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Larissa Ramina

Professora de Direito Internacional da UFPR, Membro da ABJD – Associação Brasileira de Juristas pela Democracia

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Por que o hacker Walter Delgatti é hoje o verdadeiro herói brasileiro? Os diálogos promíscuos entre os operadores da Lava Jato

"Sem ele certamente comprovaríamos os abusos da Lava Jato, mas não conheceríamos profunda e detalhadamente a perversidade e a podridão das elites que operam nosso sistema de justiça", escreve a jurista e professora Larissa Ramina

Larissa Ramina, Walter Delgatti Neto e Sergio Moro (Foto: Divulgação)
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Por Larissa Ramina

Novos áudios e conversas apreendidos no âmbito da operação Spoofing da Polícia Federal, que investigou hackers que invadiram celulares de autoridades, foram divulgados. Em um dos áudios, Deltan Dallagnol indicou a seus parceiros da Lava Jato que, diante da impossibilidade de punir a Petrobras usando a Lei Anticorrupção brasileira, seria melhor aceitar o “texto do DOJ” que foi utilizado no “acordo” — possivelmente um acordo firmado entre a operação e o Departamento de Justiça norte-americano desde 2015. Tal “acordo” previa o retorno de um “percentual” das multas astronômicas que seriam drenados da Petrobras para a jurisdição dos EUA através da aplicação extraterritorial da Lei de Práticas de Corrupção no Exterior – FCPA. Esse percentual seria revertido para uma fundação de direito privado gerida pelos procuradores, em troca da obtenção de informações estratégicas sigilosas. Em outras palavras, o procurador defende que recursos da Petrobras, empresa investigada no Brasil e nos EUA, ficassem no país norte-americano, mesmo com a proteção de assuntos estratégicos do país estando assegurada no Acordo de Cooperação Judicial em Matéria Penal de 1997, celebrado entre Brasil e EUA (conhecido como MLAT). Essa colaboração direta e informal, para não dizer promíscua, com autoridades estrangeiras, inclusive por meio do Telegram, fere violentamente o referido Acordo, que visa facilitar a cooperação e assistência judiciária mútua em matéria penal, porém “pelo cumprimento da lei em ambos os países”, de forma a salvaguardar a soberania nacional. Pelos termos do Acordo, as tratativas bilaterais se dariam por meio de uma “Autoridade Central”, que no Brasil seria o Ministério da Justiça via Departamento de Recuperação de Ativos e Cooperação Jurídica Internacional (DRCI), e nos EUA o próprio DOJ.

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Antecipando questões relevantes à soberania nacional, o Acordo permite inclusive que um dos países negue pedido de assistência jurídica se o atendimento à solicitação prejudicar a segurança ou seus interesses essenciais. Ou seja, o Brasil poderia ter se negado a ajudar a investigação dos EUA por ferir interesses nacionais estratégicos. Mas é claro que os procuradores lava-jatistas preferiram, da forma mais servil, vassala, caudatária, pelega e capachista que se possa imaginar, colaborar com os gringos a proteger a soberania nacional. Inclusive, eles têm se esforçado para justificar a não violação do MLAT com base na ideia de que tais tratativas seriam “preliminares”, ou seja, “pré-MLAT”. A pergunta aqui é a seguinte: podem ser considerados “preliminares” os contatos de agentes públicos brasileiros com agência estrangeira, que resultaram num acordo bilateral entre a Lava Jato enquanto parte - como se esta fosse um órgão diplomático ou tivesse capacidade de agir em nome do Brasil - cujo objetivo claro foi impor prejuízo financeiro à empresa estratégica nacional?

Além de não terem passado pelo DRCI em nenhum momento, mais grave ainda, informações estratégicas sigilosas obtidas ilegalmente foram utilizadas pelos EUA em violação do princípio da não intervenção para ferir a soberania nacional. Ambos os princípios – não intervenção e igualdade soberana, estão previstos na Carta das Nações Unidas de 1945. Não há dúvidas, portanto, que a Lava Jato atuou politicamente como sucursal dos interesses dos EUA, auxiliando este país, de forma subalterna e subterrânea, a violar normas internacionais em detrimento da soberania econômica nacional. 

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Com a ajuda dos subservientes procuradores, que desnudaram a absoluta sujeição do sistema de justiça brasileiro aos interesses estrangeiros, em 2018 a Petrobras fechou com o DOJ um acordo bilionário, fruto de uma ação coletiva ou class action de investidores da Petrobras que tramitou na Justiça Federal em Nova Iorque. R$ 2,5 bilhões decorrentes da multa voltaram ao Brasil e foram depositados em uma conta da 13ª Vara Federal de Curitiba. A soma seria destinada à tal fundação Lava Jato que atuaria mediante a condução dos próprios membros da “operação”, o que acabou sendo barrado.

Ao referido áudio de Dallagnol, soma-se outro, em que o procurador pede que seus colegas “deixem o coração aberto pra pensar fora da caixa” ao elaborar a denúncia contra Lula no caso tríplex. Impossível não lembrar que tal denúncia foi apresentada num PowerPoint de 2016, inserindo Lula no centro de um esquema, enquanto a conexão entre membros de uma organização criminosa. Era necessário pensar fora da caixa porque a Lava Jato tinha interceptações telefônicas reconhecendo que D. Marisa não comprou o triplex.

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Os áudios de Dallagnol, junto com outras mensagens trocadas entre Sérgio Moro e os procuradores, revelaram que o ex-juiz – chamado pelos parceiros de “russo” ou “Putin”, era o verdadeiro chefe da operação, e responsável por aplicar o “Código de Processo Penal do Russo”, para designar sabida inobservância das normas jurídicas em relação a Lula. Dito de outra forma, restou evidente a existência de um plano para que Lula fosse condenado à prisão por meio de denúncias sem materialidade, ignorando inclusive provas de sua inocência, para retirá-lo das eleições presidenciais de 2018. Isso a despeito até de liminar obtida pela defesa técnica do ex-Presidente no Comitê de Direitos Humanos da ONU, determinando ao Brasil que não o impedisse de concorrer nas eleições de 2018 até o trânsito em julgado de sua condenação.

Ao lado do Plano Lula, a Lava Jato atuou simultaneamente em outras frentes políticas como se fosse um partido político, inclusive em projetos com a ONG Transparência Internacional, que contemplava, dentre outras coisas, selecionar e financiar candidatos para as futuras eleições do país, através de recursos de empresas que eram alvo da Lava Jato na forma de consultorias que seriam “sugeridas” para o cumprimento de acordos de cooperação. Candidatos selecionados seriam aqueles defensores de uma agenda neoliberal, ao passo que eventuais candidatos vetados seriam incluídos em uma lista negra chamada de “tchau queridos”. 

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Por trás das engrenagens bandidas da Lava Jato, está uma complexa estratégia internacional que visa impedir a retomada de um projeto alternativo de desenvolvimento nacional representado por forças progressistas. Logo, é legítimo entender que todos os processos da operação que envolvem o Partido dos Trabalhadores certamente estão contaminados. Não se trata apenas da suspeição de um juiz, mas da parcialidade de todos os agentes envolvidos na trama lavajatista. Por que, ao contrário do que afirmou o ministro Marco Aurélio, Walter Delgatti é o verdadeiro herói brasileiro? Sem ele certamente comprovaríamos os abusos da Lava Jato, mas não conheceríamos profunda e detalhadamente a perversidade e a podridão das elites que operam nosso sistema de justiça.

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