ter esquecido todas as lições recebidas na Escola Superior de Guerra, ESG, em que tratavam do conceito e da prática de soberania nacional. No entanto, diante da ameaça comunista dos anos 50/60, fosse real ou imaginária, os militares brasileiros estavam na vanguarda da defesa da nossa briosa soberania nacional. Nada disso restou. Virou fumaça. Escafedeu. Ou realmente sempre se lixaram para a soberania nacional. Hoje, percebemos estupefatos, que se tratava de uma soberania somente para norteamericano —soberania apenas diante do perigo russo, chinês, cubano; mas uma ostensiva não-soberania diante dos Estados Unidos da América. É uma das mais vergonhosas páginas esta que as Forças Armadas está fornecendo a tinta para ser escrita com a caligrafia obtusa do presidente Bolsonaro.

Nas últimas 72 horas vemos militares sair em defesa de gente indefensável. Ninguém sabe quais motivos levam um general graduado como Villas-Boas sair em socorro do ex-juiz Sérgio Moro, quando este sabidamente esteve praticando pencas de crimes, atos regulares de abusos de autoridade, fraudes contra o exercício do lídimo direito de julgar. Em um momento em que a imprensa mundial questiona a conduta falaciosa e carente de ética do ministro da Justiça Sergio Moro (The New York Times, Le Monde, The Economist, El Pais, Reuters, Der Spiegel, The Guardian, BBC etc) seria obviamente este o pior momento para um general fazer tão ridículo e inoportuno libelo de defesa. Nem o presidente Bolsonaro, seus filhos e os ministros civis ousaram tanto. E de trata de crimes autocomprovados: gravações, mensagens. Nem Moro nem Dallangnol, o procurador chefe da Lava Jato, negaram as práticas denunciadas. Estes se apegam tão somente à questão meramente formal: o vazamento. Irônico que a operação se notabilizou justamente pela prática contumaz de vazamentos criminosos de informações, documentos e depoimentos protegidos por sigilo judicial, portanto vazados de caso pensado ao arrepio da lei, a começar com aquela conversa vazada pelo próprio Moro ocorrida entre a então presidente da República Dilma Rousseff e o ex-presidente Lula da Silva. A defesa de Villa Boas de Moro além de infeliz, foi inoportuna e danosa à imagem apartidária tantas vezes cultuada pelas FFAA. Inoportuna porque estamos apenas no inicio da revelação de somente 1% do material recebido pelo The Intercept. Ninguém se arrisca a prever o que o passado reserva a Sergio Moro, Deltan Dellagnol, Luiz Fux e à própria Lava Jato. E se um general da estirpe de Villas Boas age assim, de furna açodada e não pensada, truculenta e politicamente míope... o que a Nação poderá esperar de militares de outras patentes? Um vexame o que VB protagoniza em claro desfavor das FFAA.

Há que se mencionar a patética distribuição de altas honrarias militares pelo presidente Jair Bolsonaro a pessoas sobre as quais pululam suspeitas, tal qual plantação de cogumelos. Condecorar seu ministro Sérgio Moro no auge da crise em que este foi flagrado traindo princípios basilares da magistratura com a honraria máxima da Marinha do Brasil foi um atroz desrespeito e vil descaso com a importância da própria distinção honorífica. Seria como homenagear Sérgio Cabral, Eduardo Cunha e Geddel Vieira Lima semanas antes de serem chamados a cumprir sentença em presídio federal. Não menos constrangimento também se verificou quando, recentemente, o pai-presidente decidiu condecorar de uma lapada só seus três filhos no Itamaraty. O que eles fizeram pelo país? Um dia filhos do presidente é investigado no Rio de Janeiro por diversos crimes — lavagem de dinheiro, uso de laranjas, rachadinhas com salários de assessores, transações imobiliárias, conluio com milicianos. Isso se já não fosse um escândalo para qualquer país minimamente sério o fato de um pai-Presidente da República decidir condecorar a trinca de filhos como se os estivesse presenteando com brinquedos tecnológicos como Ipads e celulares de ultima geração. Os militares assistem a tudo calados, em silêncio referencial, obsequioso. Quando despertarem da letargia em que se encontram ouvirão o que o populacho costuma afirmar em situações inusitadas como essas: "Patrão, o buraco é mais embaixo".

É a esse governo que as FFAA resolveu atrelar sua história, suas tradições, sua honra e seu futuro. Elas foram escrachadas quase que semanalmente pelas forcas bolsonaristas através do incensado guru presidencial Olavo de Carvalho. Termos chulos, acusações caluniosas, difamações rasteiras, tudo isso integra o repertório de aleivosias de Carvalho e foram arremessadas aos generais alocados no Planalto com inaudita virulência. E fica impune. O presidente parece se divertir com tão escabrosa e vexaminosa situação, coloca uns panos quentes, fala umas generalidades e termina tudo ficando por isso mesmo. Mas não fica por isso mesmo. A porta do escracho aos militares de altas patentes foi forçada, arrombada e aberta está. E ficará aberta de par em par porque com certeza muitos outros ataques haverão de vir. E de uma infinidade de outros detratores. Quem não se dá o respeito será que o merece? Porque Villas Boas não foi rápido em tratar de defender a honra do brucutu e vice-presidente Mourão, em mostrar indignação aos ataques de Carvalho ao general civilizado e de boa tempêra Santos Cruz? Porque se bateu apenas por um meliante agora desmascarado (vejam a capa da revista Veja, leiam os editoriais da Folha de S.Paulo e do Estadão, nenhum deles esquerdista!) como Sérgio Moro? Um santo de pau oco, com pés de barro, de terra pantanosa, de areia movediça.

Porque os militares se sujeitam a isso?

E se tivessem de aturar uns 5% dessas situações vindas de partido de governos petistas, de esquerda, de Lula da Silva e Dilma Rousseff, teriam engolido calados ou ameaçariam o país com crise institucional de alta monta, derrubando o governo com tanques na esteira de ameaças verbais? Está aí a fragilidade moral das atuais Forças Armadas. São seletivos em aceitar calados quaisquer ataques à sua honra, desde que continuem mantendo seus privilégios, cargos e funções no entorno do terceiro andar do Palácio do Planalto. Esse é o péssimo exemplo que tratam de transmitir às novas gerações da caserna. Venalidade. Boçalidade. Engodo. Deviam lembrar da lição de Calderon de la Barca:

"Ao rei tudo, menos a honra!"

A indignação dos militares, como vimos, é bem seletiva. E dignidade não abarca meio termo. Ou se é digno ou não se é. Certamente devem ter calculado o elevado preço que pagarão por isso. E se dispuseram a pagar. E se a cúpula militar cai em desgraça na opinião da população, não é necessário ser muito inteligente para perceber como o restante da tropa será vista, observada e cairá na mesma cova comum. Algo é certo: se em menos de seis meses tudo isso já aconteceu, somente sendo muito míope ou cego para não perceber o que ainda lhes reservam os próximos meses. Nem digo anos porque o governo já mostra sinais de exaustão acelerada e de autocombustão. E para um estado de desobediência civil não faltarão extremistas na oposição, extremistas arrependidos da situação prontos a atear fogo no país com a gasolina de uma economia em rápido declínio, com a explosão do desemprego, com a carestia dos preços ao populacho, o preço da gasolina. Não faltarão causas mortis para um governo que além de mal intencionado mostra-se despreparado para o ofício de governar, conduzir uma Nação.

Em tempo: Jair Bolsonaro demitiu o general Santos Cruz, que comandava a Secretaria de Governo do Palácio do Planalto, e atribuiu a demissão a uma "falta de alinhamento político-ideológico" e a embates com outros integrantes do próprio governo. Uma das poucas vozes de bom senso se evapora melancolicamente. Um sinal inequívoco de que entre Olavo de Carvalho e qualquer militar cinco estrelas o clã Bolsonaro ficará com o astrólogo da Virginia. Heleno e Villas Boas já deveriam deixar todo dia suas malas arrumadas. O desembarque lhes será imposto sem aviso prévio. Irão saborear em casa, com filhos e netos, as agruras e os infortúnios advindos de suas decisões erradas.

Um dever de casa para os militares. Meditem no conteúdo dessa frase a nós legada pelos antigos:
"No inicio de cada empreendimento devemos ver o seu fim."

 

 
 

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